Ariel é bastante pálida, a pele bem clara, com algumas pintinhas espalhadas pelos braços e colo. Ela é dona dos olhos mais grandes que eu já vi, mas por incrível que pareça um é verde e o outro é castanho. Ariel gosta de Pink Floyd, Conté e de beijar meninas.
Sei também que ela ama Elis Regina, músicas em espanhol, fuma constantemente e ela beija meninos também.Gostaria de contar que eu conheci a Ariel em uma festa, ela estava com uma garrafa de Heineken na mão, ou passeando na avenida Paulista, em uma exposição de arte contemporânea ( que é super a cara dela) em um rolê de skate, ou em um sarau, ou em qualquer lugar que a existência da Ariel seria possível. Mas eu conheci ela em uma palestra chata sobre empreendedorismo, a gente se trombou por lá, saímos com uns amigos bebemos como se o dia seguinte não fosse quinta-feira e discutimos sobre filosofia até às 3 da manhã. Depois disso eu não lembro bem como eu tinha chegado em casa, e nem como Ariel tinha meu número de celular, perguntando se eu queria ir em uma festa com uns amigos dela.
E eu fui.
Porque embora morar em uma república tivesse vantagens, eu não tinha muitos amigos e era nova na cidade, foi a primeira aula na faculdade que eu matei. E com orgulho eu digo que não foi a primeira de muitas. Saímos mais vezes, e eu de certa forma me sentia incluída e confortável em um grupo de pessoas que tinha poucas coisas em comum comigo. Nos tornamos amigos rapidamente.
O mais estranho de tudo isso, foi quando Ariel me chamou pra tomar um café, só nós duas, o que era incomum, porque já tínhamos um grupo de amigos, e saímos todas as vezes juntos.
Eu gostava de café e Ariel tomava chá. Que eu julgava ser uma água com um gosto diferente, diga-se de passagem.
Conversamos sobre trivialidades, sobre ela querer mudar, fazer intercâmbio no próximo semestre, sobre eu adotar um cachorro, pintar o cabelo de azul, e mudar a cor no meu quarto, sobre a família dela ser maluca ( a tia tinha acabado com o carro novo do namorado) e sobre eu sentir saudades da minha família que morava no interior. Conversar com ela era fácil, simples de lidar. Mas eu sabia que ela não era minha amiga, passamos tempo demais juntas, mas nunca falávamos sobre a sua irmã que morreu ano passado ( Vitor me contou) ou as minhas síndromes de pânico. Era como se fôssemos amigas,mas nem tanto. Íntimas mas nem tanto. E eu odiava aquilo porque me sentia sozinha as vezes.
Foi no meio de uma mordida no meu croassaint que Ariel piscou os olhos pra mim por trás das lentes dos óculos e disse sem rodeios:
- Droga, você é linda. Que merda.
Eu ri sem graça, elogios vindos do nada de Ariel era como nevar em Salvador. Impossível.
- Mas eu não tô falando por que queria ser linda como você, tô falando isso porque queria beijar sua boca - ela sorriu, sem deixar de me encarar
Eu engasguei, juro. Tossi tanto que atraí olhares de alguns clientes que estavam no café e ela riu achando graça da situação toda
- é sério, Lis - ela continuou- Eu quis te beijar desde quando a gente se viu lá na palestra. Uma pena você não gostar de garotas.E colocou o cabelo loiro atrás da orelha, tomando um gole do seu chá de sei-lá-o-que, como se o que ela tivesse dito na verdade foi:
" comprei sapatos novos"- Ariel... eu... A gente não, quer dizer, você é super legal mas eu... Você sabe - Do jeito que eu me conhecia, tinha corado tanto, parecendo um morango ambulante.
- Tudo bem, Lis. Relaxa, eu vou fumar, tô esperando ali na porta - sorriu carregando consigo a bolsa e as chaves do carro. Ela sabia que eu não gostava do cheiro de cigarro.
O croassaint começou a ficar com um gosto estranho a medida que eu via ela se afastando, depois o café e a nossa amizade também, agi como se nada tivesse acontecido depois, e voltei a lidar com a mesma Ariel de sempre, porque lidar com ela era assim, fácil.
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Todas as Palavras Que Não Foram Ditas
Teen FictionTudo que eu sempre quis dizer, mas só consegui escrevendo.