Todos os dias quando o choro toma conta da minha cabeça, quando meus pensamentos se perdem na escuridão do meu vazio e quando a dor parece não ter fim, lá está ela... A morte sempre estende os braços até mim.
E os braços dela são tão acolhedores, sim... O canto de ninar feito especialmente para repousar meu corpo inerte, gelado e miserável soa tão bem em meus ouvidos. A doce melodia me diz que tenho saída, que todo desconforto e incômodo que causo seriam facilmente resolvidos. Ela me parece o remédio mais eficaz contra a minha alma moribunda.
Ao contrário da vida, ela não me cobra, não tenta me dizer como devo superar a mágoa que murchou todo o fruto da vivacidade em mim, a morte não diz que minhas súplicas são ignoráveis, não mesmo... Ela me deleita com a possibilidade de deixar tudo para trás e seguir com aquela que foi-me designada desde o nascer.
Porém, às vezes ainda sinto outro canto de ninar. Com menos tons escuros, manso, som que me tira do outro colo e diz "Venha preparar biscoitos comigo para depois do jantar..." Como uma mãe que se preocupa com os filhos retornarem para casa, que passa noites em claro quando estão doentes, que oferece o ombro quando estes precisam desabar. É sobre isso: o outro lado também me parece interessante...
E é nessa hora que despenco no chão quebradiço, no fio da meada entre dois abismos: o da certeza e final, ou o da incerteza e continuidade. O suicídio me parece sim tentador, muitas das vezes ele se apresenta como a última chama de uma caixa de fósforo que deixei ao lado da única vela, minha vida. Mas ao mesmo tempo essa vida parece lutar por mim, parece ser a vela que resiste a apagar, como se eu tivesse tempo de correr e encontrar outro lugar com maior claridade. Sim, a escuridão sempre virá, mas depois dela logicamente há luz.
Esse sentimento me consome, a dúvida. É ela que mais dói, dilacera. Gostaria eu de saber qual caminho seguir, porque assim não me sentiria infiel com as minhas duas amantes.
Quero pertencer a alguma delas.
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Não conte a ninguém
Storie breviSe alguém tomasse coragem e expusesse toda a podridão da carne humana, tu aguentarias? Manterias Segredo? Se fosses convidado a entrar na cova mais profunda da mente, aceitaria? Se não, sinto em dizer, caro leitor: és tão pequeno. Se sim, tenho boas...