[Capítulo 5] Esteja sempre atento às pessoas a sua volta.

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Levou quase duas horas até que eu finalmente perdesse um pouco da desconfiança, o que era surpreendente. Eu não confiava em ninguém.

Mesmo tendo passado da meia-noite, o restaurante permanecia movimentado. Scott e eu comparávamos nossas vidas: ele sempre tivera muito dinheiro, enquanto eu tentava roubar alguns trocados de minhas responsáveis no orfanato, já a desafeição delas pela minha pessoa fazia "esquecer" de preparar meu lanche.

— Mas ainda não entendo — comentei, depois de algum tempo —, se você sempre teve tanto dinheiro, por que virar um assassino? Quer dizer, se você quisesse matar alguém, podia só contratar uma pessoa.

Ele sorriu.

— Minha história não é tão simples.

Curioso. Outras pessoas costumavam forçar um ar de mistério, algo que as fizessem parecer mais do que realmente eram, mas ele era surpreendentemente natural.

— E qual é a sua história? —Perguntei.

Primeiro ele riu, sútil. Fez uma pausa, o olhar perdido por um breve momento.

— Quinze anos, eu estava voltando para casa a pé. Uma garota de, não sei, doze anos talvez, foi encurralada por um homem mais velho num beco. Eu a defendi e acabamos lutando. Quando me dei conta, ele estava morto.

"Fui sequestrado no dia seguinte, depois da aula. Dois homens me vendaram até me jogarem num quarto vazio. Consegui fugir, eles estavam esperando fora da casa. Disseram que viram potencial em mim e resolveram testar minhas habilidades. Pediram para que eu matasse outro homem e eu obviamente recusei, mas não era como se houvesse muitas opções. Era outro estuprador, então não me senti realmente mal. Depois disso, outros casos começaram a aparecer e o lucro era bom.".

Acredito que eu tenha ficado muito quieta após ter ouvido sobre seu passado, porque logo as expressões de nostalgia passaram para curiosidade e diversão.

— No que está pensando?

— Eu tenho que admitir... Estou sem palavras. Quer dizer, quem diria que alguém como você se tornaria um assassino.

— Alguém como eu? — Perguntou, surpreso.

— Ah, por favor, não faça essa cara. Veja, um garoto rico, provavelmente com uma boa família e uma vida que todos sonham em ter... Abandona tudo para matar pessoas.

— Se você quer mesmo saber, eu não tive muita coisa para abandonar. — Estava mais áspero que no início.

Ele bebeu um gole d'água. Havíamos dispensado o vinho horas atrás, já que nenhum de nós queríamos perder a sanidade no final da noite.

Ensaiei uma nova pergunta, mas ele pareceu ler meus pensamentos.

 Meus pais estão mortos, Charlotte, assim como todos os outros membros da minha família. Não há ninguém vivo, ao menos não que eu saiba, além de mim.

Fiquei brevemente chocada com a naturalidade em falar da família morta. Senti seu humor mudar de repente. Não sabia se era raiva ou desinteresse pelo assunto. Talvez não gostasse de falar sobre, ou apenas estivesse cansado, afinal, já era tarde.

Os minutos seguintes foram puro silêncio.

— Desculpe... — Falei depois de algum tempo —...Acho que eu não devia ter comentado sobre isso...

Ele permaneceu em silêncio, seu olhar era vazio. Perguntava-me se ele realmente havia me ouvido.

Ficamos assim por longos e tortuosos dez minutos, até que ele se manifestou, ainda com sua expressão um tanto perdida.

Caminho de Sangue e PólvoraOnde histórias criam vida. Descubra agora