#3 APOSTA

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S H A N E

Março.

Passei algumas semanas sentindo algo que jamais pensei que fosse sentir, constrangimento por um erro dentro de campo. As pessoas no campus pareciam me fuzilar com seus olhares como se a culpa tivesse sido completamente minha. Eu não os julgava, afinal, aquilo não deveria ter acontecido. Mas, a defesa toda cometeu uma série de erros nos quais eu não tive participação e que se talvez não tivessem acontecido, nós teríamos ganhado o jogo.

Porém, desde que a Nixxie publicou minhas fotos, as coisas começaram a mudar. Foi como se o que aconteceu no Steel Bowl tivesse sido esquecido – pelo menos em partes –, para dar lugar a um sentimento de curiosidade. As conversas passaram de "Shane, por que você fez aquilo?" para "Eu não acredito que você saiu na campanha da Nixxie, como foi a experiência?".

Às vezes a única coisa que eu pensava saber fazer era jogar. Já não conseguia mais absorver o que era passado na sala de aula e o único culpado por isso era o futebol. Não o esporte em si ou as pancadas que eu recebia na cabeça que me faziam perder alguns neurônios, como diria minha avó. O problema estava na preocupação que envolvia meu futuro no esporte, eu não queria viver o resto da minha vida trabalhando em um escritório como meu curso sugeria que fosse, eu queria jogar, queria estar na liga profissional e ser lembrado por ser um bom jogador. Mas esse não era só o meu sonho, envolvia muitos outros jogadores tão bons quanto eu para concorrer às vagas.

— Shane. — Anna soprou em meu ouvido me fazendo assustar.

— O que foi? — Virei para trás encontrando a morena rindo de mim. — Anda, o que você quer? — insisti enquanto ela permanecia rindo ao invés de falar.

— Está com a cabeça nas nuvens? — Arqueou uma de suas sobrancelhas. — Meenely pediu para você responder ele. — Balançou o celular em sua mão.

— Ele parece uma criança afobada — resmunguei. — Já vou responder. — Voltei a olhar para frente como estava antes de Anna me chamar, mas me curvei para pegar o celular dentro da mochila jogada no chão.

Ryan Meenely
Você tem aula do que agora?
Vamos sair para beber alguma coisa
Lewis
Onde você está?

Shane Lewis
Saindo da sala. Vou descer no elevador do bloco B.

Juntei todas as minhas coisas dentro da mochila e usei Meenely querendo se embriagar às dez da manhã como um pretexto para ir embora da aula. Anna balançou a cabeça negativamente ao me ver levantar com minhas coisas em mãos, ela sempre se preocupava com o que eu fazia ou deixava de fazer.

Eu sabia que precisava focar mais nas coisas.

Quando encontrei Meenely apoiado na parede de tijolos marrons antigos repensei no que estava fazendo, já era a terceira aula de economia monetária e financeira que eu não absorvia conteúdo algum por ir embora ou por estar com a cabeça em qualquer lugar que não fosse a voz do Sr. Peterson falando sem parar.

— Ninguém consegue ser o jogador e o aluno perfeito ao mesmo tempo, não é mesmo? — caçoou.

— O pior é você que não consegue ser nenhum dos dois. — Soquei seu ombro.

— Você tem que bater nos outros quarterbacks, não em mim. — Devolveu o soco, começando a andar na direção oposta ao prédio.

— Você é frouxo, Meenely. — falei com firmeza fazendo-o apenas bufar.

Ele sabia que era um bom jogador, mas Ryan tinha pontos que o derrubavam. Sua resistência era um deles. Eu não gostava de destacar os problemas dos meus irmãos de time, não era correto, mas Meenely praticamente implorava para que todos fossemos tão idiotas quanto ele.

Fomos até seu dormitório. Ryan não dividia com ninguém, era apenas ele, suas bebidas e às vezes as drogas. Meenely sempre conseguiu se sair bem em todos os testes e dopings, mas isso era um caso à parte.

— Você não vai mais pra aula? — Me joguei no sofá.

