TRINTA

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“Hm, mas que merda hein?” – Falo, acendo um cigarro. Olho para ele de relance que revira os olhos para mim.

“É mais que ‘uma merda’, é o fim do mundo!” Ele diz e está sendo dramático quando se refere ao seu relacionamento enrolado com o Natan.

“Tá vendo, se você tivesse escolhido ser hetero e não me dado um fora nada disso estaria acontecendo.” – Faço uma piadinha e consigo fazê-lo rir. Seus olhos são castanhos mas tão claros que consigo ver dentro deles.

“Isso é sério. Estou numa porra de triangulo amoroso e meu namorado nem sabe disso.” – Diz. Deita-se na grama úmida do meu jardim. Seus olhos brilham quando fita as folhas na copa das arvores. Seu cabelo loiro quase fica branco quando tocado pela luz opaca do sol num dia nublado. Observo o jeito que suas pernas se cruzam uma sobre a outra e fazem seu calção jeans virar para o lado esquerdo. Ele fica em silencio como se esperasse um conselho meu. Mas eu sou péssima com conselhos. Trago o cigarro e solto a fumaça lentamente pelo nariz.

“Pra que se importar com isso T. Se o Natan achar ruim manda ele ir se fuder.”

“Pra você funciona ligar o foda-se?” – Ele pergunta e vira-se para me olhar. Arqueia uma sobrancelha e é como se me desafiasse a responder. Subitamente lembro-me do Matheus. Lembro-me de como ele parecia feliz com a Angela. Lembro dos meus pais, e da minha avaliação final de botânica. Penso na minha falta de dinheiro e na vitamina de maracujá no chão do meu quarto. Coisas banais me deixam estressada. Dou um tapinha no cigarro para separar as cinzas e o vento as sopra para longe antes que elas possam cair sobre o chão. 

“Funciona sim.” – Digo finalmente. Já treinei isso no espelho e minha resposta sai perfeita, sem nenhum abalo emocional. Quase me convenço de não me importo com tudo isso.

“Você está melhorando, mas não me engana Mich. Treine mais vezes.” – Ele diz como se soubesse que estava mentindo. O que seria possível já que Tiago e eu somos amigos desde o jardim 1.

“Gays e seus poderes de observação.” – Falo. Ele ri. Tira a camisa e entra na piscina. Sua pele branca cintila e me faz amar o fato de ser negra. Procuro uma sombra e deito sobre a grama tentando esquecer da minha vida.

“Eu sinto muito por seus pais” – Tiago diz, sei que ele está na borda da piscina e olha para mim. Mas eu não ouço. Estou dormindo. 

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