Coelhos do meu coração

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As mãos de Lance estavam dentro dos bolsos do casaco.

Fechadas em punhos, suas unhas fincavam com força na palma da mão enquanto o cubano se direcionava até o refeitório, o coração mais agitado do que jamais esteve.

A visita de seu amigo havia lhe ajudado a se acalmar, mas assim que ficou sozinho no quarto, a ansiedade voltou com força e lhe atropelou como um caminhão.

- Você está bem? Parece meio pálido - Kinkade perguntou quando passou pelo cubano no corredor, o que fez Lance dar um sorriso nervoso e manear brevemente com a cabeça antes de acelerar o passo. Só queria voltar e se trancar em seu dormitório, mas tinha certeza que não poderia fugir daquilo para sempre.

Não quando Allura havia ido por pura e espontânea pressão pedir para que Lance saísse para poderem conversar depois.

   Jogou o capuz do casaco na cabeça, a tentação de sair correndo aumentando a cada segundo enquanto se aproximava da mesa na qual todos os seus amigos estavam sentados.

   Como se os deuses ouvissem e acanhassem seu desespero, seu lugar era ao lado de Keith, que lhe encarava meio preocupado. Lance não teve a audácia de olhar as outras pessoas na mesa; apenas sorriu levemente para Keith e se sentou, sua visão fixa nos rasgos dos jeans azuis.

   As conversinhas Lotor/Allura, porém, curiosamente acalmaram um pouco o coração agitado do cubano. Levantando um pouco o olhar, conseguia ver as pupilas dilatadas dos dois e as mãos entrelaçadas em cima da mesa.

   Deixando suas preocupações saíram em forma de um suspiro, Lance relaxou os ombros e se deixou ir contra o encosto da cadeira, se sentindo muito mais leve. Era daquilo que precisava: de uma prova que Allura estava feliz com Lotor.

   Foi quase cômico olhar ao redor e notar os olhos de todosos ex-paladinos em si. Deu de ombros, tentando deixar claro silenciosamente que estava bem, o que pareceu funcionar já que todos voltaram a conversar entre si.

   - Ah, Lance. Olá - a voz adocicada de Allura lhe chegou aos ouvidos, fazendo Lance pular na cadeira com o susto.

   - Oi Allura - abaixou o capuz, ajeitando sua postura. Seus olhos vagavam entre a alteana e Lotor, que encarava o cubano de um jeito diferente - não com aquele brilho falso que ele havia aprendido a identificar no mesmo. Parecia sincero, Lance ousaria dizer que até parecia doce. Maneou com a cabeça para o galra, que deu um tímido sorriso - Lotor.

   - Hey - o galra jogou os cabelos - e que cabelos, viu? - para trás, parecendo nervoso com algo. Allura, notando algo, sussurou alguma coisa no ouvido do marido, que concordou com a cabeça.

   - Amigos, boa noite. Estou muito feliz de estar aqui com vocês hoje depois de tanto tempo e eu espero que possamos conversar melhor depois mas, agora, acredito que Lotor queira dizer algo a vocês - Allura disse em bom e alto som depois de pigarrear para receber a atenção de todos da mesa.

   O mencionado se levantou, olhando calmamente nos olhos de todos ali, arranjando palavras dentro de si para se expressar.

   - Sinto muito por todo o mal que "o Lotor" dessa realidade causou para cada um de vocês. - respirando fundo, Lotor continuou - eu ouvi histórias sobre os acontecidos, e eu fiquei horrorizado com toda a maldade envolvida nelas. Gostaria de pedir, se tenho o direito, uma chance de compensar esses atos e provar que não sou ruim. E, também... Provar que vou conseguir fazer Allura feliz.

   Ouvir aquilo foi, para Lance, como sentir o sol quentinho e a areia da praia entre os dedos dos pés. Era mais do que o suficiente para Lance, que já se sentia feliz com as coisas dando certo para o casal à sua frente.

   Deixou um breve sorriso escapar de seus lábios e apoiou o rosto nas mãos, finalmente sentindo a paz que tanto almejava crescer em seu peito.

   Havia, sim, sido usado.

   E, sim, aquilo ainda doía;

   Mas não era bom o suficiente que pelo menos um dos lados da história estivesse bem?

   Para Lance, aquilo era o bastante, e aparentemente para seus amigos também, já que olhavam meio emocionados para Lotor.

   - O jantar está pronto! - Hunk saiu da cozinha, conversando alto com Shay enquanto os dois levavam os pratos até a mesa. Era seu lema, afinal: unir as pessoas pelo estômago. E funcionava.

   - Hunk, eu te amo! - Lance brincou entre algumas garfadas, seu humor já melhorando completamente com a comida.

   - Me agradeca depois da sobremesa - seu melhor amigo puxou a cadeira para a namorada, como o gentleman que era.

   - Por que Coran não quis ficar pra jantar? - Shiro perguntou para Allura, que deu uma risada antes de dizer que ele queria descobrir um pouco mais sobre o planeta Terra.

   Eles já imaginavam as besteiras que poderiam vir de um Coran sozinho e solto por aí, mas decidiram deixar aquilo de lado, pelo menos por agora.

   Depois de um descontraído jantar, Lotor e Allura pediram licença para descansarem, porque consumia muita energia ser rei e rainha de toda uma civilização e nunca terem um tempo para eles.

   - Lance, posso falar com você por um instante? - Keith pediu, em voz baixa, fazendo um arrepio subir pela espinha do cubano.

   - Claro - os dois desejaram boa noite para os amigos que ainda estavam à mesa e saíram pelos corredores, caminhando e aproveitando a companhia um do outro.

   Mesmo que apenas lá no fundo, Lance sentia algo crescer quando estava perto de Keith. Ficava inquieto, as mãos suavam e as vezes até tremiam, o coração acelerado como um tambor...

   - Como você está? - perguntou Keith, chegando discretamente para mais perto de Lance. Não chegavam a se tocar, mas apenas o calor do corpo alheio já fazia sua pele formigar.

   - Sinceramente? Agora, estou me sentindo ótimo - sorriu, se apoiando na parede gelada do Galaxy Garrison - Acho que consigo voltar a dar aulas agora, o que me alivia. Sinto falta dos meus alunos.

- É bom saber disso. É estranho ver o nosso Lance para baixo. - Keith comentou, coçando os olhos - Estou cansado, acho que vou ir dormir. Qualquer coisa você pode me chamar.

- Certo. Obrigado, Keith. - Lance acenou, andando na direção oposta à de Keith. Infelizmente, seus quartos eram quase em dois extremos diferentes, então Lance duvidava que procuraria o amigo caso tivesse algum problema. Porém, alguns passos depois, o cubano estava insatisfeito com o desfecho daquela noite. Se virou, vendo o semblante de Keith andar para longe e, num ímpeto de coragem, chamou seu nome.

   - Ah? O que foi, Lance? - o coreano se virou, as sobrancelhas franzidas em sua testa lhe dando um ar sério de "antigo Keith".

   Sem dizer uma palavra, Lance se aproximou. Se pondo nas pontas dos pés, deixou um beijinho delicado na bochecha branquinha de Keith, que ganhou uma cor rosada depois do ato do cubano. Observou, atônito, o amigo se afastar, sem entender muito bem o que havia acontecido.

   - Boa noite, Keith.

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