Quando o céu tingia-se de laranja, ainda era cedo.
No reino, Melys chorava pelo irmão, sentindo por sua falta. Todos os dias sumiam pessoas. "Por sorte", pensava a pequena, "isso geralmente acontece com os escravos ou com os miseráveis". Mas não, quem sumira fora o rapaz que pertencia a uma das mais ricas famílias de camponeses. Quem a consolava era Amel, a loira mais velha, quem já havia estado também aos prantos, às escondidas, afinal, Amel não gostava de chorar na frente das pessoas, coisa com a qual Melys não se importava.
Pela vigésima vez naquele dia, a rapariga de olhos marejados perguntava:- Mãe, onde anda Pedro? – E pela vigésima vez naquele dia a mãe a ignorava, como se não fosse capaz de ouvi-la, fazia um silencioso "shhh" e aninhava a menininha ao peito, ao passo que Melys adormeceu.
- Você sabe... Sabe o que aconteceu? – perguntou Amel à mãe.
- Imagino, minha filha. Imagino mais do que você pode imaginar. – Seu olhar era firme, como o de uma onça. – Percebe, minha querida, que há mais soldados do que nunca? Rondando por todos os lugares?
Amel suspirou profundamente, murmurando um quase que inaudível "sim".
- Filha minha, posso não saber de muitas coisas, mas se há algo que sei deste mundo dos homens, é que quando há muitas armas sendo carregadas em tempos de paz, uma guerra está para começar.
Simultaneamente, dessas conhecidências as quais costumam passar por despercebidas, Pedro encontrava-se na reunião com as criaturas mágicas, em meio ao acampamento na floresta.
- Guerras são coisas feias. – dizia o chefe dos anões, pequenas criaturas que surgiram das minas do Oeste e possuem o rosto ligeiramente rosado. – Mas devemos nos preparar. Digo ao conselho que aqui se forma que nossos machados estão afiados, e lutaremos juntos, meus irmãos, nós anões nos comprometemos com a linha de frente da batalha. Como ia dizendo, guerras são coisas feias, mas a beleza está na nossa capacidade de lutar e defender nosso povo e nossas matas, nem que se for com nossas próprias vidas!
- Estamos com vocês. – concordavam as fadas guerreiras. – Pelo fim do Império das Feiticeiras das Sombras!
- Nós também. – disseram as águias-gigantes, ao lado dos condores, as harpias e os falcões. Ali, talvez com a exceção de Pedro, o qual descobrira o fato apenas agora, todos sabiam que, na verdade, quem realmente governavam eram as Feiticeiras das Sombras, e o rei, embebido por seu ego e orgulho cego, tratava-se de, mais ou menos, uma máscara (ao menos, como se fosse uma).
Pedro, rapaz que agora crescia e começava a entender o mundo e como as coisas funcionavam de fato, apenas assistia, balançando com a cabeça. Amaroq se encontrava sentado ao seu lado, leal.
- Meu garoto, – perguntou Koda. – sabe como manejar uma espada?
- Sim. – respondeu Pedro, limpando a garganta e levantando-se para que sua voz ressoa-se mais clara e limpa; em sua mente, lembrou-se do presente de Elora, olhando brevemente para a elfa. – Meu irmão ensinou-me as artes dos campos de batalha.
- Elora... – Koda chamou a atenção da mulher.
- Caro conselho, – dizia, com voz bem pontuada. – estão ao nosso lado também as dríades e os demais espíritos das árvores, assim como todo o meu povo: os elfos. Estamos preparados para formar, junto dos bons arqueiros de outras espécies, as linhas que defenderam a todos nós pelo ar, com nossas certeiras flechas. Digo com total certeza: meus melhores arqueiros são capazes de disparar uma média de treze flechas por minuto.
Elora virou-se para Pedro, fazendo com que suas brancas bochechas tomassem uma coloração vermelha.
- Meu doce e valente rapazinho. – A elfa não sorria, sua expressão era de quem guardava consigo o segredo de muitas eras. Para Pedro, sua colocação era tão certeira quanto às flechas que falava sobre. – A guerra que se aproxima (é provável que já tenha deduzido) faz parte da Profecia. Pedro: é o inevitável. Kalau, atual Rainha das Sombras, apaixonou-se por um de nós, os seres encantados. Está viva, sim. Por um motivo muito simples: a morte de uma rainha enfraquece todo o Reino, Reino este que é seu por direito governar, quando for a hora certa. – sussurrou na mente do rapaz a última parte, para a surpresa do mesmo, que nunca havia antes conversado por pensamentos. – "Deve conquistá-lo."
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Crônicas De Ayanii: O Menino e o Lobo
Fantasy"Ayanii não é uma terra comum. Mas quero lhe dizer que se você perguntar isso a qualquer ayaniiano, ele obviamente dirá o contrário. Há muitos séculos atrás, quando Ayanii ainda era uma terra livre, as criaturas mágicas e os humanos conviviam em paz...