Capítulo Doze

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Acordei incrivelmente tonta. Era como se estivesse anestesiada. Meu corpo estava estranho. Me sentia inexplicavelmente violada.

Olhei em volta e vi um homem alto de jaleco branco. Ele tirou as luvas e jogou em uma lixeira próxima. Aparentemente eu estava em um hospital, mas não conseguia lembrar o porquê. Minha mente embaralhada não concluía nenhum raciocínio por completo.

— Onde estou? — Questionei e o homem sequer me olhou. Apenas deu a volta na maca e mexeu em alguma coisa.

— Você teve uma pequena complicação, mas já está tudo resolvido.

Sentei na maca ainda cambaleante. Olhei em volta e tudo parecia velho.

— Complicação de quê? O que eu tenho?

— Agora você não tem mais nada. — Ele respondeu saindo do quarto e então minha mãe entrou.

De repente eu tive um lampejo de memória. Lembrei de passar muito mal após tomar um suco. Coloquei as mãos na minha barriga, apreensiva.

— Não precisa colocar as mãos aí. Agora seu útero está tão oco quanto sua cabeça. — Ela zombou tranquilamente me deixando perplexa.

— O...o quê? — Gaguejei e ela ajeitou as mangas da própria blusa como se estivesse falando sobre compras de sapatos.

— Katherine, não prolongue as coisas. Eu só fiz o que era melhor para você.

— Você não pode estar falando sério. Não pode ser verdade! Não pode ter tirado meu filho sem a minha autorização! — Gritei histérica sentindo as lágrimas molharem meu rosto.

— Chega de drama, garota! Já chamei o Gaspar para te levar daqui. Vamos aproveitar que está de madrugada para que ninguém nos veja.

— Mãe, me diz que é mentira! Me diz, por favor, que você não me trouxe para um abatedouro para tirar meu bebê de mim! — Implorei desesperada.

— Pois fique sabendo que esse abatedouro custou os olhos da cara! — Replicou e eu cobri minha boca na tentativa inútil de abafar o meu grito.

Eu não podia acreditar no que estava acontecendo. Não podia ser real.

— Para com isso! Trate de ficar bem calada porque vamos para casa agora! Não me obrigue a te dopar novamente. — Me ameaçou irritada.

Eu não conseguia parar de chorar. O mesmo homem que antes me contou sobre a complicação do aborto, voltou para o quarto trazendo uma cadeira de rodas que rangia ao deslizar pelo chão.

Sem mais nem menos ele me pegou da maca e me colocou sentada na cadeira. Eu não conseguia dizer nada, não conseguia reagir.

Então de repente minha mãe empurrou minha cadeira barulhenta pelo corredor da clínica.

— Por quê? Por que você tirou o meu filho de mim? Como pôde ser tão cruel assim? — Gritei reunindo as poucas forças que me restavam.

— Você devia era me agradecer, quem dera na época que eu engravidei de você eu tivesse tido essa opção.

— Era meu filho! Meu bebê!

— Não seja ridícula! Era apenas um embrião, além do mais eu te poupei de ser uma péssima mãe. — Ironizou e eu a encarei com ódio.

— Nisso a senhora tem razão, já que eu não tenho exemplo suficiente sobre o que é ser uma boa mãe. — Cuspi as palavras e ela revirou os olhos.

— Você devia parar com tanto drama e me agradecer por te salvar da maldição de ter uma criança como você. — Falou empurrando bruscamente a cadeira, fazendo meu corpo contrair.

Voltei a chorar copiosamente em silêncio. Não tinha sequer forças para discutir mais com ela. Já fora do local mais repugnante que eu já estive na vida, encontramos Gaspar e ele me pegou no colo e me colocou no carro. Eu chorei a viagem inteira em silêncio.

Chegamos em casa e Gaspar me ajudou a ir para o meu quarto.
Deitei com cuidado na cama e abracei meu travesseiro.

— Eu não tive sequer a oportunidade de sentir meu filho mexer. — Murmurei arrasada e Gaspar me olhou atordoado.

— Eu sinto muito, senhorita! — Ele disse antes de minha mãe chamá-lo.

Assim que fiquei sozinha chorei ainda mais. Eu achava que aquilo era um pesadelo e se eu conseguisse uma forma de acordar iria descobrir que tudo estava bem. Mas não estava. Me levantei lentamente e segui para o banheiro. Enchi a banheira com água morna e entrei dentro dela ainda vestida. Mordi meus lábios deixando as lágrimas caírem sem cerimônia. Afundei debaixo d'água e observei tudo através das ondulações que as bolhas da minha respiração faziam tremular na superfície.

Eu precisava encontrar algum lugar onde a minha dor fosse anulada. Meu nariz começou a arder e eu permaneci imóvel. Fechei os olhos e senti a angústia e a paz disputando lugar dentro de mim.

— Katie! — Ouvi Corina gritar e praticamente me arrastar para fora da banheira. — Katie, pelo amor de Deus, menina! Respira!

Eu tossi muito sentindo a ardência acabar com minhas vias áreas, tudo queimava por dentro.

— O que você estava fazendo debaixo d'água? Por Deus, menina! — Ela ralhou exaltada e eu a abracei forte.

— Minha mãe tirou meu filho de mim, Ina. Ela arrancou ele de mim. — Murmurei entre lágrimas e ela se desesperou.

— Eu não posso acreditar nisso, Katie! Isso... Isso não pode ser real! É perverso demais! Oh Deus! Me perdoe... Se eu soubesse que era para isso que ela queria que você tomasse aquele maldito suco que ela preparou... Eu juro que não sabia...

Eu apenas deixei minha cabeça cair no colo dela. Estava cansada demais de sentir dor, entretanto ela não parecia ter planos de ir embora tão cedo de mim.

Bad girlOnde histórias criam vida. Descubra agora