O Enigma do Olho de Hórus - Renascer do Faraó

A bolada

Como é seu nome mesmo?", ela me perguntou.
"Hórus", responderam as crianças.
"Você está bem?".
"Estou somente um pouco tonto".
"Por causa da bolada?".
"Não... Coisas estranhas acontecendo.".
"E você mora longe?", perguntou ela.
"Aqui perto".

Ela me disse que estava terminando o seu turno com as crianças e que iria pedir para sua assistente levá-los para a escola. Ofereceu-se para me levar para casa. Não posso negar que fiquei feliz em ouvir aquilo.
Estávamos caminhando pelo parque quando passamos por um grupo que tocava uma música: "Jesus Cristo vai voltar. Aleluia! Em Porto Alegre ele vai morar, aleluia!". Eu ri e exclamei em voz alta:
"Essa loucura está indo longe demais".
"O que você disse?", perguntou ela.
"Não foi nada!", desconversei.

Vi em seu pescoço o símbolo da coruja e perguntei o porquê. Respondendo-me, falou que era o símbolo da pedagogia.

"Uma ave de rapina noturna. Simboliza a contraparte de Hórus, o falcão, chama-se a ave da lua. No Antigo Egito era símbolo de Isis".

Ela, rindo, respondeu:
"Eu sei, estudei o Egito para trabalhar com as crianças."

"O sapatinho de cristal serve perfeitamente em você", disse eu.
"Ainda pensando que eu sou uma princesa?".
"Se não for tem todos os sinais".
"Se você continuar assim eu vou cantar: Como uma Deusa, você me mantém. E as coisas que você me diz me levam além."

Rimos os dois. E que luminosidade vinha daqueles lábios! Naquele momento entendi porque Da Vinci se focou no sorriso enigmático da Monalisa. Atravessamos a rua, avistamos meu prédio. Eu não sabia como fazer, mas a minha vontade era de que ela subisse comigo. Simulei tontura. Preocupada, ela indagou:

"O que foi? Se sente mal?"
"Só tontura. Você poderia me ajudar a subir as escadas?"
"Um estranho que me chama de princesa e inventa uma desculpa para ir com ele para o seu apartamento. Isso é perigoso, mocinho! Estamos em uma cidade grande."

Fui baixando a cabeça em sinal de que não havia conseguido aquilo que eu queria. Mas ela continuou.

"Mas o que seria da vida sem riscos, não é mesmo? Afinal, não é todo dia que se conhece alguém interessante nessa cidade cinza. Mas seja mais sincero e me faça um convite mais excitante do que o de cuidar de um homem tonto."

Eu ri, erguendo a cabeça.

"Nossa como você ficou corado rápido! Passou logo o seu mal estar."

Subimos e entramos no apartamento. Fui ao banheiro melhorar o visual Ouvi ela falando na sala.

"Hórus, você tem o Rei Leão aqui na estante! Sabe que é o meu filme preferido?"

"Quando tivermos uma oportunidade podemos assistir!"
"O que você vai fazer a tarde?"
"Nada. Estou de folga."
"Ah, então pode ser essa a oportunidade!"
"Você está me convidando para assistir o filme?"
"Sim. Por quê? Você não gosta de mulheres que ficam por cima?!", disparou ela.
"O que disse?", perguntei, engasgando comigo mesmo.
"Nada não, foi só uma flechada."

O filme foi passando e eu não estava prestando muita atenção. Então ela disse:

"Essa é a parte que eu mais gosto, o momento em que Nala a leoa vem lembrar a Simba de que ele é um rei e que deve salvar o seu reino das garras do medo! Você é tão... Melancia!", completou ela.
"Melancia?"
"Sim, parece verde por fora mas é bem maduro por dentro!"

Fiquei tímido.

"Você sabe", começou ela, "Hórus é um deus pássaro que voa alto, mas eu prefiro mesmo é quando ele se torna o cão! Anubis, o cão, é responsável pela passagem entre a vida e a morte. Quer ressuscitar?"
"O que disse?"
"Quer me escutar? Parece que você está longe enquanto eu falo."
"É que entendi você dizer ressuscitar."
"Por que eu diria isso? Você sente o cheiro? Cachorros farejam muito bem. Dizem que cadelas quando chamam os machos estão reinando. Eu sou a rainha serpente!"

Abri os olhos. Escuridão. Já era noite e eu ali, no chão da praça. Na praça? Mas e o apartamento? Onde estava Rosa? Teria eu passado o dia inteiro meditando? Fora tudo um grande
sonho? Mas era tão real. Talvez nada daquilo tivesse acontecido de fato.