14 de abril de 2018 - 03:05 da madrugada
A chuva bate com força no vidro da pequena sala living de Jonathan. Estou esperando-o fazer os últimos ajustes na máquina do tempo que ele apelidou carinhosamente de "jhow-jhow girl". Tento fingir que não estou nervosa enquanto uso o pequeno cortador de unha em formato de pé sorridente para cortar as unhas da mão.
Quando termino meu serviço de manicure levanto e caminho até o quadro negro que está repleto de reportagens que cortamos no dia anterior, vulgo hoje mais cedo. Não é a primeira vez que viajamos no tempo, é a segunda.
Como tudo isso começou? Bom...
5 meses antes
Um dia Jonathan bateu no meu apartamento que fica a exatos 2 andares abaixo do dele e perguntou se eu queria ir no último show do David Bowie. É logico que eu respondi:
- Claro, se ele não tivesse morrido há dois anos atrás. - Digo olhando para trás para verificar as horas no relógio que ficava em cima da geladeira. Eram 02:02 da madrugada.
Com a porta escancarada e vestida apenas com uma regata cinza, calcinha e uma meia cheia de estrelas azuis. Meu vizinho esquisito do andar de cima parecia eufórico como se tivesse tomado 10 copos de café puro.
- Vem comigo - Jonathan diz me puxando em direção as escadas
Das duas a uma, ou ele enlouqueceu ou descobriu que fui eu que dei seu gato Boris como pagamento da pizza de lombo que pedimos no mês passado. Agora ele descobriu e acho que vou ter meus lindos cabelinhos ruivos raspados e ele vai usar os tufos como peruca.
- Olha, se for sobre o Boris... eu ... - freio bruscamente quando sou parada de frente para a porta do seu banheiro. Seus olhos estão esbugalhados, percebo que está arrumado com uma calça jeans escura e uma camiseta verde musgo com estampas de flamingo. Está usando seu perfume Antônio Bandeiras e ele só usa esse perfume quando algo importante está para acontecer.
Essa maluco-doido está aprontando alguma coisa
- Eu sei que estive ausente nos últimos 2 meses e que você deu o Boris como pagamento da pizza - faz uma pausa ofegante por termos subido correndo a escadaria. - Mas estive trabalhando em algo novo, e você é a única louca...
- Ei! - falo brava o cortando
- Deixa eu terminar, você é a única louca nessa cidade de fim de mundo que me entende, e que compactua com minhas loucuras. - Faz uma pausa novamente e acho que vai ter um ataque de pelanca pela forma histérica que está falando. - Mas você precisa ver isso!
Abre a porta do banheiro lentamente e só consigo pensar:
Por favor que não seja um corpo... que não seja um corpo...
Ele acende a luz do banheiro e fecho os olhos instintivamente. Não estou pronta para descobrir que meu vizinho e querido amigo é um canibal ou pior: pratica necrofilia, bom, acho que as duas coisas são ruins.
- Rosa, abra os olhos - ele bufa.
Abro os olhos lentamente e me deparo com sua banheira. Antes era só a banheira, mas agora tinha uma grande porta de vidro que ia do chão até o teto cobrindo-a por completo.
- Ok... você mandou colocar um box? - falo tentando não parecer estupida.
- Não sua lerda. Não está vendo que essa belezinha é uma máquina do tempo?
- Que? - é pior do que pensava, ele enlouqueceu de vez
- Olha de perto - diz deslizando a porta de vidro até a outra extremidade.
Me aproximo lentamente e paro no tapete azul que está colocado estrategicamente para ninguém escorregar ao sair da banheira. Minha meia fica ensopada e isso me deixa emburrada na hora, nada pior do que pisar no molhado usando meias.
Inclino o corpo para frente e noto um pequeno painel colado no fundo da banheira e um teclado ligado a ele. Tubos finos estão envolta da banheira e vão até o teto.
- Está de brincadeira comigo?
- Lógico que não, espera aí - ele diz e sai do cômodo.
Volta com duas almofadas, uma amarela e outra vermelha e um pedaço de pano com a mesma estampa de sua camiseta, joga na minha direção e agarro no ar. É um samba canção, entendo o recado e coloco o short que fica justo em mim, mas que nele deveria ficar grande por causa de suas pernas finas.
Ele deposita uma almofada em cada extremidade da banheira, entra nela e senta com os joelhos flexionados.
- Senta essa bunda aí - diz apontando para a almofada amarela
Bom, eu poderia muito bem ir embora naquele momento. Voltar para o meu apartamento, trancar as portas e as janelas, fingir que não conhecia mais o Jonathan todas as vezes que nos esbarrássemos na escadaria do prédio. Mas quem disse que eu era normal?
Sentei da mesma forma que ele e esperei com uma grande expectativa crescendo dentro de mim.
- Acabamos de atestar nossa loucura - ele diz e digita algo no pequeno teclado fazendo aparecer uma data na tela negra; 27 de outubro de 2006. Nova York.
Jonathan estica o braço e puxa a porta de correr de vidro até fechar e ouvirmos um "click". Ele olha para mim com uma expectativa e isso me faz sentir gases se formando no meu estomago, faz um gesto com a cabeça como se perguntasse se poderia prosseguir e eu concordo balançando a minha cabeça também. Aperta um botão vermelho e meus olhos se arregalam quando escuto um estalo enorme.
Fecho os olhos com força e sinto como se tivesse sido lançada para longe de dentro de uma espaçonave, pelo menos deve ser essa a sensação.
Escuto ruídos e um grande coro de vozes cantando, quando abro os olhos percebo que estou de mãos dadas a Jonathan. Olho incrédula ao perceber que estamos dentro de uma casa de show e uma placa no fundo do palco diz "The Starman is here".
Meu coração erra uma batida e um sorriso enorme se alarga em minha boca enquanto continuo ouvindo o coro de vozes;
Here am I floating round my tin can
Far above the moon
Planet Earth is blue, and there's nothing
I can do
A princípio era um conto para participar de um desafio, mas como sou avoada demais acabei sabendo dele de última hora e não deu para participar. Mesmo assim vou publica-lo
O tema era: TitanicEspero que gostem do meu primeiro conto.
Cometem e votem para ajudar essa jovem escritora aqui.Gratidão
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Uma estranheza no tempo
Historical FictionUma mulher, um vizinho esquisito e uma... Banheira que viaja no tempo? Rosa Wellington tem 27 anos e sua vida se resume ao trabalho no bar, comidas gordurosas e um interminável sentimento de que não está fazendo nada de útil. Seu melhor amigo é o v...