01. Don't call me angel

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Kaya Rose Humphrey, Los Angeles, Califórnia, 01:34 pm

Nunca chovia em LA. NUNCA. E, justo no único dia que Klariza faltara - minha carona diária -, o único dia que eu voltaria a pé, chove. E muito. Meus dentes batiam contra os outros e já havia desistido de tentar proteger alguma parte de meu corpo. Eu estava completamente encharcada e corria pela calçada enquanto procurava pelas chaves de minha casa, qual era grande demais para duas pessoas - agora três - e um cachorro. Tive que parar de correr quando cheguei ao portão imenso, e a chave preta se destacava em meu chaveiro, destrancando o pesado portão e o abrindo com dificuldade. Morávamos em uma área famosa em LA, com paparazzis em todos os lugares, mas eu era discreta o suficiente para não ser interessante, mesmo sendo filha de alguém famoso. Tranquei o portão ofegante e abaixei a cabeça, andando com passos rápidos até a porta dupla de entrada, desatando o nó da gravata de meu uniforme.

Estudava em um colégio rígido no qual era necessário o uso de uniforme. E eu estava um ano atrasada dos demais pelo simples fato de que eu odiava aquele lugar. E o tratamento que tinha em casa não melhorava meu desempenho em um local que visava apenas o dinheiro e status. Uma aluna com notas não tão favoráveis vindo de uma família famosa era uma vergonha. E eu não poderia me importar menos

A primeira coisa que fiz quando entrei em casa foi jogar minha bolsa no chão e me livrar da camisa social branca ensopada, ficando apenas de sutiã e saia. A casa estava silenciosa e se ouvia meus dentes batendo de longe. Estava pingando e, obviamente, molhava todo o tapete da entrada. A saia foi a próxima peça a escorregar fora de meu corpo, acabando por ficar apenas de lingerie. Depois, os mocassins e minhas meias. Meu corpo estava gelado e a água escorria de meus cabelos castanhos por minhas costas, me causando arrepios. Torcia para que meus cadernos não estivessem ensopados. Merda de chuva.

Em minha cabeça, pensava em duas coisas: levar as roupas até a lavanderia ou deixá-las ali e ir direto ao meu quarto. Precisava de um banho, isso era nítido, mas aquelas peças molhando o tapete importado que minha mãe comprara não era nada bom. Não era algo que deveria ser mais importante que minha saúde, mas sabia que se danificasse os pelos macios de algum animal - pobre animal - desconhecido por mim, estava morta. Tremendo de frio, recolhi as peças de meu uniforme do chão. O lugar mais rápido para colocar aquelas peças era o cesto de roupa suja, que ficava no banheiro de meu quarto. Me encolhendo completamente e de cabeça baixa, subi os degraus da grande escadaria branca que nos levava até o segundo andar.

O lugar em que morava era esplêndido. As paredes em tom creme era enormes e o piso branco, aquecido. Havia tantos quartos que nunca precisaríamos, tantos cômodos ainda vazios com uma decoração simples apenas para dizer que tinha alguma coisa. A sala de jogos nunca fora usada, muito menos o cinema. A estufa então? April não tinha coragem de plantar uma flor sequer, imagine cuidar de uma estufa inteira. A biblioteca era lotada de livros empoeirados que só eram tocados quando o filho de Martina, a empregada, a acompanhava no trabalho quando não tinha local para ficar.

Subia os degraus lentamente, pensando onde estaria Arnie que não fora me receber assim que cruzei a porta. Meu corpo trombou em outro, fazendo-me recuar alguns passos, meu corpo se desequilibrando para trás, o frio na barriga me dominando ao perceber que iria cair. Um braço rodeou minha cintura nua e gelada, puxando meu corpo para perto o suficiente ao ponto de tocar seu abdômen. A diferença de calor era nítida e tive que conter a total vontade de me encolher e aconchegar com algo tão prazeroso como a quentura, sentindo seu peitoral em meus seios molhados. Ugh... o cheiro era tão maravilhoso que ainda não havia aberto meus olhos. Foi só então que meu cérebro raciocinou o acontecimento e paralisei.

Não era minha mãe nem seu marido, eles estavam em lua-de-mel. Não era a empregada porque ela não estaria sem seu uniforme e ela obviamente possuía seios. Suas mãos, duras e grossas, subiram até meus braços, os esfregando numa tentativa de me aquecer, ou me trazer de volta ao mundo. Meus olhos fechados mostravam o quanto eu estava gostando daquilo, sendo ou não um gesto carinhoso. Estava tão... aquecida que mal notara que a pessoa estava falando alguma coisa.

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