Lembranças da infância iam passando como cenas de sua vida!
Lembrava-se da escada alta, imponente. Da cozinha onde a mãe sempre estava fazendo doces, cozinhando. E apesar de sempre sorridente, sua mãe, trazia uma tristeza indefinida, que ela não conseguia entender. Depois da cozinha havia uma sala, quase vazia, com alguns bancos compridos e uma mesa, e retratos antigos. E na sala havia a entrada para os dois quartos, o de Lya e Zazá, a esquerda, com apenas uma cama de casal. E o de seus pais, também com uma cama de casal. Que escondia segredos perigosos e melancólicos. E da sala também podia-se passar a vendinha, onde o pai de Lya sempre estava a fazer contas. E ele escondia algum segredo também. As vezes ela observava-o. Ele ficava horas a fio, sentado, pensativo, olhando o nada. E vez ou outra, aparecia um freguês, em busca de querosene para lamparina, sal, açúcar. E outras coisas miúdas, sem trazer um tostão, sempre no fiado. E ele atendia com toda paciência. Mas a noite apareciam muitos compadres e vizinhos, que vinham para ouvir jogo no radinho de pilha. E também para tomar uma pinga e papear um pouco.
Lya brincava no quintal pequeno. Mas que aos seus olhos era enorme. E ali no seu quintal, distante uns cinqüenta metros do rio Itapemirim, ali chamado de rio Pardo. Havia um enorme pé de "maria preta", uma árvore alta, de tronco grosso. Que dava umas frutinhas muito parecidas com jabuticaba, e que não sabiam o nome, chamando-a de maria preta E que ela só podia chupar, quando alguém as tirava com um bambu, pois o pé era muito alto. Na frente da casa havia um canteirinho de flores, feito por sua mãe. Com algumas folhagens e muitos cravos amarelos e vermelhos. E uma estrada bem grande passava na frente de sua casa. Era a estrada que vinha de Muniz Freire e ia para Iúna. E a casa de Lya ficava quase na divisa dos dois municípios, na localidade de Terra Corrida.
Seguindo pela estrada, sentido Muniz freire, uns cinqüenta metros depois da casa de Lya. Havia uma igreja, onde ela ia sempre aos domingos e dia de reza. E também brincar no coreto. E que no mês de maio era uma festa. Vestia de anjo, e sempre ganhavam prendas como, mexericas, balas, doces, etc. formavam-se imensas rodas, de rapazes e moças, que brincavam e flertavam, em inocentes olhares. E os "anjinhos" além de aumentar as rodas, serviam para atrapalhar os possíveis namoros.
A igreja ficava do lado esquerdo, e ao lado direito havia duas casas pequenas, onde moraram, seus avós Cecília e Eugenio, a Tia Lita, a professora, os avós maternos Elmira e Durval, e muitas outras pessoas. E atrás da casa havia um enorme pe de mexerica, que Lya adorava subir e pegar as maiores e mais suculentas. Logo depois da igreja, havia uma ponte, sobre um ribeirãozinho, onde Lya gostava de ver os peixinhos nadando. Depois do lado direto um terreirão enorme, onde se secava café. E do seu lado uma pequena escolinha, onde Lya estudava com a irmã Zazá. Depois do colégio, havia um lugar, que chamavam de quintal. Cheio de frutas e com uma pequena casinha. E onde Lya, Zazá, Luzlu, Lene, Caco e Nana adoravam brincar e pegar frutas: laranjas, mangas, goiabas, araçás, graviolas, biribas, ameixas, bananas. Frutas que eram café, almoço, lanche. E nem se preocupavam com a hora de voltar pra casa. E o rio Pardo passava preguiçosamente bem ali. E elas chegavam a lavar as mãozinhas nas suas águas. Sem atinar no perigo que corriam. E bem distante uns quilômetros havia a casa da viúva negra, da qual todos morriam de medo!
