Uso e abuso da ferramenta

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3 - Uso e abuso da ferramenta

Uso e abuso da ferramenta
A Teoria dos Quatro Temperamentos é um instrumento valioso para a
autocompreensão. Mas, como qualquer ferramenta, pode ser usada
incorretamente. De vez em quando, encontro pessoas que fizeram mau uso desse
conceito, prejudicando a si e a outros. Em geral, esse abuso ocorre nas formas
apresentadas a seguir:
Alguns estudiosos da personalidade têm externado vez ou outra o conceito,
aplicando-o indiscriminadamente. Não se contentando em apenas examinar e
guardar para si as conclusões, eles fornecem aos indivíduos, sem cuidado algum,
informações sobre seus temperamentos, delineando-lhes suas fraquezas
características. Já vi pessoas humilharem familiares e companheiros de trabalho
por apontar-lhes os traços desfavoráveis do temperamento e expor-lhes os
defeitos. Nas palavras do psicólogo dr. Henry Brandt: “Não há nudez que se
compare à nudez psicológica”.
A natureza humana nos induz à autoproteção, não apenas física, mas também
psicológica. O indivíduo que, de propósito, se expõe ao ridículo, revela um senso
deturpado de autopreservação emocional. Chego a pensar que tais pessoas
expõem seus defeitos insignificantes usando-os como escudo para esconder os
defeitos maiores.
Nenhum cristão cheio do Espírito Santo invadiria o íntimo de outra pessoa,
expondo-a ao ridículo psicológico. Poderá ser muito engraçado fazer isso para
criar um clima de bom humor em uma reunião, mas, por outro lado, poderá ser
cruel e prejudicial para o atingido. Qualquer coisa que não seja benigna não
provém do amor, e a Bíblia nos ensina a “falar a verdade em amor” (Ef 4:15). O
Espírito Santo, que nos habita, quer que os cristãos “amem os irmãos”, dando-
lhes a proteção emocional que almejamos também para nós.
Mesmo no caso de a análise de temperamento não ser feita em público, ela
poderá tornar-se um hábito nocivo. Uma jovem confidenciou-me que rejeitara
um possível pretendente porque o considerava uma mistura indesejável de
temperamentos. Não existe a tal mistura indesejável! Nenhum é “melhor” que
outro, e o simples temperamento não é a garantia de determinadas atitudes. Um
patrão, por exemplo, poderia rejeitar um empregado capaz, concluindo
equivocadamente que sua personalidade o torna inapto para o cargo. Nesse caso,
nem a jovem casadoura, nem o empregador deram oportunidade à influência
transformadora do Espírito Santo.
A Teoria dos Quatro Temperamentos é apenas uma ferramenta terapêutica.
Com os outros ou consigo mesmo, deve ser usada sempre com parcimônia,
flexibilidade e de forma construtiva. Uma boa regra é: não se ponha a analisar o
temperamento de uma pessoa, a não ser que isso contribua para melhorar seu
relacionamento com ela, e não diga a uma pessoa qual o temperamento que ela possui, a não ser que esta lhe pergunte diretamente.
Outro erro no uso da teoria dos temperamentos é utilizá-la como desculpa por
seu mau comportamento. Frequentemente as pessoas me dizem: “Faço isso
porque é esse meu gênio e não consigo mudá-lo”. Esse engano, esteja certo, foi
inspirado pelo diabo. Além disso, demonstra incredulidade em Deus! Ou o texto
de Filipenses 4:13 é verdade ou não é: “Tudo posso naquele que me fortalece”.
Se for mentira, não poderemos confiar na Palavra de Deus. Mas, como a Bíblia é
verdadeira, podemos confiar que Deus realmente supre todas as nossas
necessidades. O temperamento pode tão somente explicar nosso comportamento,
mas justificá-lo, nunca! É impressionante o número de pessoas que o usam como
desculpa. Note alguns comentários feitos na sala de aconselhamento:
Um homem sanguíneo, depois de manter um caso amoroso extraconjugal,
