Capítulo XII - Renovação

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Acordei com o relógio despertando, eram 14h e mais uma vez eu estava atrasado para outro dia de merda. Na noite anterior havia tomado vários antidepressivos na esperança de que não acordasse mais, mas fui interrompido da minha fantasia com o bipe chato e insistente do relógio. O sol entrava por entre as frestas do meu apartamento escuro e úmido, e eu ainda não tinha ideia do que fazer pra mudar aquela realidade de merda, mas de uma coisa eu tinha certeza... Jhon, Dave, todos esses embustes, eu queria mais é que eles se fodessem com suas vidas ridículas e sem sentido onde seus únicos objetivos eram fazer as pessoas se sentirem horríveis na esperança de que isso alterasse o fato de que eram todos um aterro de lixo a céu aberto. Tudo o que conseguia sentir era frustração... Frustração por mais um dia tedioso no qual eu me obrigava a continuar sobrevivendo. No dia anterior eu havia chegado à conclusão de que tudo deveria mudar, começando por mim mesmo.

Olhei no relógio, e percebi como a hora havia voado, eram quase 19h, desci correndo as escadas do prédio do meu apartamento, que mais parecia aqueles aglomerados de lugares alugados para imigrantes onde todos chafurdavam sobre a sua própria imundície, e desviando das ratazanas que costumeiramente reviravam o lixo, caminhei em direção ao ponto de ônibus. O dia seco e ensolarado fazia com que o cheiro de lixo e urina humana tomassem conta do ambiente, não dava mais pra aguentar. Durantes os últimos meses eu havia escolhido esse lugar "maravilhoso" com o intuito de me isolar e poder ficar no meu canto escuro sem ser perturbado por ninguém, mas até então, nada daquilo funcionara, exceto a parte de ficar sozinho, mas aparentemente aquela não havia sido uma boa ideia.

O ônibus chegou, passei a catraca como de costume, e sentei no meu lugar de sempre, no fundo aonde ninguém podia me ver, e fiquei olhando a paisagem de sempre pela janela completamente perdido entre meus pensamentos. Por um instante desviei meu olhar e percebi um garoto estranho sentado próximo à catraca, por um breve momento ele olhou pra trás e rapidamente voltei a olhar pela janela. "- Droga!" Pensei. Eu já me sentara naquele lugar para evitar contato visual com as pessoas, e de repente atraí o olhar de um desconhecido? Fosse por interesse ou repulsa, ele havia olhado pra mim, mas resolvi deixar assim mesmo.

