V - Dever

170 23 6
                                    

Cruzar o reino de Doralin com uma garota de 16 anos que mal conhecia era mais estranho do que poderia ter imaginado.

Faltavam pouco mais de alguns dias para Fenrys Elentya chegar ao castelo de inverno de seu pai e ainda não havia chegado a cordilheira de montanhas que dividia o reino em Norte e Sul. Não chegaria a tempo nem que cavalgasse noite e dia sem parar.

Mais tarde teria de parar em algum vilarejo para mandar um corvo para o seu pai. Ao menos não seria a primeira vez que chegaria atrasado para um evento real. Talvez levasse duas semanas para chegar ao palácio, talvez um pouco menos. Com toda aquela neve cobrindo as estradas e o tempo que gastaria montando acampamento, era provável que sua noiva partisse antes de sua chegada.

Teria de se livrar de Luiza e atravessar o reino o mais rápido possível. Poderia tomar um atalho entre os vales das montanhas do urso cinzento. Economizaria alguns dias com isso, dias preciosos em sua agenda apertada.

O Rei estava certo quando disse que partir para fiscalizar os batalhões era besteira. Devia ter permanecido na corte como ele dissera e talvez pudesse manter alguma parte de sua honra.

Soltou um longo suspiro e puxou as rédeas de Lorenzo, seu garanhão marrom. A frente, logo abaixo do monte no qual havia parado um vilarejo se erguia de uma pequena clareira de neve cercada por uma vasta floresta de coníferas.

A garota apertou sua cintura e encaixou o queixo na curva de seu ombro, observando a aldeia. Não devia ter mais que duas dezenas de casas, uma taverna e algumas lojas de departamentos espalhadas.

—Vamos parar? —Indagou, apontando um dedo esguio para o lugar.

Assentiu brevemente. Não teria outra chance de deixar a garota em um lugar seguro antes de entrar em sua viagem louca para o sul.

—Sim, vamos passar a noite.

Desceu o pequeno monte puxando as rédeas de Lorenzo.

As ruas do vilarejo estavam vazias e quando parou para deixar o cavalo no celeiro da Taverna, não havia ninguém para prestar atenção.

Ergueu os olhos para o prédio e suspirou. A Taverna do lugar era um pequeno prédio de dois andares feito de tijolos vermelhos e telhado de barro.

Caminhou cuidadosamente até a entrada do lugar e empurrou a porta com a mão. O interior não era muito diferente, no entanto, era quente e acolhedor o suficiente para que escolhesse pagar um quarto ao invés de passar a noite no celeiro.

A atendente apenas ergueu os olhos cheios de tédio quando parou em frente ao balcão. Tirou uma moeda de ouro do bolso do casaco e a deixou sobre o tampo do balcão.

A mulher nunca devia ter visto ouro na vida pois seus olhos se arregalaram e sua boca se abriu em um perfeito O.

O príncipe sorriu conforme ela estaria uma mão e pegava uma chave de bronze. Os dedos dela estavam frios ao tocar os seus.

Lohan e Luiza subiram as escadas em silêncio, correndo os olhos pelas quatro portas do corredor até parar sobre o número do seu quarto. Quarto 02. Caminhou até a porta e enfiou a chave na fechadura, girando-a e ouvindo o suave clique do mecanismo.

Duas camas pequenas com colchões finos, uma pequena cômoda, duas cadeiras e uma mesa redonda com uma perna quebrada era toda a mobília que o quarto possuía.

Passou uma mão pelos cabelos escuros e foi até uma das camas, soltando o seu corpo sobre o colchão. Suas costas doeram como o inferno. Fechou os olhos e pediu para a morte que livrasse de aguentar mais um dia dormindo sob o cobertor de estrelas que era o céu noturno.

Longas noites de cavalgada lhe aguardavam assim que cruzasse o batente da porta daquela pobre taverna, no dia seguinte. Assim que o sol saísse de trás das árvores partiria na direção das montanhas, para cumprir seu dever como príncipe herdeiro.

Todo tipo de pensamento girava em sua mente desocupada. Seria Fenrys uma típica garota nobre? Mimada e esnobe o bastante para fazê-lo se arrepender do seu sangue real? Ou seria ela uma garota simples e de modos humildes? No final, não importava. Iria se casar com ela fosse como fosse. Lohan Halist, o príncipe de Doralin não iria se casar com uma mulher, mas com um reino inteiro. Ele é Fenrys Elentya seriam os responsáveis por unir dois reinos e dezimar a guerra que se alastrava entre ambos. Seriam lembrados por isso um dia.

—Vou buscar o jantar. —Luiza anunciou, se erguendo nas pernas esguias. —Quer mais alguma coisa? Vinho talvez?

Negou com a cabeça e abriu os olhos, encarando o teto de madeira escura. Sua liberdade estava chegando ao fim. Seus dias de garoto imprudente acabariam assim que uma aliança de ouro branco deslizasse pelo seu dedo. Não seria mais um garoto, não seria mais apenas Lohan contra o mundo. Teria de aceitar que Fenrys o seguiria para onde fosse, estariam ligados por um laço que não seria facilmente rompido. Teria uma companheira, uma que não conhecia. Mal sabia a cor dos seus olhos, se os seus cabelos seriam claros ou escuros. Seriam eles um bom casal?

Em um segundo se pegou imaginando se os lábios de Fenrys Elentya se encaixariam nos seus como se tivessem sido feitos um para o outro.

Soltou uma risada baixa e fechou os olhos. Antes que Luiza estivesse de volta ao quarto o sono lhe derrubou.

Não acordou antes do nascer do sol, quando jogou os lençóis para o lado e encarou a massa disforme sobre a segunda cama. Deixou uma bolsa cheia de moedas de ouro sobre a cômoda do quarto junto de um bilhete e saiu.

Lohan Halist cavalgava para o sul, para cumprir seu dever de sangue para com seu reino. Sua reputação de príncipe perfeito não cairia por terra tão facilmente assim. Não quando tinha tanta coisa em jogo.

Halist - A Canção das RosasOnde histórias criam vida. Descubra agora