04. HOMENS DE BORRACHA

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— Nós nunca aprendemos, estivemos aqui antes
Por que estamos sempre presos e fugindo das balas?

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04.

Levou alguns segundos até que minha visão voltasse ao normal, até que a vertigem se desfizesse pelo menos um pouco. Agora conseguia distinguir alguns objetos, e as pessoas correndo ao meu redor já não passavam mais de simples vultos. No entanto o que sobrou da tontura ainda me impedia de ficar em pé sem cambalear

Como uma bêbada miserável, eu me arrastava sobre a relva enquanto tentava me apoiar na barra do carrossel, que tocava uma música insuportavelmente irritante. Suas cores vibrantes só intensificavam o resquício da vertigem que me perseguia. As lágrimas escorreram involuntariamente quando apoiei minha testa machucada e suada no metal gelado, em detrimento da pressão que estava sendo imposta sobre minha cabeça. Era como se houvessem cinquenta pessoas chutando-a na mais pura violência, fazendo-me contorcer as têmporas.

Mas que droga! Pensei em repleta agonia.

Era uma maldita sobrecarga mental, ocasionada pelos pensamentos de pânico pertencentes às centenas pessoas, que fugiam do fogo iminente. Esses faziam com que minha mente estivesse a ponto de sucumbir pela quantidade e por sua intensidade. Mal conseguia manter os olhos abertos. Eu estava no meio do circo, onde as pessoas corriam e me ignoravam, na maioria das vezes convictas de seu próprio egoísmo.

Após a explosão, o desespero se apossou, fazendo com que as pessoas fugissem até a saída do Smile Hill; e eu mal conseguia enxergá-los enquanto sentia-me completamente saturada e sem forças para me manter de pé. Minha cabeça girava e agonizava; não conseguia sair de um maldito circo, fazendo com que eu me arrependesse de não ter ouvido a minha primeira intuição sobre ter rejeitado o convite de Kevin

Kevin

Onde será que ele estava?

Será que ele conseguiu fugir?

Ele precisava me encontrar porque eu não o conseguiria.

Mal conseguia ficar de pé.

Se eu me movimentasse até a saída, onde coincidentemente estaria repleto de pessoas pensantes, acabaria tendo um colapso. E se eu ficasse aqui poderia ser pega pelo fogo, que já se aproximava da tenda principal.

Eu estava presa com meu pior pesadelo.

É o fogo, Violet, ele finalmente veio te buscar!

Grunhi enquanto apertava ainda mais barra do carrossel.

Não, não, não!

Tentei dar o meu primeiro passo em uma direção aleatória, movida por completo medo, contudo minha perna fraquejou e eu caí de joelhos no chão; grunhindo e praguejando com a dor instantânea. Apertei a barra novamente, tentando me colocar de pé. De repente algo clareou em minha mente:

O walkman!

Eu precisava dele! Talvez me ajudasse a desfocar dos pensamentos, mesmo que minimamente.

Tateei meu bolso, movida por uma esperança avassaladora, que foi arrebatada de mim segundos após fixar meus olhos teimosamente sobre um borrão e notar ser o presente de Kevin quebrado sobre a grama do circo. O aumento do meu choro foi imediato enquanto eu expulsava os mais rudes palavrões.

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