Alexandra só percebeu que havia adormecido quando acordou com um ruído. Um grito, que, em um primeiro momento, pensou vir dela mesma. Só depois, ao perceber o que era, reconheceu-o.
Era o de sempre, aquilo que dolorosamente se repetia e, durante o sono, saltava da mente de Sofia.
Ela se debateu, tentando em vão manter o sonho que fugia. Sentiu que caía. Tentou se agarrar a... A quê? Não conseguiu distinguir...
Ouviu alguém gritar e percebeu que era ela mesma quem o fazia.
Lembrou-se de onde estava, por isso tentou controlar a respiração alterada, sem muito êxito. A escuridão total fazendo com que a angústia aumentasse. Trazendo de volta a perda, a dor, o temor... Segurou a palavra que se formou, o nome de Alícia. Mas não segurou o choro que escapou, emitindo sons abafados e furtivos.
Deitada ao lado de Talita, a audição de Alexandra a permitiu acompanhar tudo que aconteceu no catre vizinho. O grito desesperado, a respiração descompassada, depois sufocada e, finalmente, o soluço baixinho. Repetiu mentalmente para si mesma: "Não é da minha conta. Não tenho nada com isso".
Como se, de alguma forma, quisesse colaborar, o sino da Casa do Senhor soou três vezes, abafando qualquer outro tipo de som ou ruído.
Ainda assim, a vontade de fazer algo persistiu. Mas Álex não moveu um músculo. Resistiu. Fechou os olhos, tapou os ouvidos com força. Fingiu estar dormindo.
– Alícia, acorda! Já badalou sete horas e você ainda está dormindo!
Sofia se esforçou para compreender a imagem que viu assim que abriu os olhos nem um pouco acostumados a funcionarem tão terrivelmente cedo: segurando um lampião em uma das mãos e sacudindo Sofia com a outra, uma nova Talita. Com o rosto reluzente de tão limpo e os cabelos cuidadosamente penteados para trás, sem que um fio escapasse.
Sentou-se no catre, e a menina completou:
– Temos que estar na Casa do Senhor às oito. Hoje é domingo!
Tia Laila entrou no quarto bem a tempo de ver a expressão incrédula de Sofia:
– Não ia à Casa do Senhor lá em cima, Alícia?
Receando levantar suspeitas desnecessárias, Sofia prontamente respondeu:
– Claro que sim.
A senhora suspirou, visivelmente aliviada:
– Graças ao Senhor! Já não basta...
Não terminou, como se só então percebesse que não falava sozinha. Ficou alguns instantes parada, tentando disfarçar, antes de completar:
– Rápido. Não podemos nos atrasar.
E saiu quase correndo do quarto.
Sofia subiu distraidamente na parte de trás da carroça. Sentou-se no chão, ao lado de Talita, com as costas encostadas na lateral, de frente para Nívia e Gustavo. Continuou olhando em volta. Buscando a presença que fazia falta, mesmo sem querer. Da forma antagônica de sempre, Nívia falou:
– Se está procurando Álex, desista. Ela não vem.
Como quem repete algo que ouve sempre, Talita declarou, de forma absolutamente inocente:
– Tia Álex não gosta da Casa do Senhor.
Antes que Sofia pudesse se perguntar como ou por qual motivo, Tia Laila se virou da boleia – onde até então permanecia calada ao lado de Tio Dimas, que conduzia – e repreendeu a menina:
– Isso é coisa que se diga, Talita?
A criança abaixou a cabeça, e um clima sombrio se estabeleceu, levando Sofia a compreender que engolir todo e qualquer tipo de pergunta era o melhor a se fazer.
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O suave tom do abismo - Absorção - Livro Um
Ficción GeneralNa trilogia "O suave tom do abismo", Diedra Roiz nos conduz através do frio e da escuridão de um futuro distópico. Um mundo em que a ausência de luz é cotidiana e o sol não é nada além de descrições em livros proibidos, onde enxergar além do que a p...