-O que te apetece comer? – gritou da cozinha.
-Surpreende-me.
Estava na sala. No chão de madeira polido espojavam-se pilhas de folhas, algumas com um grande traço grosso a marcador vermelho, outras à espera de serem marcadas. Contas...
Conseguimos sobreviver mais um mês.
-Não é este mês que morremos?
-Não, estamos a aguentar-nos bastante bem, agora com o novo emprego, vamos viver melhor. – encostei-me à ombreira da porta, constatando a atrapalhação do loiro enquanto escorria o esparguete. Conheci o Henry há pouco mais de dois anos, numa festa da fraternidade, era mais calmo. Acho que deixar os estudos o tornou rebelde... abandonou a universidade após um ano no curso de psicologia, e muito honestamente, nunca cheguei a perceber porquê, nem me atrevo a perguntar-lhe, há coisas que é melhor permanecerem incógnitas.
-Em que pensas?
-Em nada, estou feliz.
-Podes ser feliz e pôr a mesa?
-Já que pedes com tanta delicadeza...
Começámos o almoço tranquilos, conversando, como todos os casais fazem. O temperamento do Henry é um pouco instável, pelo que são de aproveitar os raros dias em que se encontra tão calmo e doce.
Como se o Universo me tivesse escutado os pensamentos, o telemóvel tocou no meu bolso. Tirei o aparelho atendendo.
-Olá Mr. Tomlinson.
-Wind! Só queria avisar que te esqueceste do xaile no meu escritório.
-Ah! Tem razão, desculpe, segunda levo-o de volta.
Desliguei a chamada guardando o dispositivo no bolso.
Fixei a figura do loiro, vendo-o retribuir um olhar zangado.
-O que é que ele queria?
-Nada de mais – murmurei ponderando cada palavra – deixei lá o xaile, fez frio de noite.
-Hm. – concordou- É estranho uma empresa tão grande não ter aquecimento.
-Deve ter, mas não me atrevi a acordar o Louis e perguntar.- suguei um fio de esparguete e automaticamente engasguei-me quando dei conta das palavras que escolhi.
-O Louis estava a dormir? – imitou o meu tom com um sorriso macabro a rasgar a face.
-Henry tem calma, não é nada disso! Nós não- não pude acabar.
Um copo de vidro voou na minha direção, não tenho mínimas dúvidas de que acertaria no alvo se não me desviasse.
Henry era alto, ergueu-se da cadeira, dobrando a minha altura. Avançou a passos lentos até mim, forçando-me a antecipar o sofrimento que sei que se segue. Parou, quando a ponta do pés tocou a cadeira, e voltou a sorrir. Com cuidados redobrados prendeu uma mecha de cabelo meu atrás da orelha, curvando-se para mim. Estava gelado, como está sempre, traçou uma linha com a ponta dos dedos pelo meu pescoço. As expirações quentes sopravam contra a pele desprotegida e era impossível não sentir arrepios. Henry ensinou-me a temê-lo com cada fibra do meu corpo, tenho sem qualquer dúvida, motivos para isso.
As mãos ásperas atiraram-me ao chão e o meu corpo automaticamente amparou a queda, num movimento tão mecânico, fruto do hábito, que me questionei sobre como me deixei chegar a este ponto.
-Eu confiei em ti Wind! Confiei.
O seu rosto estava a milímetros do meu, podia sentir no bafo quente a raiva que causei. O sangue raiava-lhe os olhos, azuis como os meus, salientando veias que teimavam em saltar na zona da testa. Obrigou-me a levantar, puxando imprudente um braço tantas vezes maltratado. A coluna estalou quando empurrou a parede, numa colisão que me impediu de ver por segundos. Estava tudo negro.
A cabeça latejava, as pequenas lágrimas receosas tentavam escapar sem ser notadas, lavando o rosto daquelas mãos nojentas.
O silêncio é o mais assustador em momentos como este, quando não podemos ver, é impossível saber se já se foi embora, ou está simplesmente à minha frente esperando que abra os olhos.
Aos poucos fui recuperando a visão.
Henry estava sentado pouco distante de mim. Encostado à parede de cabeça pendida para trás. Controlava a própria respiração, engolindo furioso grandes lufadas de ar.
Olhos frios e cruéis, sorriu na minha direção. Dirigiu-se à cozinha arrancando do armário uma garrafa quase a meio de Bourbon. O líquido acastanhado escorria-lhe pelo pescoço descuidado, parecia um verdadeiro alcoólico, não estava aliás muito longe disso.
-Sentes-te feliz?! – limpou a boca com a manga da camisa.
Não tive coragem de lhe responder. Permaneci quieta e calada à espera que tudo passasse.
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Not about business
Teen Fiction-Foi tudo mentira. - concluí chocada. -Não Wind, espera! -Porque querias que trabalhasse para ti?! Sacrificaste a minha vida por isso?! - prometi a mim mesma não derramar uma lágrima quando o confrontasse... ao que parece menti. Dos olhos brotavam r...