Revirei os olhos ouvindo Felipa falar. A menina insuportável já estava tagarelando a 10 minutos, tentando chamar a atenção do professor com aquele monte de baboseira que saia de sua boca. Olhei para Sina do meu lado, que estava dormindo sobre a mão, com a boca aberta. A cutuquei.
- Não vou aguentar essa chata sozinha, pode acordar.
Ela me olha de cara feia, resmungando qualquer coisa. Olho para a cara do professor e vejo que ele está com a mesma expressão que eu estou. Quase que todo o resto da sala estava olhando para a menina como se ela fosse uma deusa.
A deusa da chatice, só se for.
Fábio, o professor, cansa de ouvir aquele monte de palavras jogadas que sai da boca de Felipa e a interrompe.
- Obrigada pelas observações, Felipa. Agora vamos voltar ao trabalho.
Quase beijo seus pés em agradecimento. Tudo bem que filosofia não era nada a minha praia, mas já era algumas milhares de vezes melhor do que ouvir Felipa.
O professor começou a falar sobre Platão e o mito da caverna e eu automaticamente quis chorar. Não me levem a mal, não tenho nada contra Platão, até o acho importante, mas eu odiava a matéria com todas as minhas forças.
Desligo minha mente da aula, vagando por pensamentos inúteis e sem importância. O que eu mais queria era que essa aula acabasse e eu pudesse ir pra casa.
(...)
- Meu Deus do céu, eu não aguentava mais! - Sina resmunga do meu lado quando o sinal toca. Apenas concordo com a cabeça, entediada demais para continuar com o diálogo. Filosofia tirava toda a vontade do meu ser.
Vejo uma menina, mais nova que eu, passar apressada por nós. Reconheço, automaticamente acelerando o passo.
Sina nem protesta, já está acostumada. Mas posso sentir que ela revira os olhos.
Chego ao portão da escola a tempo de ver a kombi amarela. Encostado nela, está o motivo dos meus suspiros desajustados, com os cabelos quase loiros e um pouco abaixo da orelha. A sua roupa parece um pouco maior do que realmente deveria ser, mas isso só lhe traz mais charme. O corpo relaxado e jogado despojadamente contra o veículo. A menina loira, que acredito ser sua irmã, o abraça apertado. Posso ver que o menino abriu um largo sorriso, erguendo - a um pouco do chão. Imediatamente penso que eu queria estar no lugar dela.
Os dois se desvencilham, a menina indo para o carona. Antes de seguir para o motorista, o menino, que pelo que podem perceber eu não sei o nome, segue com os olhos em minha direção. Posso notar sua expressão se tornar surpresa, mas de maneira suave. Sinto meu coração errar uma batida quando um sorriso brota em seus lábios. Um sorriso lindo, que mesmo de longe, sei que possui dentes alinhados e brancos. Sua irmã percebe seu olhar, acompanhando - o. Quando ela me encontra, abre um largo sorriso, acenando. Aceno de volta, tendo consciência que ela com certeza percebeu que eu estava ali só para ver seu irmão. Minhas bochechas esquentam quase que de imediato e eu só quero um buraco pra me enfiar agora. Quando a kombi vai embora, viro para Sina que está me olhando com uma cara engraçada.
- Ai Sina, que vergonha! Eles perceberam que eu estava encarando.
- Claro né, Any, você estava secando tanto o menino que até eu fiquei seca.
Mostro a língua para ela, sabendo que a maldita tem razão. Eu precisava, urgentemente, ser mais discreta.
Depois do grandessíssimo mico que eu me fiz o favor de pagar, me despeço de Sina e vou caminhando até a minha bicicleta que estava do outro lado da rua.
A minha bicicleta, por pura coincidência, também é amarela. Eu simplesmente amava a cor, e acho que o fato do tal menino gostar também, foi o que chamou primeiro a minha intenção. Claro que também foi por causa da kombi. Acho que nunca tinha conhecido alguém, jovem, que tivesse uma.
Chego em casa em pouco menos de 10 minutos. Estaciono a bicicleta na garagem e subo para meu quarto, sabendo que minha mãe a essa hora, ainda estava no trabalho.
Subo na cama com o notebook em mãos, preparada para tentar, mais uma vez, achar qualquer rede social do menino.
Tentava a alguns dias e era sempre inútil, afinal de contas, eu não sabia o seu nome e nem o nome de sua irmã.
Depois de alguns minutos, desisto mais uma vez. Eu nunca ia conseguir achar sem saber o nome de nenhum dos dois.
Deito de barriga pra cima, olhando meu teto decorado pela "Amendoeira em flor" de Vicent Van Gogh que eu mesma tinha pintado.
Meus pensamentos vão longe, e vão pra onde sempre iam no último mês.
No menino da kombi amarela.
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O Garoto da Kombi Amarela
Teen FictionO garoto da kombi amarela sempre chamara a atenção de Any. Com seu estilo indie/rock e suas músicas de letras bonitas, ele era um ponto curioso no pacato dia escolar. Quando o menino chegava para buscar a irmã no colégio de Any, ela sentia como se...