Já tinha lido aquela revista Contigo quinze vezes nos últimos sete meses. Estava na hora de o hospital trocar o material de leitura da sala de espera. As receitas de Natal, as fotos das árvores exuberantes dos famosos e a moda praia estavam me deixando ansiosa no meio do mês de Julho. Me davam a sensação que o ano já estava no fim, quando ainda estava só na metade.
Me mexi na cadeira mais uma vez tentando achar uma posição confortável enquanto esperava para conseguir falar com a minha irmã, a médica do consultório ginecológico. Era muito difícil conseguir uma brecha na agenda apertada para que pudéssemos sair para almoçar e nessa, já eram quase duas da tarde e eu estava morrendo de fome.
Resolvi dar uma volta no corredor e andei até a máquina de batatinhas, doces e refrigerantes. Como uma típica libriana, fiquei muitos minutos observando as opções e estava realmente encontrando dificuldade para escolher o que era melhor; Ruffles, Pringles, KitKat ou Prestígio. Tudo a ver. Levei um susto quando ouvi uma voz meio grogue do meu lado e levei a mão ao peito para controlar os batimentos cardíacos.
- As batatinhas não vão sair daí de dentro sozinhas. - Olhei para o lado e tinha um cara apoiado na máquina e eu juro que quase saí correndo. Ele tinha os braços completamente tatuados, estava com uma roupa de hospital e os olhos um pouco vermelhos e o rosto inchado. Honestamente, tinha uma aparência meio deprimente e assustadora. Preferi não responder e tentei me concentrar para decidir logo e sair dali o mais rápido possível. - Você fica muito bonitinha com essa cara de dúvida. - Percebi pelo canto dos olhos que o estranho estava sorrindo meio abobalhado. Não acredito que ele estava dando em cima de mim. Para minha sorte uma enfermeira apareceu desesperada buscando por ele.
- Como você veio parar nessa ala do hospital, nesse estado?? - Ela segurou a mão dele, tentando levá-lo consigo. - A ala psiquiátrica é do outro lado, meu Deus. Não é possível que só eu trabalhe nesse lugar e ninguém tenha notado você saindo. - Percebi que ela continuava resmungando no caminho, enquanto puxava o estranho junto, que embora meio relutante em sair e tirar os olhos de mim, acabou indo sem pestanejar.
Sabendo que não corria mais o risco de contato visual, resolvi olhar a cena e embora meu coração estivesse ainda meio descompassado, eu fiquei na dúvida se ria ou se ficava preocupada.
A roupa do hospital estava entreaberta na parte traseira, deixando visível uma samba-canção de estrelinhas, o tatuado estava descalço e seu andar era bastante vacilante.Meus pensamentos foram interrompidos pela voz da minha irmã me chamando pelo corredor. Finalmente íamos almoçar e eu nem precisei escolher nada na máquina.
- Iara!! - Exclamei feliz ao vê-la e caminhei ao seu encontro. Ela estendeu o braço para que eu passasse o meu e saímos entrelaçadas.
Minha irmã era quase quinze anos mais velha que eu. Enquanto ela já era uma médica formada, eu ainda tinha dezoito anos e estava para começar o quarto período da faculdade de Direito. Eu havia entrado na faculdade cedo e estava prestes a começar meu primeiro estágio pouco após meu aniversário de 19 anos. Apesar de termos uma diferença tão grande de idade, éramos extremamente ligadas e sempre que podíamos, estávamos juntas.
- Jojô, me conta as novidades. - Só ela podia me chamar assim. Detestava ouvir aquele apelido da boca de qualquer outra pessoa. Preferia que me chamassem de Joana ou no máximo, Jô.
- Nossa... você não vai acreditar, um louco... - Saímos do hospital enquanto ela me ouvia dissertar sobre o caso inusitado que havia acabado de me acontecer.
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Miriam tinha me chamado para ir ao barzinho após a aula de Direito Penal III, na sexta-feira à tarde. Eu não estava totalmente empolgada, mas achei que era melhor aceitar, já que eu raramente saía de casa.
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Quais segredos ele esconde? [CONTO COMPLETO]
Teen FictionNa primeira vez que Joana o viu, ela achou que fosse louco. Na segunda, um embriagado. Na terceira, ficou preocupada com a frequência dos encontros inusitados. Mas quando a quarta vez chegou e ela passou a ver André quase todo dia, a curiosidade foi...