Diabo Natalino

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Faltava apenas um dia para o natal. Ganhar presentes, rever parentes, a grande ceia, mas nada disso animava Clarice, pelo contrário, ela faria de tudo para não ter que passar por mais um natal com sua família.

— Eu não acredito que vou ter que passar mais um natal aqui — resmungou Clarice sozinha em seu quarto socando sua cama e chorando de raiva. — Eu odeio eles, odeio! 

Estava de noite e ela já se preparava para dormir, mas os gritos e xingamentos de seus pais não deixavam.

Sua mãe apanhava de seu pai e mesmo assim dava mais valor á ele do que a própria filha, e isso era uma das coisas que faziam ela os odiarem. Em todo natal era aquela alegria falsa com os parentes que vinham á sua casa, ou quando eles iam para a casa de algum parente, e Clarice era obrigada a agir como se estivesse tudo bem.

Você e sua filha são duas vagabundas, eu odeio vocês duas — disse o pai de Clarice, ela percebia que o mesmo estava bêbado.

Eu também odeio ela, mas eu amo você, vamos pro quarto pra eu te mostrar — disse sua mãe, também bêbada.

Quando a gritaria se acalmou com a entrada dos dois para o quarto, Clarice finalmente pôde se concentrar para dormir, enquanto não pegava no sono ficou desejando a morte de seus pais para que ela tivesse paz, ela desejava aquilo mentalmente com muita vontade, enquanto lágrimas molhavam o seu rosto, até que pegou no sono e imediatamente teve um sonho:

— Clarice? Clarice? — disse uma voz grossa.

Tudo estava preto, até que uma espécie de diabo apareceu sentado em um grande trono vermelho.

— Quem é você? — perguntou Clarice, que não estava presente no sonho, apenas sua voz. 

— Eu? Você não me reconhece? — disse o diabo e deu risadas baixas. — Me chame de solução, Clarice.

— Pode me explicar?

— Clarice, eu vim através do seu ódio e desejo, é natal, e quando desejamos algo ruim com muita vontade nessa data eu posso aparecer e dar a oportunidade de tornar realidade, essa é a sua vez. O seu ódio é real e eu gosto disso, você odeia seus pais, você odeia essa família que é obrigada a conviver por escolha de Deus, só eu posso mudar isso e só depende de você aceitar.

— Pera, então você pode se livrar dos meus pais? Eu não sei se aguentarei passar mais um natal ao lado deles, mentindo aos parentes, fingindo ser outra pessoa e continuar nessa droga de vida. Me ajuda.

— Por que você acha que eu apareci? — O diabo deu uma risada estranha. — Repita tudo o que eu disser e não precisará rever seus pais nunca mais, nunca! Está pronta?

— Sim!

— Eu, Clarice...

— Eu, Clarice...

— Entrego-me ao meu desejo...

— Entrego-me ao meu desejo...

— Entrego minha vida...

— Entrego minha vida...

— Para que sejam feitas as alterações necessárias...

— Para que sejam feitas as alterações necessárias...

— Eu, Clarice...

— Eu, Clarice...

— Estou livre...

— Estou livre...

Em seguida tudo desapareceu no sonho e Clarice acordou ofegante e suada, acendeu o abajur do lado de sua cama e olhou o relógio, que marcava 03h00, ficou ali deitada pensando e logo caiu no sono.

A manhã chegou e Clarice mais uma vez acordou ouvindo os gritos de seus pais, era apenas 08h00. Espero que meu sonho se torne realidade e eu me livre desses dois, desculpe Deus, pensou Clarice, sentada na cama.

As horas passaram e ela havia ficado todo o dia trancada em seu quarto, saindo poucas vezes para comer algo e beber água e evitando o máximo de contato com seus pais, mas a hora de se preparar para o natal chegou e seu pai apareceu em seu quarto.

— Vá se preparar pra merda do natal, quero ver você sorrindo hoje e quieta.

— Vai se ferrar — disse Clarice em um tom de voz alto, o que fez ele a pegar pelo pescoço e logo soltar.

— Agora! Se não você vai ver o que te acontece.

Clarice não pensou em rebater e apenas esperou ele sair do quarto para tomar seu banho.

Enquanto tomava banho, Clarice começou a escutar mais gritos de seus pais novamente, mas tentou ao máximo ignora-los e continuar com o seu banho. Ao terminar e voltar ao quarto, Clarice viu uma fumaça vinda da abertura da porta, foi direto a ela e tentou abrir, mas não conseguia, e quando ela olhou pelo buraco da fechadura se desesperou, havia fogo pela casa inteira e seus pais estavam estirados no chão, já queimando. No mesmo instante Clarice pensou em comemorar, mas antes precisava sair daquela situação, o fogo se aproximava da porta e ela não sabia o que fazer, ficou desesperada gritando pela janela mas ninguém a ouvia pois a rua estava deserta. Depois de inalar uma grande quantidade de fumaça, desmaiou.

Sombras de pessoas começaram a aparecer no chão, paredes e teto do quarto, Clarice ainda estava desmaiada, as sombras se aproximaram de seu corpo e faziam risadas estranhas, a medida que as sombras a cobria, seu corpo sumia, até que sumiu por completo, o que a fez acordar, e se tornar um deles, apenas sombra.

Os parentes chegaram para a ceia na casa e quando viram o fogaréu ligaram para os bombeiros e o problema do incêndio foi resolvido com rapidez.

Foi descoberto que o incêndio foi causado por pisca-piscas e a árvore de natal e foram achados apenas os corpos do pai e da mãe de Clarice na casa.

Seu pedido havia sido atendido, ela nunca mais tornaria a ver seus pais, por que o Diabo Natalino está sempre preparado para realizar os piores desejos de natal... Você tem um?

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