Parte quatro: foi um erro

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Devemos agora claramente voltar a algum espaço tempo que a vida de Leonel Joel sofre em continuar existindo. E se for alguém atencioso, notará que "um suposto" "foi um erro". Logo não há porque contar que a mãe julgou um suspeito muito ridículo e incoerente, tal como fez com o pobre do Leopoldino há muitos anos. Motivo qual a Feliz Espaço foi quebrada, possibilitando Joel a comprá-la e renomeá-la.

Após Leopoldino tomar nome de proprietário e a maldita Maria ter sido sequestrada e assassinada brutalmente, como a outra mãe já o tinha culpado pelo sumiço noturno do filho Firmino, pegou muito mal para a fazenda. Sr. Arnaldo apareceu depois dizendo que ele era o real dono, que ele pediu para que seu jardineiro tomasse responsabilidade da coisa por medo da imprensa. Mas todos preferiram se afastar cada vez mais, de maneira a não ter como o lucro cobrir o gasto, levando-o a falência.

Nesta hora, ou como é normal dizer em um livro que teve seu período de fama há muito antes... Neste grão de areia... Leonel Joel estava totalmente embriagado. Largara seu jornal de dez anos atrás em uma gaveta para que nada de ruim lhe acontecesse. Mas antes ouviu outro pedaço da reportagem que Leopoldino deu, já que Joel e Maria estavam bem perto no momento.

"Não temos o intuito de divulgar nada, apenas em mostrar que alienígenas realmente existem."

"E onde está o corpo?", quis saber a repórter empolgada. Joel, contudo, não soube o que Leopoldino respondeu, e nem se importa se o que a imprensa mostrou no jornal falante foi real.

É possível agora voltar ao tempo, bem quando finalizamos as memórias de Leopoldino...

... Joel estava correndo entusiasmado para o Lago-Pato, e Maria o seguia. Todos se excitaram com a história do garoto Firmino. A criança que sofria de síndrome de Down, Jocelyn, quando soube da história, afirmou que há muito tempo antes já havia visto a criatura, que um da espécie habita entre eles todo o tempo. Jocelyn disse também que a criatura é bastante especializada em medicina, contudo busca estudos sociais na Terra, já que eles vivem em constante guerra. Obviamente ninguém acreditou, preferindo ir eles mesmos verem a... peculiaridade.

Joel nunca teve coragem o suficiente para contar a verdade à sua mãe, preferia deixá-la como estava: uma mãe que fingia sentimentos.

Mas naquele dia ele quis mudar. Dez anos haviam se passado, ele era agora um adulto. Não iriam falar "Você está inventando isso pelas notícias que viu" ou "É o medo quem o fez ver tantas coisas", como disse um psicólogo que a mãe comprou as palavras com dinheiro sujo e corrupto.

— Quer saber, mãe? Foda-se — sua voz estava pouco embriagada, mas não tanto quanto o corpo. Mariazinha latiu como se pedisse para que ele se aliviasse, soltasse o peso que segurara por tanto tempo. — A Maria foi morta por um alienígena. Eu sei que você não vai acreditar — ele riu com a garrafa de vodca na mão direita. — Você nunca acredita em nada, ah não ser no dinheiro. Fala, quantos milhões eles pagaram para encobrir sua verdade? Por que você sabia, não sabia? Sempre soube que aquelas feridas não eram normais no corpo da sua maldita filha. Sempre soube que ela não foi realmente sequestrada.

Mariazinha latiu ainda mais forte.

— Você não sabe o que diz...

— Vamos, mãe, fala... É o quê? Área cinquenta e um? Uma nova base? Algo ainda mais secreto que o maldito governo tanto esconde?

— Joel, você me deve respeito.

— Foda-se o respeito — ele deu uma longa tragada na garrafa. — Isso dói. O álcool dói. Mas sabe o que mais dói? A porra da sua mãe te deixar como um louco. Querendo distorcer o que o filho viu — voltou a beber e gritar quando o álcool queimou sua garganta, então continuou: — Eu tinha dez anos, mãe, um garoto fodido de dez anos que viu o que viu. E o que você fez?

— Leonel Joel, cale-se! — ela ordenou, pondo-se em pé e jogando as abas do sobretudo para trás, acompanhando o escuro cabelo escovado na altura dos ombros.

Sobre os latidos do cão, Joel continuou com sua cena:

— Diga, maldita, como é vender o filho e a filha por alguns milhares?

Mariazinha latiu ainda mais, rosnava agora, como se o animal tivesse uma ligação interna com seu dono.

— Você não tem esse direito — ela gritou.

— E você tinha o direito de vender seus filhos? De esconder a porra da verdade?

Mariazinha avançou na mãe de Joel, cujo nome não é relevante. Ela gritou e esbofeteou o cão com sua bolsa.

— Saia, sua praga — ela rugiu, e depois o repetiu ainda mais alto, de dor, porém. Mariazinha cravou seus dentes na panturrilha magricela e misturou tecido de algodão com sangue e pele.

Joel tinha a cena como algo que era só dele, e que ele esperava por muito tempo. E enquanto assistia a cena do seu cachorro devorando a mãe gritante e ensanguentada, lembrou-se da pergunta que alguém não importante lhe fez um dia: Por que você bebe, Joel?

E então ele respondeu com as mais sinceras palavras que seu coração poderia pulsar:

— Vez para fugir do demônio que há em mim, vez para ter um único momento de felicidade.

— Mas você sabe que após a felicidade do álcool, vem a tristeza —retrucou o certo alguém.

— Nada que não tenha sentido antes, ou agora...

Eprincipalmente agora, quando Mariazinha latia em sua direção, com a caldasacudindo peluda e enegrecida como o resto do corpo, com os pelos pingandosangue do que um dia deveria ser uma mãe para Joel e Maria.    

Joel e MariaOnde histórias criam vida. Descubra agora