Escuridão

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Sob a noite fria de inverno, voltávamos para casa. Tínhamos ido a uma festa que ficava a mais ou menos cinco quarteirões de onde moro, o que nos levou; duas amigas e eu, a irmos a pé. Quando resolvemos sair para irmos à festa, a noite estava fria, mas clara, as ruas movimentadas e pessoas andavam por todos os lados, cheias de blusas e casacos, pois o inverno castigava nossos rostos com seu vento frio. Eu fui em direção à casa de Bia e logo em seguida, nós duas fomos buscar Giulia. Ela ainda não estava pronta, então entramos para esperá-la. Conversamos um pouco com os pais de Giulia e logo ela apareceu. Nós três estávamos muito bonitas.
Eu usava um vestido curto bege, meia calça cor de pele com botas marrom de cano longo e saltos altos; um mantô na mesma cor protegia-me do frio cortante e, para dar um charme a mais, um chapéu. Bia trajava saia curta com blusa de lã, meia calça e botas cano longo e saltos altos. O tom predominante era o preto. Giulia era a única que estava de calça comprida de veludo azul, botas cano curto, mas de saltos tão altos quanto as nossas, uma blusa branca sob um mantô azul escuro. Fomos para a festa.
Divertimo-nos muito. Já passava das vinte e três horas quando resolvemos voltar. Parecia que a rua não era a mesma que havíamos percorrido há apenas algumas horas. Estava muito escura, quase não conseguíamos ver as emendas dos paralelepípedos, o que por diversas vezes quase nos fez cair. Por sorte estávamos três, e segurávamos uma na outra. Os saltos das botas ajudavam a nos desequilibrarmos.
Um poste de luz antigo e descascado em cada quarteirão deixava a rua mais sombria e assustadora. Nós rezávamos para que a luz do poste, amarelada pelo tempo, não se apagasse naquela noite, naquela hora. Já não havia mais pessoas passeando, as casas estavam trancadas e suas luzes apagadas a deixavam mais sinistra.
Giulia virou a terceira esquina para ir para sua casa. Bia e eu continuamos. Apressamos os passos pela escura e deserta rua da cidade. Bia chegou e perguntou-me se queria dormir em sua casa aquela noite, pois não demoraria a chover. Respondi que não, pois não havia avisado meus pais. Só faltavam dois quarteirões, chegaria logo. Despedi-me de Bia e continuei meu caminho.
Ouvia somente o ruído do vento arrastando as folhas secas pelo chão.
Sempre fui uma garota responsável e destemida. Gosto de me arrumar, pentear sempre diferente meus cabelos loiros cacheados. Não vou a lugar nenhum sem maquiagem, nem que seja so um batom. Acredito que a palavra "vaidade" foi criada para as mulheres. Nunca tive medo de andar sozinha, por isso não precisava que meus pais fossem me buscar em uma festa tão próxima de casa. Mas, não sei por quê, naquela noite senti medo. Pensava: só mais alguns minutos de caminhada e estaria segura em casa.
Enquanto andava, tive um pressentimento de que não estava sozinha. Ouvi barulho de sapatos que sincronizavam com os meus. Quanto mais rápido eu andava, mais perto de mim aqueles sapatos chegavam. Não tive coragem de olhar para trás. Mas sabia que precisava ver o que me seguia ou se eu estava somente imaginando. Juntei todas as minhas forças, e, continuando a andar, agora mais apressadamente, virei-me. No exato momento pude ver uma sombra arrastando-se para dentro de uma casa antiga que parecia desabitada.
Confusa, comecei a correr desesperadamente. O salto não ajudava, quase fui ao chão e, quando menos esperei, o vento soprou forte arrancando meu chapéu e levando-o para longe. Parei, mas não consegui voltar para pegá-lo. O medo me dominava. O tempo parecia que estava fechando mais rápido.
Cheguei a minha casa e vi que o carro de meus pais não estava na garagem. As luzes apagadas. Abri a porta correndo e disse para meus dois cachorrinhos:
-Entrem.
Gesticulei um movimento com a cabeça quando Lila e Bob já haviam entrado. Ascendi todas as luzes, inclusive as dos quartos, verificando se suas janelas estavam fechadas, corredor e banheiros. Voltei para a sala e deitei no sofá. Comecei a pensar em tudo o que havia acontecido naquela noite.
De quem seriam aqueles passos? Aquela sombra? O que queria de mim? Lembrei-me do meu chapéu. Entristeci-me a ponto de começar a chorar por tê-lo perdido. Era apenas um chapéu, mas eu gostava muito dele. O que me fazia sentir muito era a perda do meu broche, pois eu o havia ganhado de minha avó. Estava a gerações com minha família, e eu já o considerava minha marca. O broche prendia-se no chapéu bege, uma fita caramelo ao seu redor. Era um broche antigo, um camafeu sobre uma fina tela de ouro e com a letra "S" desenhada na forma de uma cobra vermelha e dourada com pequenos olhos em rubi. Nunca iria imaginar o quanto esse broche seria importante em minha vida.
Meus pensamentos foram interrompidos pelo bater de uma janela. Achei estranho, pois acabara de vir dos quartos e todas estavam fechadas. No meu quarto, a janela batia arremessada pelo vento frio da noite. Fechei-a.  Olhei ao redor e tudo parecia como antes. Aproveitei para trocar de roupa e ficar mais à vontade. Minhas botas já não estavam mais confortáveis. Tirei-as, coloquei minha pantufa e um moletom e voltei para a sala. Liguei a televisão para relaxar e esperar por um filme.
Lá fora uma chuva intensa com trovoadas fez com que levantasse o som da televisão. O Jornal falava de um corpo achado próximo à estrada que liga Campinas a Paulínia. O curioso é que a vítima tinha dois furos no pescoço. De repente, a energia acabou. Tudo escureceu. Fui tateando até próximo à mesinha de entrada, ao lado direito da porta e peguei um castiçal. Vi um foco de luz vindo do fundo do corredor e, de relance, uma sombra de um homem alto em direção aos quartos. Fui atrás dela.

Vampiros : A união *parte 1 *Onde histórias criam vida. Descubra agora