Era verão, porém, em vez de um calor absurdo, o que nos recepcionou foi um céu cinza de nuvens espessas e chuva torrencial, assim que desembarcamos no aeroporto Presidente Juscelino Kubitschek. Apesar de a companhia aérea ter servido uma excelente refeição durante o voo, a primeira parada que Arthur e eu fizemos foi justamente para comer.
Bem, na verdade, essa foi a terceira parada. Antes, passamos no toalete e, então, fomos até a esteira de bagagem, arrastando nossas malas pesadas rumo à lanchonete que servia um dos melhores pães de queijo que nós já havíamos provado. Não que já tivéssemos tido a chance de provar muitos outros, claro.
A verdade era que nós adorávamos a vida nos Estados Unidos, mas o nosso sangue brasileiro fazia com que sentíssemos muita falta de casa. E o Brasil era isso. Brasília, em especial, era justamente isso: nossa casa, apesar de eu não ter crescido lá, já que meus pais foram tentar a sorte nos EUA quando eu tinha apenas sete anos de idade.
Ao nos sentarmos com nossos pães de queijo e cafés brasileiros, ambos quentinhos, sorrimos um para o outro e nos permitimos, antes de qualquer coisa, desfrutar do aroma que parecia nos aquecer por dentro também.
— Isso é tão bom, cara! — ele falou, abocanhando uma porção generosa de um pão de queijo, deliciando-se. Eu queria dizer que sentia o mesmo, porém, a boca estava muito ocupada, então só emiti um gemido de prazer. Bem longo, dando ênfase ao fato de que eu não poderia concordar mais.
Esperamos no aeroporto até que a chuva estiasse, permitindo-nos esquecer, por um momento, o motivo que nos levara até ali: a doença do pai de Arthur.
Eu me lembrava de Alberto, meu sogro, como um homem forte e robusto. Completamente contra aviões ou qualquer outro meio de transporte que não tocasse o chão, ele jamais fora visitar o filho depois que este foi embora do Brasil com a mãe, após o fatídico divórcio que resultou no desmembramento da família Ferreira. Arthur foi para os Estados Unidos aos quinze anos e, desde então, ele e o pai só se viam quando Arthur podia ir até o Brasil, a fim de visitá-lo. Era uma relação complexa, a dos dois, apesar de ser nítido que se amavam. Contudo, uma traição criava marcas que, aparentemente, nem o tempo era capaz de apagar, e, sem sombra de dúvidas, toda dor que Arthur e sua mãe, Carmem, passaram ainda estava muito vívida em suas memórias.
Ainda assim, quando sua madrasta telefonou no meio da noite, avisando que a condição de Alberto piorara muito, nos últimos tempos, Arthur não hesitou ao comprar as passagens que nos levaram até lá. Eu estava até o pescoço com os trabalhos da faculdade e andando na corda bamba para equilibrar estágio e vida acadêmica, mas sabia quando Arthur precisava de mim e jamais deixaria a pessoa que eu mais amava no mundo passar por uma situação tão delicada sozinha.
— Vai dar tudo certo, você vai ver só — murmurei, estendendo minha mão sobre a mesa, no intuito de pegar a sua. Senti-a morna, por ela ter estado tempo demais em torno da xícara com café, e Arthur entrelaçou nossos dedos, tentando esboçar um sorriso que não condizia com seu olhar perdido de agora há pouco.
— Não acho que alguma coisa vá dar certo, Lorena — ele devolveu, meneando a cabeça de um lado a outro, os olhos castanho-escuros marejados, me fitando. — Mas sei que vou enfrentar tudo da melhor forma possível, porque a tenho do meu lado. Eu não sei o que faria sem você.
Ele beijou os nós dos meus dedos, e eu fiz o mesmo, sentindo meu coração se apertar por vê-lo sofrer. Levei uma de minhas mãos até o seu rosto, sobre o local onde alguns pelos despontavam, apesar de ele ter feito a barba recentemente. Sabendo que ele apreciava um afago quando não se sentia bem, migrei o toque até os fios escuros e lisos de seus cabelos, deslizando minhas unhas sobre sua nuca e observando-o fechar os olhos.
— Sempre vou estar do seu lado, Arthur. Eu te amo mais que tudo, e isso nunca vai mudar, ouviu?
Ele acenou em concordância, usando a manga de seu suéter para enxugar a lágrima que ameaçava rolar por sua bochecha. Imitei seu gesto, secando a gota que pesava no outro olho e encarando-o por um momento, antes de decidir que já havíamos demorado demais ali e que Arthur deveria ir logo ao encontro do pai e aproveitar cada pequeno momento que os dois ainda tivessem juntos.
Chamei um uber através do aplicativo, e Arthur e eu caminhamos para fora dali, com seu braço esquerdo ao redor de minha cintura enquanto ele prendia meu corpo ao seu em um meio abraço. Fitando-o de soslaio, depositei um beijo em sua mandíbula, apenas para lembrá-lo de que estávamos juntos para todos os momentos e ele jamais precisaria enfrentar trauma algum sozinho.
— Eu já disse hoje que te amo? — questionou, segurando uma de minhas mãos quando o motorista do uber deixou o aeroporto para trás, rumo ao hotel onde meu namorado insistiu para que ficássemos hospedados.
Sorri em resposta, repousando minha cabeça em seu ombro.
— Pode dizer de novo, eu não me canso de ouvir.
— Te amo, Lorena — murmurou, depositando um beijo demorado sobre meus cabelos escuros e, então, pegando uma mecha entre os dedos, brincando com ela entre eles como sempre costumava fazer quando estava nervoso. — Me diz: o que seria de mim sem você?
— Não muita coisa, eu posso garantir — brinquei, arrancando-lhe um sorriso e recebendo um beijo, do tipo que me fazia sentir em casa não importando onde eu estivesse.
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Tudo de Mim - Livro único
RomanceCAPÍTULOS DEGUSTAÇÃO LIVRO COMPLETO NA AMAZON E DISPONÍVEL NO KINDLE UNLIMITED PELO LINK: encurtador.com.br/gnsKW Um coração destroçado pode reaprender a amar? Lorena tinha uma certeza, um sonho e uma vida com tudo que desejava. Ou quase tudo. Falta...