Existe uma pesquisa que diz que ao menos 92% dos moradores de rua são homens e uma grande parte é usuária de drogas, ingere álcool com frequência e já sofreu alguma desilusão amorosa. Não precisaria ser nenhum gênio da matemática ou algo do tipo para chegar a conclusão de que isso é uma estimativa muito grande.
Olhei em volta do quarto de hotel, onde tinha algumas garrafas de bebida - no qual eu nem sabia o nome - alguns remédios para dor de cabeça - que não deixavam de ser drogas - e olhei minha situação, depois de um término doloroso: era deplorável! Eu poderia ser facilmente confundido com um indigente, já que minha aparência não estava nada bem.
Dei um salto da cama, sofrendo um pequeno choque térmico ao tocar o chão gelado com meus pés quentes. Mesmo sendo verão aqui no Japão, meu quarto parecia uma amostra grátis de Londres no inverno, já que eu havia ajustado o ar condicionado no mínimo possível na noite passada. Parecia um ambiente agradável para minha pequena depressão se alastrar. Um clima gelado, quase que sem vida, com uma incrível sintonia de qualquer música triste do aleatório do spotify. O fato de eu ter acordado no japão, não diminuía o fato de eu estar me sentindo tão pra baixo, tão sozinho. Era como se todas as luzes bonitas de Tokyo fizessem me lembrar de Arzaylea. Na verdade, isso não fazia sentido algum.
Meu celular vibrou e o rosto de Calum apareceu. Por impulso olhei as horas e me assustei ao ver que eram nove horas da noite.
- Vejo que a bela adormecida finalmente acordou! - Cal soou irônico no outro lado da linha e eu revirei os olhos, um hábito que eu adotei tem algum tempo.
- Não, ainda estou dormindo e você está no meu sonho, infelizmente.
- Alguém trocou as ferraduras. Agressivo. - Calum entrou pela porta acompanhado de Ash e eu me joguei na cama novamente, me cobrindo até a cabeça. E lá vamos nós para mais um discurso sobre "como curtir a vida no Japão e esquecer os fantasmas do passado".
- Isso aqui está fedendo. - Ash tapou o nariz e negou com a cabeça, enquanto mexia no monte de garrafas que tinha no canto do quarto. - Dude, você está péssimo.
- Bela constatação, Irwin. - ironizei, me sentando na cama.
- Cara, você não saiu do quarto desde que chegamos aqui. Japão é um lugar lindo e você está perdendo. - Ash ignorou meu comentário anterior e me repreendeu.
- Meu senhor criador dos pokemons, que cheiro é esse? Alguém morreu aqui? - Michael entrou no quarto, com uma touca do Pikachu, visivelmente consumido pelo vírus "japão". Ele amava toda essa vibe.
- Sim, a dignidade do Luke. - Calum falou enquanto mexia em seu celular, um tanto quanto "focado".
- E aparentemente essa é a setlist do funeral. - Michael riu se sentando de frente para o meu notebook, pausando a música Caves do Haux e colocando Heartbrack Girl. O olhei incrédulo e ele deu de ombros. - Para você recuperar a essência e se lembrar que temos fãs lá fora. Fãs que querem ver um Luke entusiasmado e não esse impostor com cabelo oleoso, ramela nos olhos e com uma cara de quem está com dor..
- E eu estou com dor! - reclamei me defendendo e os três me olharam com a sobrancelha arqueada. Se eu não estivesse tão focado em provar para os meus amigos que a situação que eu me encontrava era horrível e implorar para que me deixassem perecer nessa cama, eu poderia até comentar sobre a sincronia dos três e de como isso foi engraçado.
- Luke, eu sei que o termino do seu namoro com a Arzaylea foi doloroso. Nós sabemos o quanto você a amava e é super visível que você está sofrendo. Mas acabou, bro. Arzaylea deixou claro que não era recíproco e todos nós entendemos o quão vaca ela foi por ter feito isso com você, mas a vida não para. Nós estamos no Japão, meu caro amigo. - Ash disse se abaixando a minha frente e abrindo os braços para demonstrar que, de fato, estávamos no Japão.
