10 - O Preço de Uma Consciência

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Alícia se recuperou parcialmente do golpe e viu, meio zonza, que Ismael tinha sacado uma faca e vinha correndo em sua direção. O homem desferiu uma série de golpes que ela só pôde evitar. O último, ela se esquivou e segurou o pulso de Ismael, desferindo um soco em seguida. Ele mal vacilou. A vitalidade do homem era impressionante para alguém que, se os registros estivessem certos, já estava na casa dos cinquenta. A sequência seguinte foi mais intensa, e ele lhe abriu um corte no braço.

        Quando Ismael investiu de novo, ela correu também e deslizou por baixo dele, parando às suas costas para, em seguida, jogar todo o seu peso contra o homem. Ismael caiu e soltou a faca. Alícia saltou em cima dele, desferindo soco atrás de soco, até que ele lhe agarrou pelo pescoço e apertou. A força foi lhe faltando conforme ele a erguia. Num movimento desesperado, Alícia ergueu o joelho atingindo o bandido no queixo. Ele a soltou e recuou.

         Ofegante, Alícia estava prestes a se lançar num ataque suicida, quando algo reluziu à luz da lua. Um de seus dardos, ainda com sangue de um dos bandidos feridos que deve tê-lo arrancado e o atirado antes de bater em retirada, ali esquecido entre ela e seu inimigo.

        Ela relanceou para Ismael que já se recompunha e recuperava a faca do chão, e antes que ele agisse saltou sobre o dardo e o cravou fundo no joelho do seu inimigo. Ismael urrou de dor e soltou a faca outra vez. A caçadora a apanhou ainda no ar e a fincou no outro joelho. O homem emendou um segundo urro, ainda mais bestial.

         Alícia se levantou com dificuldade, e caminhou trôpega até sua balestra. Voltou-se a Ismael, o encarando com puro desprezo. O homem sorria diante da seta apontada para sua cabeça.

         – E agora, você terá sua vingança. Parabéns, garota.

         – Como eu esperei por isso. – Ela dizia, com a face imutável. – Mas você não morre hoje, Ismael Benatti.

         Ele deu uma risada, e depois gargalhou. Alícia nem se moveu.

         – O quê? Que bancar a superior agora? – Ele gesticulou para o cenário. – Olhe à sua volta. Quantos você feriu e matou hoje? Poupar a minha vida não apaga os seus pecados, não apaga o sangue que você derramou.

         – Seus homens cometeram um erro ao seguir você. – Ela disse sem relaxar a postura. – Muitos não precisavam morrer e pode ter certeza de que eu vou atrás dos sobreviventes para lhe fazer companhia. Não tenho intenção de ser uma heroína, tampouco uma santa, mas eu não vou lhe dar uma fuga tão prática como a morte, e não vou deixar que outros chefões do crime pensem que podem simplesmente tomar o seu lugar. Eu vou atrás de cada um, não importa o quanto mais eu me suje.

         A expressão de Ismael se transformou novamente na carranca de ódio e, ainda de joelhos, ele deu um bote. Alícia simplesmente chutou o dardo cravado no joelho do homem que despencou sobre as mãos urrando. Ele se ajustou de novo, bufando.

        – Sua pirralha! Eu acabei com sua família! Eu vou matar a sua irmã se me der a chance! Eu mereço, e você sabe disso. Você quer isso!

        – Quero. Mas não foi isso que meu pai me ensinou. – Ela virou a balestra e o atingiu com a coronha. – E a sua recompensa é grande demais pra ignorar.

         Lady Lua Cheia guardou a balestra, sentindo que estava prestes a desmaiar. Mas algo a manteve de pé. Começou a andar e viu duas silhuetas se aproximando. A vista estava começando a falhar, mas ela as reconheceu de imediato.

         – Alícia. – Era Lucca quem falava. – Peguei ela.

         Alícia saltou em cima da irmã e a abraçou com força. Uma força que ela não imaginava que ainda restava.

         – Eu estava com tanto medo de te perder. – A voz dela falhava.

         – Talvez agora, você passe a me visitar com mais frequência. – Elisa até esboçou um sorriso.

Lucca não queria interromper, mas Alícia reparou que ele olhava para Ismael prostrado inconsciente.

         – Lucca, seja um bom menino e amarre ele, por favor.

         – No final, você o poupou. – Ele deu um de seus sorrisos infantis.

         – Depois de todo o trabalho? Ele vale mais vivo. – Ela brincou antes de apagar.

Os Olhos da CorujaOnde histórias criam vida. Descubra agora