— Você só pode estar de brincadeira! — Kim berrou à minha frente, colocando sua colher com cereal de volta à tigela enquanto seus olhos arregalados me encaravam perplexos. — Aquele filho de uma...
— Kim, não, por favor — interpelei baixinho, prendendo minha caneca de café entre os dedos. — Carmem não merece. — Sorvi um gole da bebida, sentindo o gosto característico e buscando a sensação de paz que um café forte logo pela manhã me trazia. Sem sucesso.
— Sei que não — ela bufou em resposta —, provavelmente a pobre coitada está se perguntando onde errou. E eu digo onde ela errou: no momento que decidiu dar a Arthur a chance de sobreviver. Aquele homem é um desperdício de esperma, óvulo e oxigênio, é isso que ele é! Argh! Eu estou com tanta raiva!
Soltei uma risadinha, por mais que não fosse um gesto de felicidade. Em meio à minha vida conturbada, ao menos eu me sentia contente por ter Kim para colorir os meus dias, nem que fosse um pouquinho só. Desde que ela soube do meu término com Arthur, praticamente se instalou em minha casa, onde dividíamos a cama de casal após conversar por horas sobre assuntos aleatórios, ou simplesmente adormecíamos no sofá em todas as nossas horas vagas de trabalho, graças à sua ideia de iniciarmos logo a nossa maratona anual de Friends na Netflix, algo sagrado nos últimos dez anos. Então, dado todo nosso histórico de amizade, eu entendia o motivo de Kimberly estar revoltada com a descoberta de que Arthur e Piper eram a nova família do ano, e foi assim que, após seu choque inicial, no qual seu rosto pálido assumiu um tom escarlate, ela explodiu impropérios.
— Mas o que exatamente você foi fazer lá? — perguntou, inclinando-se sobre a mesa da cozinha, à qual estávamos sentadas. — Quer saber? Esqueça. — Fez um gesto de descaso com uma das mãos, sacudindo a cabeça como se o assunto tivesse perdido a importância de súbito. — Quero notícias sobre Maria. Como ela está?
Da mesma forma que acontecia com todos que falavam o nome de Maria, os olhos de Kim brilharam, e senti como se alguém tivesse dado um nó de marinheiro usando todas as minhas entranhas. Larguei o café de lado, apoiando as costas no espaldar da cadeira ao passo que encarava minha melhor amiga.
— Bem — foi o que escolhi dizer.
— Sua expressão facial não está exatamente combinando com o que sai da sua boca — Kim observou, erguendo sua sobrancelha loira em desafio.
Suspirei longamente. Em seguida, umedeci os lábios ressequidos com a ponta de minha língua, lançando meu olhar em direção ao meu colo, onde agora meus dedos pousavam retorcidos, como era de praxe acontecer sempre que algo me tirava da minha zona de conforto.
— Michelle sabe que Arthur e eu terminamos e não quer o destino de criança sem pai para Maria.
Se houvesse algum resquício de força em mim, eu teria dado de ombros na minha versão muda de "não é nada de mais". Entretanto, de nada adiantava gastar energia tentando enganar a pessoa que me conhecia tão bem quanto à palma de sua própria mão.
— O quê? Mas como assim? Ela já tomou a decisão final? — Os olhos verdes de Kim estavam arregalados em minha direção, e eu soube disso antes mesmo de erguer os meus para fitá-los. Suas mãos se encontravam espalmadas sobre o tampo da mesa, o queixo pendendo e os lábios formando um "O".
— Não — neguei, também num meneio de cabeça, agarrando-me às palavras de Michelle como um náufrago o faria com um bote salva-vidas. — Ela me prometeu que vai pensar. Mostrei a ela fotos do quartinho de Maria, para que ela tivesse ideia de quanto amor essa criança vai ter, sendo uma Rodrigues.
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Tudo de Mim - Livro único
RomanceCAPÍTULOS DEGUSTAÇÃO LIVRO COMPLETO NA AMAZON E DISPONÍVEL NO KINDLE UNLIMITED PELO LINK: encurtador.com.br/gnsKW Um coração destroçado pode reaprender a amar? Lorena tinha uma certeza, um sonho e uma vida com tudo que desejava. Ou quase tudo. Falta...