Mesmo tendo meus olhos cobertos por uma venda eu ainda podia perceber a luz se alternando em sombra cada vez que seu corpo débil passava pela porta, provavelmente planejando seu próximo passo contra mim.
Basta. Basta. Basta. Basta. Basta.
Meu coração dizia. Mas mais uma vez pude ouvir seus dedos agarrarem a porta e a luz pôde preencher todo o quarto. Me senti grata por não ser capaz de enxergar o seu rosto, pois não suportaria ver seus olhos estatelados de forma tão clara.
Chega... Chega... Chega...
Sua faca me dizia que aquele seria meu fim enquanto era amolada. E eu agradeci mentalmente por ela finalmente ter se cansado de sua brincadeira terrificante. Então meus pés começaram a se mover contra o chão, como se meu corpo finamente pudesse se movimentar como se estivesse voltando à vida para deixar todo seu peso para trás.
E se arrastavam... Arrastavam, arrastavam, arrastavam.
Pude ouvi-la fechar a porta e suas mãos trêmulas, que já não suportavam o peso da idade, tiraram a venda delicadamente de meus olhos. Eu me preparei para ver vagamente aquele quarto pela última vez e pude sentir que ela também estava partindo. Estava me levando com ela, mas dessa vez eu fugiria, pois não pertencíamos ao mesmo lugar.
Com a ponta de seus dedos ela tocou o lugar de onde vários gritos de socorro já haviam saído e cortou os barbantes que ali tinha costurado no dia em que arrancou de mim a liberdade, no dia em que eu descobri que o mal poderia vir de qualquer um e a qualquer momento. Eu poderia chorar se minhas lágrimas não tivessem se esgotado. Ela usou suas últimas energias para levantar os cantos de sua boca iluminados pelo feixe de luz vindo da porta e eu usei as minhas para finalmente dizer as palavras que estavam guardadas por tanto tempo.
— Adeus... Mamãe.