confessou: “Sei que eu não deveria ter feito isso, mas tenho o temperamento
sanguíneo e sou fraco quando exposto a tentações sexuais”. Isso é uma maneira
covarde de dizer: “A culpa é de Deus, pois foi ele que me criou assim!”.
Depois que disseram a um colérico que seus acessos de raiva destruíram sua
enorme capacidade como professor de classe bíblica e obreiro cristão, ele
declarou: “Sou mesmo estourado. Sempre fui. Quando as pessoas me
contrariam, falo o que me vem à cabeça!”. É um comentário tipicamente
colérico, mas não é a resposta de um colérico controlado pelo Espírito Santo.
Uma senhora de temperamento melancólico veio a minha clínica de
aconselhamento depois que seu marido a abandonou com três crianças. Ele a
abandonou não porque tivesse outra mulher em sua vida — simplesmente sentiu-
se compelido a ir embora. E, ao partir, disse: “Como nada do que faço lhe
agrada, resolvi sair de sua vida e deixar que encontre alguém que não tenha
tantos defeitos quanto eu”. Em lágrimas, essa mulher confessou: “Amo meu
marido e não era minha intenção apontar seus defeitos a toda hora, mas sou
perfeccionista, e ele é muito relaxado. O fato é que se erra tanto em pensar
quanto em dizer alguma coisa, e eu sempre fiz questão de apontar todos os erros
dele; não conseguia conter-me. Resultado: acabei pagando um preço muito alto
por manter essa fixação um tanto egoísta, você não acha?”.
Um fleumático cuja esposa, desesperada, finalmente o convencera a buscar
aconselhamento admitiu que construíra uma câmara de som para sua psique e
entrava nela cada vez que a esposa estava por perto. Ele era razoavelmente
atencioso com as pessoas, mas em casa era como “uma pedra”. A companheira,
de gênio alegre e vivaz, achava aquilo intolerável. O marido dizia: “Não me
exalto; não gosto de briguinhas e confusões”. Com essa atitude assumia a
maneira mais eficiente de produzir úlceras, não só na esposa, como também em
si próprio. Escapar da realidade, protegendo-se atrás de um muro de silêncio
construído por ele mesmo, não é uma atitude compatível com o papel de
liderança que deve ser exercido por um pai e marido no lar.
Esses são exemplos de desculpas usadas para justificar um temperamento
egocêntrico. Pouco ou nada se pode fazer, até que a pessoa esteja pronta a
reconhecer que tem um problema. Em vez de culpar o temperamento por suas
aberrações de comportamento, o indivíduo deve reconhecer seus defeitos natos e
permitir que o Espírito Santo os modifique. Os atos refletem não apenas o caráter, mas também os costumes mais significativos. A personalidade nos
encaminha para um padrão de conduta, o costume perpetua e reforça esse
comportamento. O cristão não é escravo do hábito! Os hábitos — mesmo os mais
arraigados na vida de uma pessoa — podem ser modificados pela fonte divina de
poder que habita no crente.
SAIBA DISCERNIR SEU TEMPERAMENTO
Só lhe será possível usar bem a teoria quando você souber discernir seu tipo de
temperamento. Para um estudo mais extenso das particularidades de cada um
sugiro a leitura de meu primeiro livro, Temperamento controlado pelo Espírito.
Após examinar minuciosamente o gráfico dos temperamentos, você poderá
descobrir suas características predominantes fazendo uma lista das que se
destacam em sua personalidade. Observe primeiro seus pontos fortes — as
qualidades —, porque é mais fácil ser objetivo quanto a seus atributos positivos do
que quanto aos negativos. Uma vez determinadas as virtudes, procure encontrar
as fraquezas correspondentes. Muitas pessoas possuem uma tendência a mudar
de ideia quando examinam seus defeitos, mas é melhor resistir a essa tentação e
enfrentar sua personalidade com realismo.

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