4 | CARRIE, A ESTRANHA

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Meu humor havia decaído consideravelmente na última semana, acompanhando o maldito tempo chuvoso, que derrubava cada vez mais a temperatura em Cleveland.

Havia falado com meus pais na noite anterior e fingi um belíssimo sorriso para que soubessem que tudo estava em ordem. Mas depois de finalizar ambas ligações, meu psicológico voltara ao normal e eu pude olhar novamente para o mundo da pior maneira que conseguia. Eu estava bem em ficar mal. Não precisava de muito para manter o meu estado.

Encaminhava-me para a última aula de sexta-feira. Havia sido uma semana terrivelmente longa. Claro que a Literatura era maravilhosa, exceto as aulas básicas que eu preciava acompanhar obrigatoriamente durante os dois primeiros anos, cujos conteúdos eu já havia visto no Ensino Médio. Pelo menos podia usufruir um pouquinho do clima universitário ao lado de outros calouros igualmente desgostosos.

Eu tinha uma memória muito boa. Havia decorado minhas salas rapidamente, inclusive outros pontos importantes do prédio. A mesma memória, porém, relembrava meu cérebro a todo instante das últimas calamidades acontecidas. Era a merda no refeitório com Charlize Hancock, era a merda no jornal e era a merda no meu alojamento, a última desgraça que me assolara.

Nebraska Cobham, por mais que fosse menos insuportável do que os demais veteranos, ainda assim era chata para conviver. Ela era uma boa pessoa, mas suas manias, seu tom venenoso em qualquer assunto e sua vontade imensa de transar com um cara diferente a cada dia, levando para o seu quarto e não deixando ninguém dormir com os gemidos gritantes, eram o conjunto perfeito para me deixar estressada durante o ano.

Era incrível nosso dia a dia, mas não da maneira legal. Na realidade nada ali acontecia da maneira legal. Eu precisava encher minha cara, por mais que não estivesse acostumada. Final de semana estava batendo na porta e eu queria fugir da realidade, mas era difícil quando todas as festas do campus os veteranos exigentes estivessem lá para me atormentar.

Entrei apressada na aula, mas a professora não se encontrava na sala ainda. Sentei no meio das cadeirinhas macias dispostas, cada fileira mais alta que a outra e curvada para a enorme lousa a alguns metros dos alunos. O ar-condicionado estava gelado, mas não tanto quanto o clima exterior. Aproveitei para anotar o que já estava escrito na lousa antes que a professora chegasse.

Era a primeira vez que eu estava ali. A aula, Morfologia da Língua Inglesa, havia sido uma das optativas que me inscrevi. Não estava dentro do meu período ideal e eu estudaria com alguns alunos mais avançados, mas não me importava. Embora fosse tê-la novamente dali a poucos meses, preferia assisti-la agora. Era uma disciplina difícil segundo o pessoal do grupo do Facebook, mas também era uma disciplina que me interessava muito. Se tivesse uma boa nota, poderia pulá-la e partir para outras disciplinas ainda mais legais — uma boa troca dentro da minha cabeça.

Antes que pudesse depositar meu material sobre a mesa, um rapaz surgiu fazendo barulho e cumprimentando seus conhecidos. Levantei os olhos e encontrei Seth Ayde sentando justamente do meu lado. Seus olhos cor de gelo me fitaram com certa curiosidade, e eu não consegui evitar de devolver o gesto.

— Cumberbatch? — ele falou, baixinho. — Soube do incidente do jornal no início da semana. Espero que você esteja bem.

Falsifiquei o melhor dos sorrisos. Eu não queria pensar no jornal, tampouco nas consequências de não ter entrado. Pelo o que eu tinha ouvido no corredor, os membros do Talking to Hamish espalharam pela universidade acerca do meu desastre na tentativa de fazer parte do grupo. Eles inventaram uma situação sem cabimento, alegando que esperneei quando eles, "gentilmente", disseram que eu deveria estudar mais para participar do jornal.

As pessoas me olhavam estranho e cochichavam, mas a frequência diminuira com o passar dos dias. Infelizmente a minha fama estava sendo criada graças às mentiras daqueles babacas. Alguns já sabiam meu nome, assim como o irritante do Ayde, porém ninguém tinha coragem para me dizer algo. Era a primeira vez que falavam comigo sobre o boato do jornal.

Hello Darkness | Romance Lésbico (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora