Convicções de um mártir

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 –Capítulo I–

2017

Pai Nosso, que estás no céu, venha ao nosso reino... não, isto está errado. Santificado seja o Vosso nome, dai-nos o pão de cada dia. Eu tenho quase certeza que não é assim. Perdoai os nossos pecados, isso. Assim como nós perdoamos a quem nos tem perdoado – o quê? Que merda é essa, está errado.

– Harry, o que você está fazendo?

O garoto ergueu a cabeça abruptamente, estalando o pescoço, e se aproximou da cama. O quarto estava pouco iluminado, embora a luz alaranjada que entrava da janela fosse realmente bonita. Estava tudo muito silencioso, então até mesmo o sussurro fraco de Louis pareceu ecoar pelas paredes. Harry aproveitou que ele tinha cochilado para tentar um pouco de conversa monológica com o cara de cima, mas não tinha tido tanto sucesso quanto esperava.

De qualquer maneira, todos os pensamentos desapareceram quando Louis o chamou. Escorregou sua mão até a dele, aproveitando o toque frio e macio que o eletrizava. Seu garoto estava tão debilitado quanto possível, coberto de soros e monitores irritantes – Harry já teria tirado-o daquele lugar deplorável se não fosse estritamente necessário que ele passasse por cada maldito exame, e, mesmo assim, mesmo sabendo que era o certo, seu coração ainda doía um pouco.

– Estava tentando rezar. – admitiu, também com a voz baixa, e um tanto envergonhado, todavia, se Louis achou engraçado, disfarçou muito bem. Apenas sorriu, como pôde, enquanto seus dedos finos brincavam com os anéis folgados da mão de Harry.

– Pensei que você não acreditasse em Deus. – mesmo com o rosto esbranquecido e a aparência cansada, ele ainda conseguia ser debochado, com uma elegante sobrancelha arqueada. Harry reprimiu aos seus instintos mais primitivos de ser mais zombeteiro, e apenas rolou os olhos.

– Tempos desesperados pedem medidas desesperadas. – mordeu o lado interior da bochecha, inclinando-se sobre a cama para ficar protetoralmente mais perto do outro, ignorando as dores nas costas de estar há tanto tempo sentado naquela cadeira dobrável de plástico – E não acreditar e odiar são coisas diferentes.

– Não entendo esse seu ódio por Deus. – Louis suspirou, repentinamente exausto, enquanto se acomodava para poder encarar melhor o rosto de Harry, que, naquele momento, convertia-se em uma careta de descrença.

– Olha onde Ele nos trouxe. – retrucou, agora ligeiramente rude, e o Tomlinson permaneceu em silêncio.

Harry sabia que talvez tinha passado dos limites, mas apenas não tinha como evitar. Pouco menos de quarenta e oito horas haviam se passado desde que descobriram do câncer, e nem três dias desde a tentativa de atropelamento – o cacheado sequer tinha conseguido suprir toda a saudade de Louis, e já estavam novamente em uma espiral de tragédias. Ele não era a melhor pessoa para falar, mas tinha a impressão de que, se Deus realmente existia, ele tinha um senso muito distorcido de humor, para dizer o mínimo. Talvez, o Styles estivesse apenas a procura de alguém para culpar, e, se precisasse sofrer a ira divina por um sacrilégio, que fosse – aquele não estava sendo seu melhor momento, de qualquer maneira –.

Seus olhos esquadrinharam atentamento o rosto de Louis, gravando seus detalhes, como se já não fosse capaz de reproduzi-los perfeitamente. Não. Perfeitamente não – nenhuma pintura seria capaz de reproduzir seus traços com tanta maestria. Mesmo pálido e com os olhos inchados de quem, literalmente, chorara o dia todo, Louis continuava tão lindo quanto em seus sonhos. Depois de tanto tempo, vê-lo, mesmo de tão perto, parecia mais como uma ilusão deveras bem construída. Tocá-lo, sentir o calor de sua pele, ouvir sua voz – era como um viciado provando sua droga preferida depois de uma longa abstinência. A doçura descia por sua garganta, alojando-se entre seus pulmões, e Harry jamais se cansaria da sensação. Tudo que desejava, então, era poder usufruir de cada centímetro de seu corpo, mas não abusaria tanto da sorte – o fato de estarem juntos, vivos, já era o máximo que poderia esperar da sua vida miserável.

Unforgettable (Larry Stylinson AU | Book III)Onde histórias criam vida. Descubra agora