Capítulo V

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 Conforme trabalhava, Mattew questionava sobre a lógica dos piratas como a Capitã Sirene e o pai de Baehrius. Seu pai, por mais bem sucedido que fosse, visitava-o com boa frequência. Não gostava muito de suas visitas cheias de presentes vazios porém não imaginava não tê-lo ou pior; Nunca conhecê-lo. 

 As caixas de peixes e outros consumos marinhos costumavam pesar e feder desde a coleta até a limpeza. Com uma boa conversa com seu chefe, o rapaz garantiu a Kateryn um bico como vendedora e isto ela fazia bem, ainda mais depois de arrumada. Não precisaria lidar com o trabalho mais sujo e tinha comida e cama todas as noites.

 Ao fim do dia, todos podiam voltar para suas casas. Os jovens trabalhadores do porto seguiram o caminho até o ponto de encontro enquanto conversavam sobre seu dia e Kate parecia particularmente feliz e agradecida. Baehrius esperava já sem paciência, sentado a porta do galpão. Ver seus dois novos amigos caminhando juntos lhe angustiou um pouco, sentimento muito passageiro, ainda mais após Kate apresentar seu novo vestido a ele.

 — Vê, tem peixes costurados em todo lugar! — Dizia enquanto girava de um lado para outro fazendo sua saia rodar. Baehrius, ainda sentado, só podia admirá-la e não conseguia falar no momento. Inocentemente, ela riu da situação.

 — Baehrius, ajuda aqui! — Matt quebrava o clima numa voz trovejante. Se posicionava num dos lados da enorme porta do galpão e indicava o outro apoio com a cabeça para que o rapaz lhe ajudasse a abri-la como na outra noite. Atendeu de prontidão ao susto, provocando mais risos da garota que já não conseguia se controlar.

 — Peguem comida e algumas coisas úteis, como lanternas e mantos. Vamos precisar. — Parecia animado e soava como um capitão com sua bandana na cabeça.  Abriu um baú aparentemente abandonado onde pousavam quatro espadas curtas e enferrujadas e um revolver velho. 

 — Melhor que nada. — Baehrius observou.

 — Já me virei muito bem com nada — Kate falava dessa vez — Mas faço bom uso disso também.

 Agarrou a mais curva das lâminas que acompanhava uma empunhadura macia de couro e um pomo redondo.

 — São duas pra cada um. O revolver é meu — Mattew agarrou uma sacola de pano e pequenas coisas metálicas fizeram barulho dentro. — Minha espada está no Navio, agora vamos.

  Baehrius e Kateryn se entreolhavam curiosos e animados sobre o que Mattew planejava. Apressaram-se para fechar o galpão novamente e seguir até o cais onde uma simplória canoa os esperavam.

 — Tudo isso pra um passeio de canoa? — Kate parecia decepcionada.

 — Vamos passear mas não nesse barco. Vamos naquele ali. — Matt apontou para a névoa noturna no meio do mar que levemente se esvaia, revelando um enorme navio encouraçado. — Apresento-lhes minha Muralha Marítima.

 Baehrius já a viu antes, porém, parecia muito maior naquele momento. Já Kate poupou suas palavras. Seus olhos brilhavam em reposta ao vislumbre desta bela embarcação.

 A Muralha Marítima era o maior navio pirata da costa desde que o Encouraçado de Saraschia entrou em alto mar. Seu casco era reforçado e subia muito acima do convés sendo o motivo do seu nome. Além da fortaleza de madeira e metal, suas velas eram largas e mesmo com tanto peso, viajava em boa velocidade se em influência de bons ventos. Encostaram e finalmente subiram a bordo do castelo flutuante. Matt estava apressado e arrumou todos os preparativos rapidamente. O enorme casco impedia boa parte da luz da lua iluminar o convés, fazendo as lanternas trazidas do galpão bem úteis.

 — Baehrius, levante a âncora. Kateryn, abaixe as velas. Vamos ver se vocês sabem navegar como piratas!

 O leme ficava numa plataforma semelhante a uma torre e Mattew era imponente no comando do navio. Imediatamente ao soltar as velas, A Muralha reagia ao vento forte da noite. Com a âncora devidamente erguida e travada era possível sentir a flutuação abaixo de seus pés. O barco deslizava por entre as ondas e a terra ficava cada vez mais distante. Sentia-se uma brisa agradável no convés mas, nas partes altas, o vento soprava ferozmente. Mattew agarrou sua bandana que estava prestes a voar, sorrindo como nunca. Kate também sorria e gargalhava atoa com Baehrius alegrando-se mais com sua amiga do que com a experiência. 

 — Estou convencendo os rapazes do porto a se juntarem a mim. Falta pouco para uma tripulação completa, ainda mais se vocês entrarem também. — O rapaz mais velho navegava com destreza e realmente tinha jeito de capitão. 

 — Aceito, até deixarmos de ser amigos para sermos rivais no mar. — Baehrius gostou da ideia mas pensar no seu barco ainda lhe doía o peito. Pousou a mão sobre o ombro de Mattew que permitiu que ele tomasse o controle do leme, ensinando-lhe o que fazer.

 Kateryn adentrou os aposentos do navio e a maioria só continha caixotes de alimentos secos e conservas. A cabine do capitão era mais destacável: Bem decorada como um quarto de luxo e  isso a agradava muito. Além de grandes baús e belos quadros, numa parede estava fixado um alfanje reluzente com muitos detalhes encravados. 

 — Tudo é presente de meu pai mas acho que nunca dei o valor que deveria. — Mattew apareceu repentinamente na porta, apoiando-se na entrada. — Ele mesmo me recomendou a não acostumar com a riqueza, então decidi seguir seu conselho. 

 — Mas tudo é tão bonito, Matt... — Kate observou cada quadro com atenção, tateando as nuances da tinta seca — Seu pai é um homem generoso... nem todos os piratas dão essa atenção aos filhos, sabia?

  Mattew entrou na cabine passando por Kate e sentou em sua mesa feita de madeira clara.

 — Engano teu achar que isso é generosidade ou que ele realmente se importe comigo. Sinto-me tão órfão quanto vocês. — Agarrou um candelabro da mesa, adornado em prata e pedras brilhantes. — Nem todo ouro do mundo compra o sentimento de ter um pai de verdade.

 — Ao menos ele lembra de ti, ao menos ele sabe seu nome. Você mesmo disse que sou tão filha de Sirene como qualquer outro pirata. — Caminhou enquanto falava, agora admirando a lâmina na parede. — Entre ela e todo o ouro desses mares, eu não pensaria duas vezes em trocar algo que eu nunca tive. — Virou seu olhar para encará-lo por cima de seu ombro. — E não estou falando do ouro.

  Mattew decidiu ficar calado e Kate sentou-se na cadeira do capitão. Quebrando o silêncio, Baehrius veio correndo a cabine, ofegante e gritando: 

  — A-Acho que vi um barco vindo! — Retomou o fôlego numa pausa — E era grande! 

  — Mas quem poderia... — Mattew foi interrompido por um estrondo.

 Se não fosse pelas paredes, haveria um buraco no convés. Estavam sendo atacados!

Um Conto Sobre o Mar, os Barcos Sobre Ele e os Homens Sobre AmbosWhere stories live. Discover now