Capítulo II - Pedro

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Pedro acomodou sob o antebraço seu casaco de pele. Vagarosamente, pôs-se a caminhar rumo ao casebre cujas paredes eram feitas com toras de madeira amontoadas: sua casa.

Naquela manhã, o reino encontrava-se abafado. Ao caminhar pelas ruas cujo assoalho revestia-se de pequenas pedras chatas, o céu derramava finas gotas de água, miúdas e cristalinas, sobre tudo que era capaz de tocar. Era este, pois, o típico clima da estação de Liyurío, a qual precedia o gélido Alyman, nas terras de Ayanii as estações do ano eram sempre muito bem definidas.

Sentado sobre a estirpe de uma frondosa árvore de longas raízes expostas, a qual era reconhecida por sua nobre madeira: a meeira*, quase que despercebido em meio à multidão que já se formava em uma das mais extensas ruas do Vilarejo Central, um velho, de cabeleira branca e barba irregular grisalha, segurava um cachimbo por entre os pequenos dedos. O idoso, que possuía olhos mais brilhantes que o comum, fitava a Pedro diretamente.

Uma vez de volta ao lar, o recém chegado da floresta é recebido com a fria presença de seu irmão de maior idade, aquele o qual sempre aponta para o céu com o nariz.

- Você passou a noite fora... - observou.

- Minha cama está com percevejos... - formulou uma desculpa sem delongas, conforme retirava dos pés os seus ensopados sapatos marrons. - Sabe como é...

- Sei... E também sei que alguém foi rebaixado de patente. - O sol que antes lhe iluminava a face distanciava-se conforme Magnus, seco, virava a cabeça para o lado oposto dos raios solares os quais o avançavam através da pequena e simples janela de madeira, onde repousavam flores singelas e alguns temperos.

- Como é? - Amel deu dois passos para fora do quarto dos cinco irmãos, revelando sua presença no pequeno ambiente familiar, onde tudo podia ser ouvido, dado o limitado espaço e as paredes finas.

O homem loiro cerrou os ambos os punhos, revelando nervos saltados, e virou-se para o irmão.

- A culpa é sua. - disse. - Chega de suas ações de criança! Vive a se meter em confusões, aposto quinhentos kadjins* de prata que é para me afetar! Se você não consegue se controlar e deixar com que as bruxas queimem, tudo bem, mas não é só você que nunca vai conseguir ser nem mesmo um mero soldado, pois eu também me comprometo!

Pedro também se mostrou irritado. Mais uma vez, o outro proferia palavras as quais pareciam ceifar-lhe com navalhas o peito. Como poderia dizer tamanha patifaria?

- Você é um idiota. - falou. - Só pensa no seu próprio umbigo. Não merece mesmo o cargo que tem... Digo, tinha.

Magnus quase que partiu para cima de Pedro, com violência, porém Amel, que até então continha-se em concreto silêncio, marchara rumo à direção do primogênito.

- Deixe-o. - A menina o acalmava habilmente. - Irmão, por favor, deixe-o.

Após alguns poucos instantes, Magnus, enfurecido, pisou seguidas vezes duramente contra o chão, num tenso caminhar em direção ao único acesso do casebre para a área exterior. Saindo, deixou-os, estrondoso, ao bater a porta de madeira.

Pedro, em passos rápidos, desviou-se de Amel, sinalizando-a agradecimento e seu estado de espírito pelo canto do olhar, e entrou no quarto, repousando num canto o casaco que ainda consigo carregava. Amel adentrou o recinto.

- Te poupei apenas por ser seu aniversário, Pe.

Pedro a fitou com um frágil sorriso por entre os lábios e calçou novas botas, portando seu arco e flechas, colocados ambos em um suporte revestido por pequenas pedras vermelho-rubi, o qual se prendia às costas através de um largo couro que lhe abraçava o corpo em diagonal.
Sem muito dizer, apenas depositou um beijo na testa da irmã mais nova e saiu, planejando regressar novamente à floresta, afinal de contas, a comida para o almoço e janta não iria surgir sozinha e logo os outros também iriam retornar.

Crônicas De Ayanii: O Menino e o LoboOnde histórias criam vida. Descubra agora