- Lá fora tem milhares de pessoas novas, tem pessoas que te amam de verdade, pessoas que realmente se importam com você. - Michael entoou com empolgação. - Tem lojas de animes, bares, festas, mulheres atraentes, restaurantes, enfim, milhares de experiências te esperando e você não vai vive-las, porque você tá deixando essa merda de tristeza tomar sua vida.
- São raras as vezes que podemos vislumbrar esse Mike sábio e todo empolgado, totalmente possuído pelos Pokémons. - Cal disse, nos fazendo rir. - Se eu fosse você, absorvia essas sábias palavras.
- Obrigado, meu caro amigo falso asiático. - Mike vez uma dramática reverência e Cal retribuiu.
- Disponha, meu caro amigo, futuro careca.
- Por Deus, eu odeio essa banda. - brinquei voltando a me cobrir por completo.
Hoje iríamos nos apresentar em uma casa de shows. Não era um grande evento, era algo mais reservado, nada muito produzido. Me levantei e fui para o banheiro, enquanto os outros integrantes da minha banda discutiam qual música entraria na setlist como um bônus. Me abstive da conversa, alegando que todas nossas músicas eram boas e, o que ficasse decidido ali, aceitaria de bom agrado.
Provavelmente toda essa ladainha de "estou sofrendo pelo término do meu namoro de 2 anos" soa um tanto quanto dramático, até mesmo para alguém como eu. Arzaylea havia terminado comigo por mensagem e eu tenho plena consciência de como estou sendo trouxa em estar sofrendo por alguém que escolheu, entre n maneiras, terminar comigo por mensagem. Eu sei, um completo idiota. Mas doia, e muito. Foram dois anos de dedicação e sentimentos intensos, aparentemente vindo apenas da minha parte. Eu senti, até de mais e desmentir que tudo isso me afetava me transformaria em um completo mentiroso. Entre a mentira e a transparência, mostrar a verdade aparentava ser a melhor decisão.
Eu estava no auge dos meus 20 anos, a hipótese de chegar ao fim da minha vida sem compartilhar tudo com alguém, me assustava.[...]
Os últimos acordes de Broken Home soaram pelo espaço e algumas pessoas que estavam perto do palco improvisado bateram palmas. Era notório a feição de tédio estampado no rosto de algumas pessoa, já que as mesmas aparentavam ter o triplo da idade que eu, Calum, Ashton e Michael tínhamos... juntos.
- Estamos no auge da fama. - Michael ironizou, fingindo entusiasmo e eu abafei uma risada. Já havíamos feito shows em vários lugares, com várias pessoas que, de longe, eram mais entusiasmadas do que essas.
- Fiquei sabendo que é um aniversário. - Ash disse nos guiando a saída do "palco", nos fazendo o olhar surpresos. Ele estava do nosso lado durante duas longas horas, como é que ele sabia de alguma informação? - Twitter. - ele respondeu nosso olhar, balançando seu celular. - Estamos nos trending topc's. Isso sim que é fama, caro amigo Michael.
- Aqui tem alguns gatos pingados. Como é que fomos parar nos tt's? - Cal perguntou fazendo uma careta.
- Vocês acabam de tocar na festa de aniversário da filha do Masayoshi Son, fundador da Softbank. Essa garotinha tem Japão nas mãos. - Adam, o CEO da 5sos, falou aparecendo misteriosamente, como o Mestre dos Magos. O olhei atônito. Olhando para esse lugar, ninguém imaginária o poder do indivíduo que estava por trás dessa festa.
- Se vocês me dão licença, irei desfrutar daquele barzinho ali e tentar não surtar com o fato de que acabamos de tocar para a maior influência do japão. - Ash piscou e seguiu para o bar.
- Eu vou beber também, mas antes irei surtar, com toda certeza. - Michael maneoou a cabeça. Ele sempre fazia isso quando estava nervoso. Era uma cena engraçada. - Como você não avisa antes que iríamos tocar para um cara super importante?
- Não é um fato muito importante. - Adam deu de ombros, também indo para o bar, sendo seguido por nós.
