Sinal

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1.
O barulho rápido do e-mail sai do computador e vai direto aos seus ouvidos. Ela levanta da cama num pulo. Na verdade, já estava acordada, apenas se recusava a levantar.
Sua visão está turva. Levantou rápido demais.
— Emile, o que está acontecendo contigo? — pergunta a si mesma.
As lembranças da noite passada começam a surgir. Aos poucos.
— Vamos, faça um esforço, lembre-se de tudo! — mais uma vez para si mesma.
Finalmente. Lembra-se de mais algumas coisas. O Angels’ Club. Ela tinha ido lá na noite anterior, para tentar esquecer, ao menos por algumas horas, aquele passado horrível que ainda a atormenta todos os dias.
Ela corre até o banheiro e vomita na pia. O cheiro forte de bebida invade o ambiente.
— Oh, não! — resmunga. — O que eu fiz ontem à noite?
Havia bebido demais, essa era a única explicação.
Emile olha em volta e acaba tendo a mesma impressão que teve semanas atrás: o apartamento parece pequeno demais para ela.
A tela do computador não para de piscar. Ela abre o e-mail e observa o endereço do remetente:

scp@kmail.com

Encara a tela, tentando desvendar. Não demora muito, até lembrar-se de Willian, seu ex-namorado. As três letras no endereço do e-mail — scp — são iniciais das palavras de uma frase que Emile conhece muito bem. Willian usava essa frase, “Sob chuva de pensamentos”, para identificá-lo. Qualquer lugar que estivesse, e que considerasse realmente importante, ele gravava a frase, numa árvore ou numa pedra... Uma bobagem.
Na verdade, ela quer esquecê-lo. Totalmente. Como alguém que perde a memória.
Will havia destruído sua vida quatro anos atrás: matou as pessoas que ela mais amava. Agora Emile torce para que o endereço eletrônico não tenha nenhuma ligação com a frase preferida dele. Afinal, pode ser apenas uma coincidência... ou melhor, uma armadilha formada por sua mente. Pois ele está morto.
Ele está morto, pensa. Pare de paranoia.
Balança a cabeça, tentando se livrar daquela imagem aterrorizante provocada por ele. Sua frágil irmãzinha e os pais. Os três, mortos.
Emile, segura firme o mouse, mesmo tremendo, e abre a mensagem clicando no endereço. O que está escrito, faz um arrepio enorme correr por todo o corpo:

Desastres são irreparáveis. Mas, às vezes, se tornam um vício para aqueles que os cometem.

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