Mercy

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Perdi a noção de quanto tempo estávamos ali, parados na mesma posição. As mãos de Gabriel me segurando pela cintura, meu corpo inclinado para trás e nossas bocas muito próximas uma da outra. Nossa respiração estava ofegante, não sei se pela corrida ou pela situação. Eu tinha que fazer algo e, a primeira coisa que me veio em mente foi:

- Ganhei! - disse me soltando dele, virando e colocando a mão no carro. - Alguém me deve um açaí! - e pisquei mostrando a língua para ele. Biel coçou a nuca e sorriu sem graça.

Entramos no carro e, pela primeira vez, senti um silêncio estranho. Tentei quebrar o gelo:

- Muito feio trapacear, viu Senhor Gabriel?!

Biel fez cara de surpreso: - Não fui eu quem pediu um favor e saiu correndo do nada! 

 - Não tenho culpa que você demorou para correr depois que eu falei "já". - tentei parecer inocente. - Sem desculpa, me deve um açaí e ponto final! - ri.

- Tudo bem, tudo bem, te levo para comer açaí... Mas não agora. - ele parecia sério e, por um momento, fiquei sem reação. Será que ele achou que eu estava forçando a barra para sair com ele outra vez? - Agora eu queria te levar em outro lugar... - ele continuou e lhe olhei surpresa. - você gosta de comida japonesa?

- Se eu gosto?! Eu amo! Por quê?

- Então se prepara que você vai comer o melhor japa da sua vida! 

Estávamos escutando uns rocks antigos e apesar de eu conhecer alguns deles, não sabia cantar nenhum. 

- Posso colocar minha playlist? - fiz carinha do gato do Shrek

- Por quê? Não tá gostando da minha? - ele riu

- Não é isso... É que gosto de cantar e não sei a letra dessas - depois que disse isso, pareceu meio bobo e encolhi os ombros. Biel sorriu.

- Essa eu quero ver! Muda aí! 

Conectei o celular no Bluetooth do rádio e a primeira música que tocou foi "Mercy" do Shawn Mendes:

“You’ve got a hold on me

Don't even know your power

I stand a hundred feet

But I fall when I'm around ya

Show me an open door

And you go and slam it on me

I can't take anymore"

Parei de cantar: - Se você está achando que ficar me encarando vai me fazer ficar com vergonha e voltar para suas músicas de vovô, está muito enganado! – debochei.

- Na verdade eu só estava pensando que além de correr, jogar vôlei e ser linda, você canta muito bem! 

Tá, confesso, fiquei sem saber o que responder. Sim, ele foi muito fofo agora e pareceu muito uma cantada, mas então porque ele não me beijou aquela hora no parque? Ai, caraca! Não sei o que pensar, apenas olhei para a janela ao meu lado e continuei cantando. 

Chegamos em uma rua bem tranquila, Gabriel estacionou o carro e descemos. O lugar parecia pequeno por fora, havia apenas um singelo letreiro e algumas plantas, mas, ao cruzar a porta, demos de cara um salão repleto de mesas.

Um homem de meia idade se aproximou de nós, cumprimentou Biel o chamando pelo nome – o que deu a entender que ele come lá com frequência - e nos levou através do salão até um jardim lindo, onde havia um tatame. Nos sentamos e o garçom se afastou. Olhei em volta e aquilo parecia cenário de um filme: uma pequena ponte de pedras que passava por cima de um laguinho com peixes, flores de cerejeira espalhadas pelos canteiros e algumas luminárias orientais.

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