- Desculpa, mas sua concepção de importância é bem diferente da nossa. - disse rindo irônico.
- E do mundo inteiro. - Cal alterou a voz e abriu os braços, tentando delimitar o tamanho do mundo.
- Qual é garotos, vocês são bons! Vocês têm que acreditar mais no potencial de vocês. - Adam riu, pegando uma garrafa de seja-lá-qual-bebida-era-aquilo.
- Nós poderíamos ter nos preparado mais. - Ash bufou, tomando um gole de seu drink colorido.
- Garotos, existem problemas maiores no mundo para se preocupar. Vocês arrasaram, a filha do cara gostou, isso é o que importa, não é? - Adam perguntou animado e um tanto entediado com a nossa insegurança.
- Sim, mas você deveria ter nos avisado. - Mike repetiu, dando um sorrisinho.
- O mundo deveria rodar em sentido anti-horário, a chuva deveria ser de chocolate, comida boa deveria ser de graça e blá, blá, blá. Se vamos ficar nessa de "deveria, deveria", posso apresentar uma lista de exigências ou sonhos inalcançáveis. O fato é que já aconteceu, já foi. - disse Adam. - Vocês fizeram um show incrível, as pessoas gostaram! Agora vão se divertir, encher a cara ou sei lá. E me lembrem mais tarde de marcar uma sessão com um psicólogo para vocês, para melhorar essa insegurança toda ai. Boa festa, garotos! - e, deixando quatro garotos de queixo caído, Adam virou de costas e saiu, como se não tivesse acabado de dar o maior show que, com toda certeza, dava de dez à zero no nosso.
- Alguém, por favor, me lembra de quem foi a ideia de contratar esse cara, porque eu preciso urgentemente pegar uma bebida para essa pessoa. - Michael disse se jogando no banco. - Esse cara é a essência dessa banda!
- Ele deveria ser mais sensível. - Cal disse, pedindo uma cerveja. Eu mal podia ver bebida na minha frente, do tanto que eu havia enchido a cara na noite passada. Eu, com toda certeza, passaria algum tempo sem colocar essa coisa na boca.
- Você não escutou a lição de moral que ele acabou de dar sobre "deveria"? - disse rindo, me sentando ao lado de Ash.
- Pelo amor de Deus, se mais alguém falar a palavra "deveria", eu juro que me mato. - Ash surtou, colocando as mãos na cabeça, nos fazendo rir.
- Deveria, deveria, deveria! - Mike e Cal cantarolaram juntos, fazendo Ash soltar um risinho cínico.
- Vocês são péssimos amigos!
- Eu odeio essa banda. - repeti, rindo e me virando de costas para eles.
A festa estava tão caída e depressiva quanto meu estado emocional no momento, mas isso não era um empecilho para algumas pessoas, que aparentavam ter nossa idade, de dançar que nem loucas ao som de Naive do The Kooks. Uma delas reconheci ser a tal garota que tinha Japão nas mãos, já que sua cara estava estampada em um banner gigantesco do lado de uma mesa cheia de presentes. Era notório como a mesma estava aproveitando seu aniversário, pois ela pulava e dava muita risada, aparentemente não se importando muito com seu pai, que estava em um canto, negando com a cabeça.
Aquele grupo de amigos havia realmente prendido minha atenção, mas em específico uma garota ruiva, que dançava sem se preocupar com olhares negativos. Seu cabelo avermelhado pairava sobre o ar, conforme a mesma pulava e tentava manter o ritmo da música, não dando muito certo, é claro.
- Hey Lukey, acorda cara. - Calum passou a mão à frente de meu rosto e eu o olhei atônito. - Já cumprimos nosso dever de super astros do rock, vamos embora? - assenti me virando uma última vez para olhar a garota sem ritmo e sorri.
É, eu precisava me divertir mais!

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Woke up in Japan
FanfictionEu havia acordado no Japão, me sentindo tão pra baixo, tão sozinho. Eu sabia que atrás da porta do meu quarto de hotel tinha festas, luzes, pessoas me esperando, mas o fato de não tê-la mais para mim tirava toda a graça do mundo, mas eu estava apto...