(Parte 8)

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          Puxei Kris pelos braços e dei o abraço mais apertado que eu consegui. As lágrimas rapidamente correram do meu rosto para seu pescoço, molhando o colarinho de sua camisa. Estava profundamente grata por sua existência, por sua bondade e pelo seu tempo. Por ter pensado em Evie e por ter conseguido fazer o que eu fui incapacitada de fazer.

— Obrigada. — Falei dando-lhe mais um aperto ou pelo menos tentei. Meu corpo parecia não me responder, faltava-me energia; a que ainda restava parecia se voltar apenas para movimentos básicos e me ajudar a sobreviver a dor.

— Não me agradeça ainda. — Franzi o cenho para Kris, esperando por suas próximas palavras que, imaginei, chacoalhariam novamente meu mundo. — A polícia foi acionada quando eu trouxe você para o hospital e eles começaram a investigar o ocorrido... Dois deles estão lá fora esperando para pegar seu depoimento.

          Encarei Kris por longos segundos, tentando assimilar o que tinha me dito, que realidade era aquela onde eu tinha me metido e como eu poderia voltar algumas casas para ter minha vida de antes.

— O que você disse a eles? — Perguntei em tom acusador. Por mais que gostaria que alguém aparecesse para resolver tudo aquilo por mim, eu ainda queria ter algo a dizer sobre o desenrolar das coisas.

          Kris percebeu meu tom, resultando numa mudança na atmosfera. Seu corpo se contraiu, afastando-se do meu toque e suas feições se tornaram turvas na medida que seus pensamentos progrediam. Podia até ser engraçado aquela sintonia que não perdemos com o tempo, mas o momento era trágico demais para poder se extrair algo de bom dali.

— O que eu sabia. — Rebateu.

— Eles prenderam Daniel?! — Alarmei-me. Não sabia exatamente o motivo de estar apreensiva com aquele fato, mas fora algo que apenas aconteceu.

— Não, Olívia. — E um alívio saiu do meu peito, encaminhando-se para o ar ao meu redor e se dissipando. — Ainda não. — Bateram na porta naquele exato momento, fazendo meu peito sapatear rapidamente. Olhei assustada para Kris, tentando lhe suplicar para que afastasse qualquer pessoa que estivesse ali, mas ele simplesmente permitiu que entrassem e começassem um interrogatório. Sua mão segurando a minha já não me passava mais segurança. Sentia que estava sozinha daquela vez.

          Entraram dois policiais pela porta, um rapaz que aparentava ter por volta de trinta anos de idade. Alto, loiro e com feições brutas no rosto. O outro, seu oposto, era mais velho. Tinha uma estatura baixa, não parecendo passar de um metro de sessenta, e um corpo robusto. Trazia em seu rosto um horrível bigode que lhe roubava o lábio superior e que podia hipnotizar qualquer um que prestasse atenção em sua boca enquanto falava. E eu fui prova viva disso. Enquanto se apresentava, ele e seu parceiro, e explicava que estava ali para fazer o possível a fim de me ajudar, eu só conseguia observar curiosamente como seus pêlos faciais se moviam espertamente em sintonia com seus lábios. Pareciam pequenas criaturas que tomaram posse de seu rosto de forma tão gloriosa que nem mesmo seu hospedeiro notara.

— Liv? Tá tudo bem? — Kris dera um pequeno aperto na minha mão, trazendo-me de volta do meu transe. Olhei para ele tentando adivinhar se algo havia sido perguntado para mim, mas, como não consegui entender, apenas sorri levemente para ele, confirmando que estava bem.

— E então...? — O policial estava com um pequeno bloco de notas na mão, juntamente com uma caneta, a postas para as anotações que eu presumi serem sobre o que havia acontecido comigo. E aqui eu chegara na minha encruzilhada. Contar ou não contar. Falar com censura ou livremente? O que eu deveria realmente fazer? No que implicaria minha fala? Respirei profundamente, tentando ganhar o máximo de tempo que eu poderia conseguir.

Um pedaço de mimOnde histórias criam vida. Descubra agora