DIA 3

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Keith estava literalmente morrendo de sede. Lance nadava a seu lado, falando sem parar desde que o sol nasceu.

"E é por isso, Quífi, que você nunca deve confiar em golfinhos". Ele estava esperando por uma risada, mas só teve silêncio. Desde de manhã estava tentando fazer o humano esquisito dar uma maldita risada, mas nenhuma das suas histórias idiotas funcionaram.

Ele tinha tentado de tudo (chegou até a apelar para piadas e trocadilhos), e Keith no máximo resmungava quando o trocadilho era idiota demais.

Porque Keith estava morrendo, e sabia disso.

"Nossa, Quífi, você é mesmo muito bom no jogo do silêncio".

Esse comentário foi a gota d'água.

"JURA, LANCE? TALVEZ SEJA PORQUE EU ESTOU MORRENDO DE FOME!"

Lance não respondeu (Quífi GRITOU com ele, e isso não é legal), mas, alguns segundos depois, liga os pontos e percebe PORQUE não tinha visto o humano idiota comer nada: ele não sabia caçar na água. Já tinha quase esquecido que humanos são seresinhos frágeis e totalmente dependentes das suas ferramentas esquisitas, das quais Qífi não tinha nenhuma.

Preocupado com a criaturinha terrestre, Lance mergulhou e, alguns minutos depois, voltou à superfície com dois peixes: um na mão e outro na boca. Ele se apoia na borda do bote e sobe a bordo.

O barco quase vira, e Keith se assusta. O sereio demora um pouco para se acomodar, e sem querer dá uma rabada na cara de Keith, que reclama mentalmente.

O humano parecia machucado. Por dentro E por fora. Lance se esforça para lembrar o máximo de coisas possível sobre humanos, e teme não conseguir ajudá-lo.

Depois de viver no mar por tantos anos a morte já é quase como uma velha irmã (cruel e sempre presente), assim como a implacável solidão. Ele reza aos deuses para que permitam que pelo menos ESSE pequeno laço dure mais do que algumas luas.

Ele usa as presas de monstros marinhos que mantinha amarradas na cintura (armas emergenciais, roubadas de uma carcaça) para abrir um dos peixes e corta-lo em pedaços, que entregava à Quífi.

Um pouco confuso, Keith pegou os pedaços de peixe cru e os comeu. Se sentia muito forte, simplesmente por conseguir mastigar e engolir aquilo.

Depois do banquete os dois voltaram a conversar, mas dessa vez sobre assuntos profundos e vazios; como o sentido da vida ou o que existe depois da morte.

Anoitece, e Lance volta para a água (e, novamente quase vira o barco). Keith adormece pela terceira vez no barco duro, mas dessa vez não tem nenhum pesadelo.

Um Conto Sobre o Mar (Klance)Onde histórias criam vida. Descubra agora