15. Fragmentado

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Eu tive um sonho.

Este, entretanto, não era nem perto dos que costumo ter. O peso que sustenta minha imaginação me leva para Saturno nas horas em que fico inconsciente; em outras, o espaço é o meu lar, as estrelas servem como pequenos tijolos que o estruturam. Porém, indo contra este padrão, no sonho desta noite não havia estrelas, planetas, poeiras galácticas ou qualquer outro elemento que me atraia.

Surpreendentemente, havia, apenas, Iris e eu. Era um dia ensolarado, o que tornou seus olhos mais brilhantes que o normal; conversávamos sobre banalidades, sorríamos a todo segundo, como se não existisse o desconforto pelo tempo com os lábios esticados. Então, sem que um simples aviso fosse dado, ela me beijou. Pela primeira vez, ela quem tinha tomado a iniciativa, não o contrário. E mais intenso do que qualquer sonho que já presenciei.

A sensação do beijo ainda está em mim, agora que acordei. Ela está presa em meus lábios. A acompanhá-la, a vontade de que aquilo se torne realidade.

Felizmente, o destino parece estar a meu favor.

Hoje é sábado, um dos dias da semana que mais aguardo. A ocasião em que Iris chega a qualquer horário, e as horas passam como num passe de mágica, fazendo com que eu deseje voltar para o início da manhã, só para que nossos momentos juntos sejam revividos.

Acabo tendo que me acostumar com os sentimentos despertados pela presença de Iris, contudo, não posso afirmar que gosto deles, é difícil lidar com algo do qual não entendo. Alguma hora as respostas aparecerão. Tenho certeza.

Quando percebo uma movimentação suspeita no andar debaixo, sei que ela chegou. Ansioso, paro em frente ao espelho, após vestir uma camisa de tecido macio, a abrir mão do casual moletom por conta do calor. Meus cabelos estão na típica textura volumosa de sempre, uso os dedos para penteá-los, aproveitando o tempo para questionar a mim mesmo se Iris os prefere mais comportados ou não.

Por que a opinião dela possui tanta importância?

Confuso, decido descer de uma vez, para que possamos, enfim, conversar. Quero que ela me diga se pensou no beijo durante esses dias que se passaram, assim como eu; se a coragem me permitir, perguntarei.

Faço o caminho pelos degraus com um pouco de pressa. Todavia, palavras confusas roubam a minha atenção, o que me faz parar ainda no início da escada.

— Sendo sincera, sei aonde a senhora pretende chegar com essas insinuações. — posso reconhecer a voz de Iris.

Seu tom ríspido me preenche de curiosidade e faz com que eu prenda a respiração. Nunca a ouvi falar daquela forma antes.

— É simples: concordei com suas vindas à minha casa durante os finais de semana, imaginando que, em algum momento, o Henry se cansaria disso e as coisas voltariam ao normal. — ergo uma das sobrancelhas e escorrendo mais um degrau abaixo. — Eu estava errada, pelo jeito. Muitos dias se passaram e esses encontros continuam acontecendo. O que significa que Henry talvez possa não querer se afastar de você.

— E eu também não quero me afastar dele... — é inevitável o sorriso em meu rosto.

— Deve! Pensei em conversar com ele sobre essa situação, mas conclui que ele não entenderia. As coisas com Henry são complicadas... — posso ouvi-la estalar a língua. — e é aí que está o problema, Iris: Henry não entende muitos assuntos. Você é jovem, bonita, provavelmente está atrás de um relacionamento duradouro, se não gosta de uma vida mais "livre". Henry não pode lhe oferecer certas coisas. — meus lábios entreabrem com o que escuto. — Ele não pode entrar num relacionamento onde precisaria de cuidados a todo momento, ou de se policiar em relação a suas ações e as conversas.

Ruídos de SaturnoOnde histórias criam vida. Descubra agora