Desci do ônibus e o aguardei seguir viagem para que pudesse atravessar a faixa de pedestres, caminhei em direção ao campus, observei uma movimentação lá na frente e pensei: "- E quando eu penso que não pode ficar pior..." Jhon veio com os dois braços abertos e com um sorrisão aberto de orelha a orelha como quem queria me abraçar. Parei em seco e o estendi a mão: "- Ui, ele tá irritadinho." Disse Jhon em tom de sarcasmo. "- Você adoraria que todos soubessem o motivo de eu estar irritado com você não é Jhon?" Ele arregalou o olhos e me encarou. "- Como vai Dan?" Disse abrindo os abraços para lhe abraçar, ele aproximou-se receoso. "- O que diabos tá pegando?" Perguntou ele cochichando no meu ouvido enquanto me abraçava. "- Quando eu estiver suficientemente bêbado eu te conto." Respondi com uma risadinha de canto. "- Are you ready for the rock 'n roll bitches?" Na hora me veio à mente... Era sexta-feira, o dia do tal show que me convidaram e eu infelizmente confirmei que iria. "- Yeeaaah..." Respondi em tom de ironia com a maior cara de cu que poderia fazer. "- Hoje vai ser muito foda!" Disse Dan empolgado. "- Você curte System Of a Down não curte Ollie?" Ollie? Ninguém nunca me chamara assim, e de repente esse garoto que eu conhecia há pouco tempo já me vem com apelidinhos? Bom, eu o chamava de Dan ao invés de Daniel, então resolvi entrar na onda. Fiz o gesto oficial do rock com as mãos e disse: "- Quem em sã consciência não curte o bom e velho SOAD?" Dan riu. "- Que bom por que hoje vamos no show deles." "- Cala a boca que vamos no show do System!" Exclamei surpreso. "- O que acha que eu sou? Milionário?" Disse Dan rindo. "- É uma banda cover, mas pelo que li no evento do Face, outras pessoas já foram e falaram que são os melhores." "- Ah sim..." Respondi desapontado. Bom de qualquer forma era uma banda cover de System, eu nem sabia que banda era até então, então me senti aliviado por não ser nenhuma banda de garagem como a gente vê em filmes. "- Que horas nós vamos?" Perguntei encabulado. "- É daqui a pouco, estamos esperando a Lindsey, mas pelo visto ela não vai aparecer." "- Daqui a pouco?" Perguntei esbaforido. "- Se soubesse teria vindo pronto!" "- Que nada! Você está lindo!" Disse Dan com cara de quem queria dizer mais alguma coisa, ou talvez fosse só o meu sol em Leão gritando, fazendo com que eu acreditasse que todos me desejassem, mas que era algo que era verdade na minha cabeça. "- Tá bom..." Respondi sarcasticamente. "- Nossa carona deve estar chegando por aí!" Exclamou Dan. "- Carona?" Perguntei. "- Pensei que fôssemos chamar um Uber ou ir de ônibus..." "- Não, não, tô conhecendo um cara, ele quem me descolou os ingressos e pediu para que eu chamasse quem eu quisesse." "- Ah sim" E mais uma vez eu tive certeza de que o olhar de Dan era só o jeito dele mesmo e que meu sol em leão me enganara mais uma vez. "- A que horas ele combinou que nos buscaria?" Perguntei. "- Por volta das 21h." "- Mas ainda são 20:15." "- Vamos comprar alguma coisa pra beber por enquanto então!" Disse Dan. Concordei. Saímos da entrada do campus e fomos em direção a mercado municipal que ficava próximo à praça, entramos no mercadinho, e fomos para o corredor de bebidas. "- O que você bebe?" Me perguntou Dan, Jhon estava receoso e até aquele momento não havia feito nada senão ficar mexendo no celular, como se estivesse fugindo de alguma coisa. "- Ah, eu bebo qualquer coisa que contenha álcool, e você Jhon?" Jhon deixou o celular cair no chão, abaixou-se e o pegou em uma fração de segundo. "- Eu? O que tem eu? Eu tô de boa!" "- Não vai beber?" Perguntei. "- Ah... sim... a bebida, ah não mano, o Daniel sempre escolhe as bebidas, ele é bartender, então ele deve saber o que é melhor." "- Ser autêntico e ter bom gosto é um saco!" Respondeu Dan jogando o cabelo com a cabeça pro lado. "- Vou pegar uma Smirnoff Vodka, e o refrigerante vocês escolhem." "- Vou de Sprite!" Disse Jhon. "- Pelo amor de todos os santos!" Reclamei. "- Tudo! Menos Sprite!" "- O que você sugere então? "- Ah... sei lá... Qualquer coisa, menos Sprite, Sprite pra mim, já deu o que tinha que dar." "- Entendi..." Respondeu Jhon pensativo. "- Então vou levar uma Coca-Cola mesmo." Não podia ficar pior, mais do que Sprite, Coca com vodka me causava repulsas, mas como não estava em posição de fazer exigências, já que eu estava duro e eles quem iriam bancar todo o rolê, fiquei na minha. 

Nos dirigimos aos caixas, Dan entregou o cartão para a balconista, uma garota que aparentava ter entre 18 e 21 anos, tinha bochechas rosadas, e o cabelo preto incrivelmente liso. Ela pegou o cartão: "- Crédito ou débito?" Perguntou ela com um sorriso amigável. "- O que você acha?" Perguntou Dan com a cara mais gay do mundo." "- Na falta de vergonha na cara!" Respondi. "- Na do Dan de preferência, por que aparentemente, não tem limites." Ela riu. "- Crédito." Respondeu Dan me mostrando a língua e fazendo careta. Dei uma risadinha debochada, pegamos as bebidas e saímos do mercado e começamos a caminhar em direção ao campus. Entramos em um papo descontraído conversando sobre relacionamentos, quando de repente, Dan começa a saltitar, bateu duas palminhas e dizendo: "- Vamos, vamos, o Dave chegou!" Fiquei paralisado. "- Dave?"

Animal Noturno: SubterfúgioOnde histórias criam vida. Descubra agora