Perto da casa de Lya do outro lado da estrada, havia um moinho, bem em baixo do morrinho da igreja. Que o pai dela tomava conta. E lá de cima vinha a água que eles bebiam. Que era a força do moinho e também encanada pra eles. E acompanhando a estrada no sentido Iúna agora. Distante uns cem metros havia uma grande ponte com dois caminhos em sentido contrários. Descendo margeando o ria, havia a casa do senhor Francisco Vial e da dona Cenira, mulher de coração bondoso. Que sempre dava bolo as crianças quando apareciam lá pra brincar. Era uma casa em meio a grandes pedras redondas, com um belo alpendre. Continuando a trilhazinha as margens do Pardo, chegava-se a um regaço, onde havia um pé de "coquinho meleca" ao sopé da montanha e de um ribeirão. Onde ela adorava catar os coquinhos, chupá-los, depois quebrar e comer. Continuando a margear o rio, sentido em que ele corria havia a casa do senhor Guilherme. Pai da professora Madalena e da Margarida, com quem ela brincava de boneca. E onde comia banana cozida para os porcos com melado. Hum, Delicioso! Se continuassem o caminho, subiam a montanha e chegariam a casa das moças mais briguentas do lugar. Mas que até eram amigas de Lya e Zazá. Talvez a briga era por ciúmes, e por querer brincar com elas, e terem sua preferência. Lá as meninas se divertiam. Comiam muito melado na casa da dona Julinha. E brincavam no paiol com os ratinhos, eca!
Voltando a ponte, se caminhássemos para o lado contrário, subindo a margem do rio Pardo, encontraríamos muitas outras casas. A primeira era do senhor Custódio. Que tinha duas moças bonitas e o Marquinho. Depois a da dona Merci e do senhor Antonio. Pais da Nilcéia e Elenice, amigas de Lya e Zazá. Lá comiam muitas amoras de árvore. Mais adiante a casa do senhor João Debrande, onde havia muitos bichos, e lindos pavões. E se seguíssemos bem mais adiante em uma fazendinha com um enorme terreirão bem no meio da mata, morava o ciganinho com sua família. Um dia apareceu em terra corrida ums ciganos, muito pobres. E uma das ciganas teve dois filhos gêmeos. Do qual um morreu e outro foi entregue pra essa família criar. Muito triste, mais também muito lindo. Pois o ciganinho foi muito bem cuidado. Mas seus traços característicos o distinguiam dos outros meninos. Adorava montar os cavalos, e seu jeito de falar, os cabelos cumpridos, as brincadeiras.
Voltemos a ponde, agora sem atravessá-lo, vamos sentido Iúna, subindo as margens do rio Pardo. Andando-se uns dez minutos, havia um campo de futebol, e onde muitas vezes Lya e Zazá ia, com a tia Nite. Para plantarem arroz as margens do rio. Mais adiante, a casa da senhora Rita, e pertinho a do gaguinho. Eles eram plantadores de tomate, e pessoas muito boas. Eram irmãos do menino gaguinho também a Edilene e o Lúcio. Um pouco mais a frente também tinha a casa da Célia, que tinha três filhas. A Rita, Kátia e Ilda. E perto da casa delas havia também um barreiro. Com muito barro branco, molinho, de onde minava água. E de onde todos tiravam aquele barro branquinho como neve, para passar no fogão de lenha. E que Lya e Zazá, se divertiam com o barro. E iam pra casa embarreadas e brancas!
Voltemos um pouquinho ao campo. Na estrada sentido Iúna, antes um pouquinho do campo e sentido contrário ao campo. Ou seja, lado direito havia uma estrada. Que era a mais percorrida por Lya. Pois essa estrada levava a casa de um senhor, que fora muito importante na vida dela. Subia-se um pedaço de chão bem a pique, depois se passava por uma matinha. Havia uma descidinha pra chegar a casa da madrinha Etelvina. Algumas casas. E no pé da serra, em meio a cafezais uma casa, que pra Lya era encantada! E onde vivera lindos sonhos. Era a casa do senhor Francisco Mariano e de dona Zulmira. Lya era considerada como uma filha caçula, adotiva e muito amada por aquela família. Que considerava seu segundo lar.
E assim era o pequeno mundo de Lya, encantado, mágico e feliz!
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Contos e Cronicas
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