— Não. — Deu de ombros. — Eu vou pra liga profissional de qualquer forma — disse com firmeza na voz. Meenely se apoiou na porta da geladeira aberta. — Cerveja?

— Pode ser. — Estiquei meu braço para pegar o controle na outra ponta do sofá. — Você já parou pra pensar que todos nós podemos não conseguir chegar lá? — questionei assim que ele voltou para a pequena sala e me entregou a cerveja. — Obrigado.

— Não, nunca parei pra pensar — Deu um gole na cerveja —, porque não vai acontecer, obviamente — riu com deboche.

Não disse mais nada. Apesar da minha vontade de tentar fazê-lo entrar no mundo real onde as coisas não aconteciam do jeito dele, me abstive. Aquele era o fantástico mundo da família Meenely onde tudo acontecia porque eles podiam pagar por qualquer coisa.

Ficamos em silêncio enquanto bebíamos, o único barulho na sala era da televisão ligada no noticiário esportivo e hora ou outra de alguma notificação nos celulares.

Chad Jones estava no enfoque do que William e Tristan discutiam, apesar dos meus pensamentos estarem uma completa bagunça, eu estava muito focado no que eles diziam sobre ele. Chad era um dos meus caras favoritos da da liga universitária. Ele não era um dos primeiros na cotação dos melhores times, mas com certeza conseguiria uma boa vaga. Suas estatísticas eram ótimas, mas havia pelo menos outros dez jogadores da mesma posição competindo pela mesma vaga de escolha de um bom time. Eu já tinha desencanado de pensar só na opção de ser escolhido por um time do nível do Boston Mustangs, ultimamente se qualquer um que acabasse a temporada com 16 derrotas e uma vitória me escolhesse eu estaria extremamente feliz.

Eu queria que chegasse a minha vez de estar no foco do draft, mas não me sentia preparado. Shane Lewis nunca deixou transparecer que tinha medo do seu futuro, mas eu tinha, e muito. O que me aterrorizava era o fato de saber que se eu não fosse draftado pra qualquer time, eu não teria o que fazer, afinal, eu não sabia fazer nada além de jogar.

— Você tem 50 dólares para me emprestar? — Ryan me despertou dos pensamentos sobre o futuro, ele estava com os olhos pregados na televisão. Eu ri assim que processei a pergunta, era bem cômica.

— Você me pedindo dinheiro? Não deveria ser ao contrário? — questionei ainda sem tirar a carteira do bolso.

— Meu pai bloqueou a minha conta — explicou se virando para mim. — Semana que vem eu te devolvo. — Inclinou sua cabeça para trás, suspirando.

— Tudo bem — dei de ombros e tirei a carteira do bolso do meu moletom. — Por que ele bloqueou sua conta? — Não me contive em fazer a pergunta.

— Ele acha que eu... — Ryan começou a explicação mas parou e levou sua mão até a minha carteira, tirando-a de minha mão — O que é isso, Lewis?

Meenely começou a puxar um cartão de dentro da minha carteira. Eu não tinha conseguido ligar os pontos porque nada de importante entrava naquela carteira, mas raciocinei assim que vi o papel branco perolado com letras bonitas em sua mão.

Katherine Cooper — leu o nome estampado na frente do cartão. — Eu não acredito nisso — riu.

— Não acredita no que, cara? — questionei tomando o cartão de sua mão. Peguei o dinheiro que Ryan pediu e joguei em cima da sua perna, colocando o cartão de visitas no meio das notas que sobraram na carteira.

— Você está realmente me perguntando? — colocou o dinheiro rapidamente em seu bolso. Meenely parecia irritado. — O que você quer com a irmã do Cooper?

— Nada — forcei a firmeza na voz, mas talvez se Ryan não fosse tão desligado perceberia que eu estava mentindo. Mesmo assim ele me olhava com uma das sobrancelhas arqueadas. — Vai se ferrar, Meenely. — Soquei seu joelho, bufando. — Foi um contato profissional, isso é normal — disse, mas ele continuava parecendo duvidar. Me irritei.

Unnecessary RoughnessOnde histórias criam vida. Descubra agora