Quando se está apaixonado, você pode ser machucado de um jeito singular.
Tinha como não abrir para dar uma conferida? Mas é claro que não. Não consigo pensar em uma só mulher na face da terra que teria fechado sem conferir. Abri o e-mail e cliquei no link que me levou direto a uma página do Badoo. Havia dezenas de fotos de mulheres nas mais diversas poses, cada janelinha era uma possiblidade de diálogo. Abri algumas fazendo uma leitura dinâmica. Algumas palavras pareciam saltar aos meus olhos, como letreiros luminosos. Anjo. Linda. Algumas frases provocavam um efeito devastador. Era uma dor física. Como se cada uma daquelas frases fosse um soco no meu estômago. "Já disseram que você é uma gata?" "Nossa, você deve ser muito paquerada!" "Não me envolvo com mulheres casadas..." Senti minhas mãos suarem e um misto de sentimentos me inundarem. Uma sensação que não consegui definir como frio ou calor tomou conta do meu corpo, começando pela barriga e subindo até a garganta. Meu rosto queimava e meus músculos tencionaram. Uma vozinha mansa me dizia "Feche isso...", enquanto outra gritava "Lê direito essa porra!!". Dei ouvidos a segunda. E abri a janelinha de uma moça chamada Anne de 30 anos. Era branquinha de cabelos longos e escuros. A conversa, aparentemente normal (não que seja normal um homem casado conversando com uma desconhecida em um site de relacionamentos), sobre música. Ela falava sobre as bandas que gostava, muitas em comum com Fábio. Ele elogiou o bom gosto da moça e soltou um "Uau! Moras onde 'namorada'?"
– Oi???? Namorada??? Como assim, namorada?
Tive vontade de mandar aquela piranha para o inferno, na melhor da hipóteses! Mas pensei que ela não me deve respeito. Nenhuma delas me deve! Elas nem me conhecem. Talvez nem saibam da minha existência. Elas pode sim, ser umas piranhas. Todas elas! Elas até têm o direito de sê-lo. Não as conheço e a recíproca é verdadeira. Quem me prometeu em frente a um padre fidelidade, foi ele! ELE tinha uma responsabilidade comigo. Fábio me devia algo. Porque o nosso acordo era outro.
– Filho da puta! – Falei em voz alta, fechando o notebook com força.
Apertei as mãos em cima da máquina e suspirei, sentindo meus olhos encherem de lágrimas. Ouvi o barulho do carro dele, parando na rua em frente a nossa casa. Ele havia chegado. Joguei o notebook ao meu lado, em cima do sofá, peguei minha bolsa e saí pela porta da cozinha, sem fazer barulho. Ainda ouvi sua voz sorridente, já do lado de dentro da casa, anunciando sua chegada tal qual o Dino, personagem da Família Dinossauros, "Querida! Cheguei!".
Desci rápida e silenciosamente os dois degraus que separavam a porta dos fundos, do quintal da nossa casa e andei pelas sombras até a porta da frente, por onde saí sem ser notada. Andei duas ruas, olhando para trás com medo de que ele me visse. Não queria ter que falar com ele naquele momento. Não queria sequer olhá-lo.
Cheguei afobada no calçadão da praia de Boa Viagem e só então pude respirar. Era como se todo o ar quisesse entrar do meu corpo de uma só vez pelas minhas narinas. Meu coração batia com tanta força que pensei que fosse sufocar. Pelo meu rosto escorria um filete de suor, minha cabeça estava molhada. Senti no corpo um frio, assim que percebi a brisa vinda do mar. O calçadão estava cheio de gente àquela hora. Pessoas correndo, gente passeando com seus cachorros, homens jogando futebol na beira da praia e eu. Andando sem rumo, com os olhos marejados e com uma sensação de que tinha perdido o chão e caía em um abismo sem fim. Respirei fundo, como se pudesse aspirar todo o vento frio que vinha em minha direção e continuei caminhando. Era janeiro, mês de férias escolares. A quantidade de turistas e crianças que brincavam na praia era maior do que as dos carros que passavam apressados, cortando o vento, que se movia frio em direção aos enormes edifícios da orla.

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Clarissa
RomanceIzabela é secretária em uma grande editora de Pernambuco e acredita ter uma vida certinha com seu emprego perfeito e casamento de conto de fadas. Até que é surpreendida por uma descoberta que vai lhe tirar o chão e colocá-la em meio a um furacão de...