Capítulo VIII | Você não pode ter o que quiser.

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CAPÍTULO VIII

DA AQUISIÇÃO

Art. 23 Como forma de garantir a igualdade, a compra de todos os produtos, excluindo alimentos, será controlada pelo Ministério da Economia.

Art. 24 Cada cidadão tem um total de pontos que acresce ou diminui conforme as atividades exercidas em solo nacional, esses pontos definem o que o cidadão pode ou não comprar.

Art. 25 É proibida a revenda, entre os cidadãos, de produtos anteriormente comprados.

[...]"

-- Preciso de um celular novo. – Resmunguei rabiscando de qualquer jeito uma das folhas no meu caderno, o que era pra ser um desenho da garota que sempre senta no jardim pra ler durante o intervalo virou só um rosto borrado no meio da multidão de idiotas. – Minha mãe jogou o meu na banheira. –

-- Sério? Por quê? – Henrique perguntou rindo e o encarei como se pudesse matar uma pessoa com um simples pensamento.

-- Alice disse que se eu não levantasse da cama logo ela me faria levantar... Eu mandei ela não atrapalhar meu sono de beleza, ouvi a cadeira bater na escrivaninha e quando virei pra olhar ela já tinha saído correndo com o meu celular na mão. Eu corri atrás dela, a gente tropeçou na porta do banheiro e o Kirk saiu voando, ela tinha acabado de tomar banho... Quantas vezes eu já disse pra aquela mulher esvaziar a banheira depois do banho?! – Resumi quase gritando outra vez, mais um pouco e eu surto sem motivo algum. – E meus pontos de ID estão baixos demais pra comprar outro, sem contar que eu não tenho dinheiro mesmo... –

-- E desde quando isso é problema pra gente, Pietro? Esqueceu que dia é hoje? – Juliana perguntou com desdém encarando as próprias unhas e suspirei.

-- Não sei que dia é hoje, se é importante eu anotei na minha agenda... Que ficava no meu celular e adivinha? Ele morreu na banheira, na mesma banheira onde eu vou matar a minha mãe! – Resmunguei encarando a garota que só deu risada e murmurou um "esse sonha alto" que me ofendeu. – Que dia é hoje? –

-- Dia de entrega. – Henrique respondeu tirando um pirulito do bolso e tentei roubar ao mesmo tempo que Judy, mas ele foi mais rápido do que nós. Só aí percebi a mochila vermelha jogada no cantinho da escada... Pensei que a gente tinha decidido procrastinar esse dia. – Agora vê se coloca um sorriso nessa sua cara de rato porque a gente vai tirar dinheiro de idiota, não é esse o seu hobby? –

-- Eu não tenho cara de rato! – Retruquei dando um soco no braço dele, esse sim é o meu hobby. – Eu tenho cara de rato? –

-- Não, bebê. Você é o garoto mais fofo da escola inteira com esses olhos de mangá aí, eles são grandes e têm cor própria, eu adoro eles... Dá pra focar no trabalho agora? – Juliana resmungou apontando pro começo do corredor e levantei ignorando a dorzinha latejante da fatídica queda de ontem. Eu cuidava da parte de cima da escadaria e a Judy cuidava da parte de baixo, se algum cliente chegasse a gente liberava a passagem pro Henrique negociar, vender e anotar os pedidos, se algum adulto não corrupto aparecesse era trabalho meu e da Judy fazer drama até a pessoa desaparecer. Era assim que funcionava, sempre funcionou. – Essa é a parte chata, odeio ficar de guarda. –

-- Odeio falar pelo walkie-talkie, essa porcaria só faz chiar. – Comentei pegando o radiozinho que Judy me oferecia e meus lábios formaram um bico de desgosto automaticamente, era sempre a mesma merda: Aperta o botão, espera apitar, fala, solta o botão, espera a resposta... Ridículo...

Desejo-te anarquiaOnde histórias criam vida. Descubra agora