Páscoa no cérebro

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– Feliz páscoa, aí como eu amo, o tio deixou um milhão de chocolates na cama, que fofo, eu vou comer tudo!
Bom, acordar de ressaca é ruim, mas acordar de ressaca, ouvindo os berros de Miguel em minha cabeça é algo inquantificável.

– Bom dia, Miguel. Feliz páscoa. Coma todos os chocolates possíveis, eu geralmente deixo de lado até estragar, ou dôo. Feche o blackout. Boa noite! – Bom, achei que depois desse discurso educado, ele me deixaria em paz, sonhar é grátis, mas a realidade custa caro, e como boa cobradora, me trouxe a resposta de Miguel, cinco oitavas mais alta:

– É páscoa, você tem que comer, por favor, deixa de ser uma vagabunda chata, vem, um só!

–Miguel, caramba, eu tô com muito sono, e minha cabeça ta explodindo, to pedindo real guri, me deixa dormir, depois a gente vê as questões de comida.

– Você é um nojento, grosso chato. Fica aí sozinho. — Depois de suas árduas palavras, ouço o blackout ser fechado, o que faz minha visão agradecer, a porta ser fechada cuidadosamente, e os passos barulhentos de Miguel se afastando. E, finalmente, posso voltar pro único lugar onde minha felicidade permanece intacta e plena, os sonhos.

—X—
Desço as escadas ainda com cuidado, minha mente gira, e parece estar prestes a entrar em erupção, espero a explosão, mas nada acontece, então sigo cuidadosamente.

A sala está escura, um deus grego seminu está deitado em meu sofá, apenas de short, com os cabelos desgrenhados, as longas pernas abertas, como um convite, sobre o braço do sofá, com um gigantesco pedaço de chocolate indo até sua boca, que o agarra com malícia e desejo, suas orbes dão um 360, enquanto ele solta um leve gemido. O prazer que o chocolate causa à Miguel, passa por meu corpo, e para no centro dele, fazendo-me por um segundo esquecer de qualquer dor física ou mental que a ressaca tenha me trazido.

– Você quer um pedaço? – A forma como a pergunta dança de seus lábios até mim, como um robe de seda escorregando artisticamente de um corpo esculpido, me é totalmente desconcertante.

– Estou bem, tomei alguns comprimidos, estou a procura de café, mas depois, venho lhe fazer companhia. Sabe do papai?

– Sogrão saiu, e disse que foi fazer compras. Mas o mercado ta fechado, e ele tinha três camisinhas no bolso, então deixa o velho foder, já que você não o faz.

– É meu pai Miguel, que nojo! Mais respeito, eca! Vou ir pra cozinha, tchau!

Antes mesmo de ouvir o que ele tinha a dizer, corro até a cozinha, tentando tirar da mente meu pai coberto de camisinhas prontas para utilização. Eca! Refaço o café, dessa vez, forte e sem açúcar, com um pouco de canela. O amargor fecha por um milésimo de segundo minha garganta, a enchendo d’água, o que me dá uma satisfação sem precedentes.

Quando volto pra sala, já recuperado do exagero de informações, vejo Miguel ainda na mesma posição, e ainda devorando chocolates. Há um mar de papéis laminados no chão, provas do crime de Miguel, sua gula!

– Quanto tempo de academia você faz por dia?

– Nada Docinho, porque eu iria me matar na academia? Deus me livre, de vez em quando uma caminhada.

– Então você é magro de ruim, né?

– Não, sou magra por genética, vai tomar no seu cu, ta atrapalhando o episódio.

– Ah, claro, querer conversar com uma visita na minha casa agora é atrapalhar? Foi mal! Não faço mais.

– Que visita? Você? Eu vivo aqui, se fode sozinho. Não vem de drama, senhor heteronormativo.

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