p r ó l o g o

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— Já pensou sobre isso? Em como a menor das decisões pode mudar completamente o curso da sua vida? O desfecho?

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Já pensou sobre isso? Em como a menor das decisões pode mudar completamente o curso da sua vida? O desfecho?

A voz fria e controlada continuava a soprar, os passos firmes ecoando através das paredes geladas.

A garota sentia o coração palpitando na garganta, desesperado em batidas frenéticas. Porém, a explosão era bem guardada dentro dela, por fora, já não esboçava qualquer reação.

— Como o bater das asas de uma inofensiva borboleta... algo tão pequeno pode ter um impacto tão grande... – continuou, pensativo, descansando a arma no queixo.

Quando se deu por satisfeito com a própria análise, ele se virou para Scar mais uma vez.

— Nada disso estaria acontecendo se você não tivesse ido àquele bar, pequena Escarlate. Se não o tivesse conhecido aquela noite... – apertou os lábios finos em um sorriso satisfeito, estreitando os olhos em fendas, tentando alguma reação do corpo feminino e machucado, sem conseguir nenhuma. — Você tem ciência disso? Tem raiva por saber que o que quer que vá acontecer com você, não aconteceria se não fosse por ele?

— Eu não me arrependo – uma voz rouca e gasta o respondeu, soando tão fraca e baixa, que mal parecia ter se arrastado pela garganta de Escarlate, esvaindo com o resto de suas forças.

— O quê? – o homem perguntou alto.

Ela respirou fundo e apertou as mãos, mal sentindo a ponta dos dedos pelo tempo em que elas estiveram algemadas para trás na cadeira.

Os machucados nos pulsos já não doíam, ela tinha aceitado que não havia escapatória. Ela estava presa ali. Morreria ali. Diante do rapaz que amava.

— Eu disse que eu não me arrependo de ter ido naquele bar.

Escarlate tinha a boca seca enquanto o rosto permanecia úmido pelas lágrimas quentes e recentes. Estava exausta, mal conseguia manter os olhos opacos abertos... Ela já os teria fechado e desistido de abri-los de novo se não fossem pelos dele.

Se não fosse pelo olhar firme de Damien no dela, como se estivesse tentando hipnotizá-la, arrastá-la para longe, para uma de suas lembranças em que estivessem seguros.

Juntos. Vivos.

Sem um monstro os torturando.

A garota sentiu uma lágrima escorrer pelo rosto inexpressivo e mergulhou nos olhos negros à sua frente, buscando esquecer que estavam ali, algemados, machucados e domados, um na frente do outro. Se aquele era o último momento juntos, ela queria que fosse, de fato, deles.

— Eu não me arrependo de ter te conhecido, não me arrependo de ter me entregado, de ter ajudado, ter acreditado... Damien, eu não me arrependo de ter me apaixonado.

Scar sentiu o gosto salgado do choro brincar com a língua, lavando a sua alma enquanto ela se despedia.

Damien franziu o cenho e fechou os olhos, respirando pesadamente. E então Escarlate se perguntou se ele estava fazendo o mesmo que ela... Se estava tentando se agarrar às memórias do que tiveram. Revivendo os instantes em que foram felizes, se entregaram, se aceitaram.

As brigas, as confissões, os beijos roubados... A tinta, os segredos, os sorrisos... A chuva, sua cama, seus corpos... Suas tempestades.

Ela esperava que sim, que continuasse viva nas lembranças do garoto. Se aquela era a única maneira de continuar com ele, gostaria que estivesse em seus pensamentos. Pois se morresse aquela noite, estaria levando-o junto consigo, em seu coração.

Quando Damien abriu os olhos escuros como a noite, a jovem teve a sua resposta. Sim, ele estava pensando nela. O brilho sombrio e discreto nos glóbulos dele não a deixava dúvidas.

Ela sabia lê-lo, talvez fosse a única que conseguisse. O pensamento a fez quase sorrir tristemente, se não fosse a interrupção abrupta da gargalhada exagerada atrás de si, trazendo-a porcamente de volta à realidade suja.

— Doce, doce Scar... – o homem armado disse em seu ouvido. Mas para o seu alívio, a voz se afastou.

Porém o sentimento não durou muito tempo, pois ele agora estava parado atrás de Damien, a mão ocasionalmente pressionando a arma contra a têmpora do rapaz que ela amava.

Seu corpo fraco achou forças para se desesperar, mas Damien permanecia calmo, olhando-a daquele jeito. Do jeito dele. Dizendo que tudo ia ficar bem, que ele estava ali, com ela. E Scar acreditou.

— O amor é subestimado. Você não acha? Ao menos, é como penso.

Macabro e divertido, o homem brincou com a arma contra a cabeça de Damien. E pela primeira vez na vida, a menina sentiu ódio. O mais puro e primitivo ódio por aquele ser.

Poderia matá-lo, se pudesse. Atiraria em seu rosto, mergulharia uma faca em seu peito. Qualquer coisa, ela se sentia capaz de fazer qualquer coisa se ele o machucasse.

— Você acredita que o ama? Acredita que ele te ama? – abriu um sorriso descreditado, passando a língua pelos lábios enquanto a fitava, entretendo-se com o seu pavor. — Mais do que ele ama a si mesmo? Bom, eu quero ver isso – disse simplesmente, abaixando a arma.

O homem buscou uma chave no bolso e deu de ombros enquanto pensava alto.

— O ser humano é uma criatura egoísta... Às vezes precisamos aprender da pior maneira possível.

Ele libertou Damien da algema enquanto um segundo homem permanecia apontando para a cabeça do garoto, pronto para puxar o gatilho se precisasse.

O moreno puxou as mãos para frente, mostrando que estava livre. E Scar piscou algumas vezes, perdida.

— Estou tocado, Scar... E curioso. Por esse motivo, vou deixar um de vocês viver para contar o final dessa história. Damien... – chamou, oferecendo a arma. — Uma bala. Uma chance – deu um passo para trás, se sentindo seguro por ter o capanga apontando para o jovem caso ele tentasse uma terceira opção. — É a sua escolha. Você pode atirar nela ou em si mesmo. Então diga, garoto apaixonado, quem vai viver essa noite?

Damien olhou para garota com intensidade, como se estivesse tentando dizer algo.

Scar não sentia mais o coração quando o observou erguer a arma vagarosamente em sua direção, firmando o toque e mirando no peito da menina. Mas, surpreendentemente, ela não sentia medo. Não queria que seu último sentimento fosse aquele.

Então ela mergulhou nas íris escuras de Damien e esqueceu de todo o resto, silabou um eu te amo mudo através dos lábios secos e assistiu uma única lágrima escapar dos olhos negros, sombrios e intensos que ela tanto amava.

Mesmo se ela soubesse que aquele seria o final, mesmo se pudesse voltar à noite paulista, ela não mudaria nada. Não alteraria sequer uma vírgula da história que viveu até então. Havia valido a pena. Ela faria tudo de novo.

E com esse pensamento, Escarlate fechou os olhos, sem arrependimentos, ouvindo o ecoar do disparo se prolongar na sua cabeça quando Damien apertou o gatilho.

Prisão DomiciliarOnde histórias criam vida. Descubra agora