8 meses atrás
Acordo num sobressalto ao escutar batidas frenéticas na porta da frente. Minha cabeça lateja e olho desnorteado pelo caos a minha volta, estava dormindo em cima do teclado do computador que se encontra todo babado no momento. Puxo a baba e ajeito meus óculos gigantes.
- O que é... – me arrasto até a porta que continua sendo massacrada pelas mãos de algum ogro peludo.
Espio pelo olho mágico, mas dou de cara com um dedo do meio voltado para ele, Boris se entrelaça nas minhas pernas miando freneticamente também.
Está tudo frenético no momento.
Inclusive a dor de cabeça que estou sentindo.
Abro a porta num solavanco e uma mão fechada vai de encontro a minha cara fazendo meus óculos ficarem tortos, não quero ser dramático, mas acho que meu nariz entortou também.
- QUAL O SEU PROBLEMA? – uma mulher com cabelos cor de fósforo e com o tamanho da metade de um toco de árvore vocifera na minha frente.
- Bom, o IPTU, IPVA, LUZ, e NET estão atrasados. Um pouco de síndrome do pânico, infiltração no apartamento todo e quando estou tomando banho na água quente ela fica fria do nada estragando meu momento Celine Dion -respondo prontamente ajeitando os óculos ela franze o cenho desnorteada - e o seu? – pergunto zombeteiro
- São mais ou menos os mesmos que o seus, só que apareceu um novo problema na minha vida adulta de merda – ela levanta uma camiseta azul com vários pontos cinzas e fedendo a cigarro.
Pela cor dos cabelos ou ela menstruou pela cabeça ou essa é uma TPM com direito a surto psicótico na porta do meu apartamento.
- Meu vizinho estranho fica jogando bitucas de cigarro pela janela, e você é o único aqui do prédio que eu vejo fumando. – Fala mais alto que o normal.
- Pronto a madame agora vai ficar de acusação, chegou ontem no prédio e já está enchendo o saco – balanço o dedo na frente dela – Pois saiba que eu não fumo na janela que dá em direção aos apartamentos de baixo porquê ela está emperrada - coloco as mãos na cintura e encaro sua cara de tacho.
- Então quem mais poderia ser nesse diacho de prédio?
- Pode ser o senhor Ramires do apartamento 11... ele vive enfurnado naquele apartamento e fuma que nem uma chaminé, não que eu não fume como uma...bem você entendeu – falo dando de ombros – agora se me dá licença, tenho um projeto para terminar.
Quando vou tentar fechar a porta na cara da Fiona ela espalma a mão nela impedindo que eu a feche, Boris sai correndo do meio das minhas pernas e vai se esfregar nas pernas dela.
- Traíra! – falo sentindo o cheiro da traição
- Oi Miau! – abaixa e faz carinho nele.
Reviro os olhos e pego meu gato de volta. Ela me olha e parece entalada com alguma coisa.
- Fala mulher! – bato o pé impaciente
- Desculpa, não quis te acusar de nada nem meter a mão na sua cara. Sabe é uma bosta chegar do trabalho cansada e de repente dar de cara com um cesto de roupa suja para lavar e comida para fazer – suspira como se estivesse tirando um peso dos ombros- já sentiu como se nada que você fizesse na vida fosse bom o suficiente?
Empurro Boris para dentro do apartamento saio e tranco a porta
- Vem, eu sei exatamente do que você precisa
Sem reclamar ela desce comigo as escadarias, cruzamos as portas do prédio e olho para meu relógio de pulso que marca onze horas da manhã. Caminhamos até a quadra de trás. Empurro as portas da pequena lanchonete do bairro, sentamos e peço o maravilhoso shake tornado com o dobro de calda de chocolate, uma para cada é claro.
- Porque está fazendo isso, eu sou uma estranha – ela pergunta enquanto puxa a bebida pelo canudo
- Porquê eu também estou desesperado por um amigo – dou de ombros e ela ri e apoia o queixo nas mãos me encarando – relaxa, eu sou gay e não curto sequestros.
- Eu sei, vamos dividir nossas patéticas histórias de vida?
- VAMOS!
Estranho esse tipo de coisa acontecer? Não, não é.
Já parou para perceber que as melhores amizades nascem de momentos estranhos como esse?
Eu estive sozinho no meu apartamento com projetos fracassados e um gato que acha que minha cama é uma caixa de areia, quase matei minha avó do coração quando revelei depois de 29 anos de vida que sou gay e ninguém costuma ser amigo do "gay esquisito de 29 anos que até agora pouco morava com a vó e tem um gato chamado Boris e é um aspirante a físico"
Dramático? Bom meu signo é câncer se é que isso responde alguma coisa.
14 de abril de 2018 – 04:54 da madrugada
- Rosa? - abro os olhos e me deparo com as paredes infiltradas do meu banheiro. Meio atordoado pisco os olhos com força.
Não deu certo.
- ROSA? - falo mais alto, ela não responde, penso que poderia ter saído da banheira primeiro.
Levanto me apoiando nas bordas e meus joelhos fraquejam denunciando que fiquei ali sentado tempo o suficiente para que minhas pernas adormeçam, estou sentindo como se estivesse ali a meio século. O formigar na ponta dos pés me incomoda e tiro meus sapatos jogando para o lado de fora da banheira.
Antes de ser expulso da casa da única parente viva que tenho, eu já havia financiado a compra de um cilindro que Rosa carinhosamente apelidou de "box". O projeto original da máquina do tempo estava no terreno da casa da rica e velha senhora Josephine O' Connor vulgo "a vovó rica que me expulsou de casa". Passei meses nesse projeto e gastando minhas últimas economias e meus últimos meses para fazer algo de útil com meu diploma de físico.
Pensei que conseguiria voltar no tempo e pegar aquele quadro que vovó tanto falava que era de grande estima. Mas não era para ela que o quadro iria e sim para um comprador no exterior que já estava a um tempo sendo convencido de que eu possuía o quadro.
Foi fácil convencer Rosa a entrar nessa, tem dinheiro no jogo e ela é tão louca quando eu e ambos estávamos "fudidos e mal pagos"
Só tinha um pequeno adendo que não mencionei ao comprador, que o quadro estava justo aonde? Isso mesmo...
- O que deu errado? - pergunto para o vazio.
- ROSA? CADE VOCÊ SUA CABEÇA DE FOSFORO! - estou começando a ficar irritado.
Caminho me apoiando no batente da porta do banheiro, uma tontura repentina me ameaça jogar no chão. Onde essa garota se meteu? Olho na direção da porta e vejo que as chaves continuam na fechadura e os cadeados estão todos trancados.
Não... não... não
Corro de volta para o banheiro e empurro o vidro do cilindro para o lado, vejo uma pequena rachadura nele e olho para o interior, a bolsa de couro não está mais lá.
a viagem não suportou nós dois.
- Nossa senhora dos viajantes do tempo, que ela não tenha caído na data errada!
*Esse foi na narrativa do Jonathan a partir desse as coisas vão começar a acontecer no nosso querido Titanic.
Espero que gostem, comentem ou deixem um voto (se quiser é claro). Chega de leitores fantasminhas... já não basta os que existem no Titanic ( badum tsss)
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Uma estranheza no tempo
Historical FictionUma mulher, um vizinho esquisito e uma... Banheira que viaja no tempo? Rosa Wellington tem 27 anos e sua vida se resume ao trabalho no bar, comidas gordurosas e um interminável sentimento de que não está fazendo nada de útil. Seu melhor amigo é o v...