My brother's shadow

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Pata de Sombra voltava de mais uma seção de treinamento com seu mentor, Asa de Sabiá. Sua pelagem, antes negra com partes brancas, adquiriu uma coloração suja, de marrom misturado com vermelho, devido à terra e ao sangue que impregnava seu pelo. A gata mancava de uma pata, e um corte na testa produzia um caminho vermelho por entre os olhos.

 — Mais uma seção deprimente, Pata de Sombra... Para variar. — repreendeu, sarcástico, o felino amarronzado, sem nem olhar para a sua aprendiz. — Seu teste é em uma lua e você nem sequer consegue desferir um golpe básico! — completou, voltando sua atenção à Pata de Sombra, que abaixou o olhar, envergonhada. O guerreiro suspirou e, depois de algumas batidas de coração, continuou, em um tom mais calmo: — Amanhã vou pedir para Serpente Cinzenta treinar conosco. Pata de Luz apresentou um progresso notável e- 

  —  Não, o Pata de Luz não, por favor! Qualquer um menos ele! —  interrompeu Pata de Sombra. Ela detestava quando seu irmão exibia suas habilidades perto dela. Ele claramente aprendia muito mais rápido do que qualquer gato no clã, e, como resultado, a pressão de se igualar ao seu irmão interferia diretamente nas habilidades de Pata de Sombra, deixando-a patética na frente dos outros. Asa de Sabiá lançou-lhe um olhar silenciador.

  —  Ora, pare de invejá-lo! Só não consegue se concentrar pois perde tempo demais se preocupando com as conquistas dele, e esquece de olhar para as suas. Pata de Luz pode até lhe ensinar algumas dicas de combate... — disse o mentor. Pata de Sombra sabia que ele estava errado, mas não queria discutir. Ela não invejava o progresso de seu irmão, mas sim detestava a pressão que todos colocavam em suas costas pela ligação familiar. Asa de Sabiá, assim como todo o resto do clã, admirava Pata de Luz. Todos os mentores o chamavam para treinar junto com seus respectivos aprendizes, na tentativa de inspirá-los a serem tão exemplares como Pata de Luz era. Pata de Sombra não duvidava que, mesmo tendo menos de doze luas, seu irmão viraria um guerreiro em breve, recebendo um aprendiz na primeira oportunidade que tiver. 

Ela observou, com um certo rancor, seu mentor se despedir e rumar para a toca do líder. "Reclamar sobre as minhas falhas, eu suponho" pensou, amarga, enquanto virava para entrar na toca do curandeiro. — Lhe atendo em um instante! — soou uma voz acolhedora de dentro da toca. A aprendiz escura acomodou-se em um dos ninhos do local e se preparou para limpar seu pelo quando uma figura marrom-claro foi ao seu encontro. — Pata de Sombra... Cada vez que vem aqui você tem ferimentos piores. Está querendo se aposentar antes mesmo de virar guerreira? — disse, preocupado, Focinho de Castanha, o aprendiz de curandeiro do clã, enquanto analisava os ferimentos mais profundos.

—  Acho que quebrei o meu recorde... De novo. — brincou Pata de Sombra, acompanhando a análise do felino.— Onde está Canção Lunar?— perguntou, procurando pela curandeira.

 — Foi pegar mais gatária... Não que estamos em falta, mas é melhor repôr antes que nosso estoque atinja um estado crítico. Felizmente, eu consigo tratar seus ferimentos sozinho. só vou precisar que limpe os machucados enquanto eu pego os materiais.— explicou o felino peludo, apontando para as áreas a serem priorizadas. 

Depois que todos os ferimentos foram tratados, Focinho de Castanha ofereceu um camundongo à amiga e também um pouco de água, sentando-se ao seu lado enquanto ela se alimentava.— Asa de Sabiá te machucou feio dessa vez, hein?— comentou ele, em voz baixa.

 — Não, não... Dessa vez eu cai da árvore. Nada muito sério, já que eu não estava muito longe do chão, mas o corte na testa foi dele mesmo. 

 — Pata de Sombra, eu sei que você não gosta de falar muito sobre isso, mas... Você precisa achar um jeito de se adaptar. Não dá para ser aprendiz para sempre!

 — Ugh... Porque todo mundo me diz isso? "Se esforce", "se concentre", "treine duro"... Eu estou fazendo o máximo que eu posso, tá? Parece que nunca é o suficiente... Parece tão fácil para Pata de Luz, porque não é para mim? Eu só queria ser normal como ele...— disse ela, abaixando o olhar.— É tão irônico... Somos opostos em tudo. Eu sou ruim e ele é bom, eu sou vergonhosa e ele é exemplar, eu sou Sombra e ele é Luz...— comentou, falando o último exemplo baixinho. Focinho de Castanha não sabia o que dizer. Detestava ver Pata de Sombra tão depreciada daquele jeito. Lembrou-se de uma ideia que tivera a alguns sóis atrás, mas voltou a empurrá-la de volta para o fundo de sua mente. Como ele poderia saber se sua amiga estaria feliz estando tão longe dela?

— Descanse... Amanhã é um novo dia — disse o aprendiz de curandeiro, lambendo a orelha da amiga.

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