O reflexo no espelho mostrava o quão infeliz eu realmente estava. Claro que sempre que eu saía deste quarto eu mantinha uma farsa, ninguém conseguia notar verdadeiramente o quanto eu desprezava minha vida, a única coisa que me fazia levantar da cama todos os dias era meu filho. Apenas um bebé ainda, nem 12 meses tem.
Eu pego em meu camafeu, como era ritual todas as manhãs, e o abro. A imagem de Danilo continuava lá ao pé da inscrição "Amo-te para sempre".
"Meu amor" eu falo para a sua imagem, acariciando seu rosto "Como eu sinto a sua falta" Meu coração doía de saudade de o ter ao meu lado, de o tocar, de o beijar..."Eu tento ser forte, eu juro que tento, por nosso filho, mas é tão difícil sem você...Ele se parece mais com você a cada dia que passa, ele tem a mesma gentileza no olhar." eu lhe conto sorrindo tristemente "Gustavo não gosta quando eu digo isso. Ele nem quer ouvir seu nome nesta casa, mas eu continuo dizendo, porque você não merece ser esquecido, meu amor. Meu coração pertence a você e apenas a você, quando você morreu meu coração foi junto."
Eu me lembro quando Gustavo deu a notícia da sua morte, ainda como se fosse ontem, foi o pior dia da minha vida saber que você nunca mais voltaria. Ele disse que tinha sido um acidente de caça, que não foi possível recuperar seu corpo, mas parte de mim sempre suspeitou que não tenha sido mesmo isso que se passou, mas sem provas, que poderia eu fazer? Na altura eu já estava grávida de André, nosso filho, e para não trazer vergonha a nossa casa e ao nosso nome, meu pai me obrigou a casar com Gustavo Bruno em pouco tempo, antes que a barriga se começasse a notar. Na altura eu estava em choque ainda, eu passava meus dias na cama chorando pela morte de Danilo, me recusava comer até minha mãe me ter persuadido a cuidar de mim pelo meu bebé, um pedaço de Danilo que ficaria comigo para sempre.
Eu casei com Gustavo Bruno, não por amor, mas sim por meu filho. Ele me prometeu que iria cuidar de meu filho como se fosse dele, que nada nunca lhe faltaria, mas agora eu sei o contrário, ele iria sempre sentir falta de uma coisa, o amor de um pai. Eu vejo como Gustavo olha para André, ele não o ama, pior, ele o considera uma lembrança viva de Danilo, uma prova que eu nunca o amaria, e que mesmo morto, Danilo ainda ocupava meu coração tão fortemente como no início.
"Eu vou cuidar de nosso filho Danilo. Ele vai saber o quão maravilhoso você era, e ele o vai amar." eu prometo beijando sua imagem e colocando o camafeu no meu pescoço, bem junto de meu coração.
Eu desci e procurei por meu filho. Bendita costuma olhar por ele de manhãzinha. Gustavo não gostava de o ouvir chorar à noite, e me proibia de cuidar dele durante as horas da noite. Eu tentei várias vezes, mas ele chegou mesmo a trancar a porta de nosso quarto para que eu não pudesse ir ter com ele. Não é próprio de uma senhora, ele costuma dizer, é para isso que têm empregados. Eu não concordava, uma mãe deveria cuidar de seu filho, já discuti várias vezes com Gustavo sobre isso, mas sem resultado. No final do dia ele era o homem da casa, e como minha mãe diz eu deveria obedecer às vontades de meu marido, para o bem do meu filho.
"Bom dia senhora" Bendita cumprimenta quando me vê. Ela carregava meu filho nos braços. Eu sorri assim que o vi. Eu nunca pensei que pudesse amar alguém tanto quanto amava Danilo, mas esse era outro tipo de amor. Era amor de mãe.
"Bom dia Bendita" eu cumprimento tirando meu filho de seus braços e segurando-o perto de mim "E bom dia para você meu filho" eu falo beijando sua bochecha. Sua gargalhada de felicidade aquece meu coração "Ele passou bem a noite?"
"Dormiu a noite inteira senhora, acordou faz pouco" Bendita fala sorrindo carinhosamente
"E meu marido?" eu pergunto, quando acordei ele já não estava no quarto.
"Ele está no escritório com seu pai faz um tempo senhora." ela me informa
"Meu pai? Eu pensei que ele estava na fazenda." eu falo estranhando a sua presença em minha casa