Avião

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Alex

Nunca na vida gostei de ser encarada por muitas pessoas, ou ser o centro das atenções. Quando isso acontecia com um Seis, Sete ou Oito, nunca era um bom sinal.

Já perdi a conta de quantos casos de Setes que foram vítimas de estupro, assédio, torturas e mortes agonizantes apenas por nascerem em uma das castas mais pobres.

E mesmo sendo a Sete mais sortuda de toda Belcourt, isso não me tornou imune aos abusos.

Uma vez aos doze anos, uma família de Três queria que eu renovasse os buquês dos vasos da casa. Era um serviço simples então não pensei que me traria tantos problemas.

Eu estava no escritório do dono da casa, acabando de trocar um ramalhete de lírios murchos por uma dúzia de rosas brancas quando ouço a porta ser trancada.

O homem de cabelos platinados, rosto frio e olhos castanhos tinha uma expressão sádica. Ele tinha uns trintas e cinco anos, usava um terno chique que deveria custar todos os móveis da minha casa na época.

"Senhor, algum problema?" Perguntei com o nervorsismo entalado na garganta. Segurei o ramalhete murcho contra o peito.

"Nenhum, minha cara." Ele sorriu friamente. "Eu só queria lhe oferecer um último serviço." Ele tirou um grosso bolo de dinheiro do bolso.

"E o quê seria?" Perguntei desconfiada.

Ele se aproximou tão rápido que mal pude reagir. Em questão de segundos eu estava deitada na mesa dele. Ele segurava meus pulsos acima de minha cabeça e lambia meu pescoço.

Nunca senti tanto medo na vida. Por sorte, ou por um milagre, a esposa dele conseguiu entrar no quarto e testemunhou a cena.

O homem foi preso, obviamente por pedofilia, adultério e tentativa de estupro. Mas isso graças à esposa que me conhecia bem o bastante para saber que eu nunca na vida aceitaria um serviço sujo como aquele.

Desde aquele dia eu quase não sinto pânico por nada. Quer dizer, não até agora.

Eu estava em cima de um palco, na praça central da cidade. Todos me encaravam com diversos olhares. Os Seis e Sete com admiração. Os Cinco e Quatro ora com inveja, ora com felicidade. E os Dois e Três, bem... os adultos que eram meus clientes (quase todos da cidade) batiam palmas e sorriam para mim, mas as jovens... Elas pareciam as encarnações da inveja, do ódio e da raiva.

Fiquei travada como uma estátua, apenas sorrindo forçadamente e acenando aleatoriamente enquanto Jasmine fazia todo o resto.

Só pude relaxar quando entrei na limusine.

"DEUS DO CÉU!" Gritei com a voz rouca. "Pensei que iam jogar um prédio em cima de mim."

"Relaxa. Com a Dolores te proteguendo, ninguém no mundo tem coragem de te machucar."

"Diga isso para as patricinhas lá na praça." Falei enquanto minha amiga retocava o rímel que destacava seus olhos.

Nós duas usávamos o mesmo estilo de roupa: calça de tecido negra, camisa social negra e a flor de nossa província, uma rosa azul, nos cabelos.

A única coisa que tínhamos em diferente eram os sapatos e na maquiagem. Enquanto eu só usava um batom rosa claro e um par de tênis vermelhos velhos do meu irmão, Jasmine usava uma maquiagem forte destacando os olhos verdes e um par de saltos altos de agulha negros que pareciam instrumentos de tortura.

"Você é uma Três agora, quer elas gostem ou não. E não se preocupe quanto às outras concorrentes. Elas vão te adorar!" Ela sorriu para mim.

"Diz isso a garota que é minha parente distante. Jazz, elas não me conhecem e só enxergam meu número de nascença. Será um milagre que eu não seja expulsa no primeiro dia."

Ela me abraçou. Seu perfume de jasmim era um alívio para mim.

"Nunca diga isso. Você é muito mais do que um número. Você é linda, determinada, e acima de tudo, é a minha melhor amiga."

Quase chorei com as palavras dela. Retribuo o abraço e ficamos juntas até chegarmos no aeroporto.

A Seleção da Sete [Concluída]Onde histórias criam vida. Descubra agora