5 • 1978

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A FEMINISTA

     A euforia do primeiro bebê de proveta se espalha da Inglaterra para o Brasil, Louis Brown dá origem à fertilização em vitro. No Brasil, a Ditadura caminha para o fim com a extinção do AI–5 pelo governo de Ernesto Geisel, seguindo a promessa da transição lenta e gradual. O Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro perde praticamente todo o seu acervo em um incêndio. A onda disco fervilha pelos bailes do mundo, John Travolta dá vida aos Embalos de Sábado a Noite enquanto a novela de Gilberto Braga, Dancin Days estoura nas casas brasileiras. Em outro seguimento acontece o Congresso da Mulher Metalúrgica, as mulheres intensificam a luta por creches, direitos trabalhistas, salários iguais aos dos homens, serviços de atendimento e pela divisão do trabalho doméstico.

     Quatro anos antes as mulheres conquistam o direito ao voto. Um ano depois, o feminismo da Segunda Onda¹ surge, as questões do direito ao prazer e corpo da mulher são discutidas, alavancadas pelo estabelecimento do Ano Internacional da Mulher pela ONU (Organização das Nações Unidas), assim como foi dada a partida a Década da Mulher. Ressurge, desta forma, o movimento feminista organizado, inaugurado pela reunião ocorrida em julho de 1975, na ABI (Associação Brasileira de Imprensa) e com a constituição do Centro da Mulher Brasileira, ambos no Rio de Janeiro. Os jornais "Nós Mulheres" e "Brasil Mulher" e a revista "Claudia" dão voz as feministas, espalham pela população o que estava acontecendo, qual era a luta mesmo ainda estando na Ditadura Militar. Em São Paulo é realizada o encontro para o Diagnóstico da Mulher Paulista, sendo patrocinado pela Cúria Metropolitana e pelo Centro de Informação da ONU, nascendo a partir daí o Centro de Desenvolvimento da Mulher Brasileira. As reuniões se alastram pelos Estados, pelos países, pelas pessoas; mulheres universitárias, mulheres jornalistas, mulheres empregadas, mulheres dona de casa, mulheres jovens, mulheres, mulheres e mulheres, são convidadas para as discussões, seus medos e frustações são ouvidos, as pesquisas são incentivadas, as reflexões excitadas, o estudo alavancado, as vozes caladas ganham som, o sexo frágil deixaria de ser intimidado, combateriam a alienação da mulher em todas as camadas sociais.

     Uma dessas mulheres é Bertha Nunes, uma professora de filosofia de um pequeno colégio de Santa Catarina. Esta personagem, instigada como que acontecia no Rio de Janeiro e em São Paulo, ia todo o custo nas reuniões, de tal modo presidia algumas aqui no sul, sempre se mantinha a frente do movimento tentando abrir os olhos de todas que conhecia, ensinava suas alunas que deveriam exercer o papel insubstituível no desenvolvimento que só não foi adquirido pelo machismo eminente. E como não é de se espantar se envolveu com o Movimento Feminino pela Anistia, disso resultaram duas prisões.

     E agora, em 1978, as eleições chegaram e por isso, muitas deixaram de vir à reunião para participar da campanha eleitoral, porém Bertha, juntamente com suas amigas, algumas intelectuais vindas da Europa e Estados Unidos, discutem sobre as novas reivindicações, apontam que inicialmente é necessário acabar com a ditadura para que, posteriormente, possam conquistar os direitos das mulheres e tendo a certeza de seus ideais, começam a lutar pela anistia e pelo socialismo feminista, o que resultou a separação dos grupos iniciais, uma vez que um permaneceu nas ideias anteriores e este novo grupo surgia com diferentes caminhos.

     Além de professora, ruiva, feminista, de 30 anos e de olhos acinzentados míopes, Bertha é engajada em outra causa, a AIDS, isso porque, desde sempre, é portadora do vírus HIV, adquirido por meio da transmissão vertical durante o período de amamentação. O primeiro caso registrado foi em 1930 e desde a descoberta, com 15 anos, buscou convulsivamente o que significava, quais eram os sintomas, se existia tratamento, como poderia ser curada...

     HIV — Vírus da Imunodeficiência Humana transmitida por meio de relações sexuais, transmissão vertical, transfusão de sangue, compartilhamento de seringas e acidentes ocupacionais com material perfurante. AIDS — Síndrome da Imunodeficiência Humana, caracterizada pelo enfraquecimento do sistema imunológico. E não, não é a doença dos gays, ela não tem pensamento para optar entre corpos de apenas um gênero e também não é transmitida por toque, saliva, beijos, urina, lágrimas e suor, entendam isso. Algumas pessoas são chamadas de intransmissíveis, isso porque mesmo sendo soropositiva não é capaz de transmitir a outro indivíduo, graças aos remédios do tratamento e dentre este seleto grupo, temos a nossa querida Srta. Nunes.

A morte barafustadaOnde histórias criam vida. Descubra agora