14 horas e 10 minutos do dia 13 de maio de 2013.
- ...Depoimento de José Maria Conceição Moraes, solteiro, maior de idade em sem documentos. Peço a quem estiver ouvindo, editando ou transcrevendo este depoimento que... que não faça com que ele chegue a conhecimento público e nem mesmo policial. pelo menos esta parte da conversa. Obrigado.
- O almoço estava bom, inspetor?
- Eu não almocei, não. O... o corpo da vítima foi roubado da cena do crime na hora do almoço, e um outro... um outro bilhete foi deixado no lugar. Creio que o senhor já deve saber qual o conteúdo do bilhete...
- "... E para minha última piada... 3/4".
- É... é isso, aí.
- Hm... e onde estão os homens que estavam nos acompanhando?
- Não se preocupe com eles. A conversa agora é entre mim e você. Escuta, eu... eu preciso saber mais sobre o seu... sobre o caso.
- Claro. Bem, antes da parada para o almoço, nós tínhamos conversado sobre um dos suspeitos. Ainda falta o outro.
- O senhor Romeu Prestes Vasconcelos, palhaço que tomou o lugar do senhor... José Dias, não é?
- Exato.
- Você descobriu a inocência dele pelas filosofias do... seu pai, certo?
- Certo.
- Então pode falar, seu José.
- Muito bem, eu analisei o seu Romeu nos dias seguintes ao assassinato e cheguei à minha conclusão graças à performance dele no palco.
- Não entendi.
- É simples: o senhor Prestes não é um palhaço risonho, maluco ou tristonho. Na minha opinião, ele nem deveria ter este título. Quando ele se apresenta, ninguém ri, ninguém se emociona, ninguém gargalha. Nem ele mesmo ri das próprias piadas e das piadas dos companheiros.
- Este é o seu motivo?
- Sim. Meu pai dizia que um palhaço que se propõe a rir, deveria estar rindo a todo momento. Ele dizia que se tirarem a comida de você, sorria da bebida. Se tirarem a bebida, sorria do próprio sorriso. Se tirarem o sorriso, sorria dos dentes caídos no chão! Para ele, um palhaço que demonstra seus sentimentos verdadeiros acaba provocando o... medo.
- ... O... medo de palhaços?
- É... Hm, hm, hm... meu pai contava:
"Sabe, acho que a primeira criança que desenvolveu este medo deve ter conseguido entrar no camarim de um palhaço. A criança, que a pouco tempo tinha visto uma figura sorridente e feliz, encontrou, naquele momento, um ser humano devastado, acabado e frágil, e isso a confundiu. Os palhaços acabaram combinando de não saírem da personagem, até mesmo nos camarins e, para que todos se lembrassem do acordo, eles pintaram uma lágrima no rosto. Uma lágrima que guarda todo o sentimento de um palhaço. E aquelas crianças que sentem medo... bem... elas devem ser capaz de ver o que tem dentro da lágrima."
- O... o que está querendo me dizer com isso?
- Estou querendo dizer que o seu Romeu não tinha uma lágrima pintada no rosto. Ele não se importava tanto assim com sua profissão para matar alguém que estivesse em seu caminho. Ele, ao contrário da senhorita Sandra, não tem família. Não havia porque ou por quem ele matar.
- Então diga... seu José: qual é... qual que é a sua conclusão final?
- ... João Dias Barbosa Brandão Freitas não cometeu suicídio. Não foi assassinado pela amante Sandra Albuquerque Dias Souza, tampouco pelo palhaço Romeu Prestes Vasconcelos. O assassino pode ser qualquer um. Alguém como um amigo, um vizinho ou um policial. Alguém como... eu e você.
- ... Não quis dizer... "alguém como eu... (suspiro) alguém como eu ou você"?
- Não. Alguém como eu e você. Especialmente você, mas pode ser como eu, também.
- ... (Ouve-se um choro) O que você quer? O que você quer de mim?
- Eu gostaria... de te contar uma piada (José se levanta). Num belo dia, um homem foi ao médico e disse:
"Doutor, acho que estou ficando louco. Para onde quer que eu olhe, só vejo palhaços!"
O doutor, então, perguntou:
"E o que você sente quando olha pra eles?"
O rapaz respondeu:
"Eu sinto medo. Eles estão sempre sérios, esperando que eu faça algo. Parece que vão me atacar a qualquer momento."
O médico finaliza:
"Hm... e você já experimentou sorrir para eles, senhor? Se, por acaso, eles rirem (José sussurra esta parte no ouvido de Joaquim, só dá para entender por leitura labial), talvez seja você o palhaço..." (José entrega um pedaço de papel a Joaquim).
Acho que já disse tudo o que tinha para dizer, inspetor. Foi um prazer conversar com você, de novo. (José sai da sala)
(Risos e gargalhadas do delegado ecoam por toda a delegacia).
(A gravação é cortada).
VOCÊ ESTÁ LENDO
A Última Piada
Mystery / Thriller"...Julgo, por fim, que não existe mais ideal máscara do que o humor, assim como não existe mais ideal herói do que...um palhaço."