Capítulo 11

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- Não foi isto que eu sonhei, não foi assim que eu quis que o teu futuro fosse. - disse ele enquanto lágrimas saíam dos seus olhos.

- Lamento, mas também nunca foste o pai com que eu sonhei. A vida é assim, nem sempre podemos ter tudo o que queremos e peço imensa desculpa se te desiludi mas eu sou assim e se não aceitas, eu não posso fazer nada. Não vou negar a minha felicidade por alguém que não me aceita como eu sou.

  Do nada senti o meu corpo afundar no chão, como se fosse areia movediça e quando dei por mim, estava na minha cama.

  O meu coração batia freneticamente. "calma, foi apenas um sonho" - dizia para mim próprio. Mas parecia tão real, era como se eu pudesse sentir a sua presença perto de mim, e com sua presença, também a sua tristeza.

  Se a vida depois da morte existe mesmo, ele não deve estar nada feliz. Sei bem que não sou o filho que ele planeou, mas, por mais que me custe dizê-lo, eu não posso abdicar da minha felicidade por alguém que já não está entre nós.

  Olhei para o relógio que estava em cima da mesa de cabeceira e já eram por volta das 5 da manhã. Eu não queria estar mais ali, só queria correr para bem longe.

  Vesti uma camisola de capuz, vesti umas calças pretas skinny, calcei as minhas botas e saí de casa levando apenas as chaves, o telemóvel e os fones comigo.

  Caminhar era quase terapêutico, principalmente quando as ruas estavam vazias. A música acompanhava todos os meus pensamentos como se fossem dois amantes de mãos dadas, dois amantes que juntos estavam em perfeita sincronia.

  Sempre sonhei ter o que tenho agora, o João, alguém que faz tudo para me ver feliz, alguém com quem desejo estar em todos os momentos, alguém que adoro mais do que tudo. Mas sempre temi perder o que perdi e o que ainda posso vir a perder, a minha família. Aos poucos estava a perder as pessoas que amava, primeiro os meus avós e depois o meu pai.

  Se decidisse sair do armário podia perder toda a gente, os meus amigos... a minha família.

  Não é novidade para ninguém que os gays sofrem preconceito mais do que qualquer raça ou qualquer outra diferença, não percebo porquê, só porque queremos amar alguém do mesmo sexo? Amar e ser amado é a coisa mais linda do mundo, não consigo compreender as pessoas que dizem que ser assim é errado. Errado é odiar alguém por ser diferente, ter nojo de alguém por ser diferente, matar quem é diferente... Sim, isso é errado.

  Eu só quero ser feliz. É pedir de mais? Eu não tenho culpa de ser assim, não é uma escolha, não fui eu que decidi sentir atração por homens.

  Não sei qual é a vossa religião ou se nem têm religião mas eu acredito em Deus e acredito no destino. Creio que a minha vida está planeada e que se é este o meu caminho é porque, de alguma forma, me vai preparar para o que quer que seja que o futuro possa trazer.

  Não sei o que fazer, se contar à minha família que sou gay corro o risco de ganhar o seu ódio, se não contar corro o risco de ser infeliz para o resto da minha vida. Em ambas as situações fico a perder, eu não quero abdicar das pessoas que amo mas também não quero abdicar da minha felicidade.

  Para já acho que o melhor seja ficar calado, o João talvez queira assumir o nosso recente namoro ao público mas eu não sinto que seja a melhor altura. O meu irmão e a minha mãe não estão prontos para mais um choque, preciso que eles curem os seus corações partidos para poderem me perdoar por lhes mentir e não ser quem eles esperavam que eu fosse.

  Peguei no meu telemóvel e vi que tinha 4 chamadas perdidas da minha mãe e 6 do João. Coloquei o telemóvel a chamar para o João e ele logo atendeu.

- Onde é que tu estás Manny? - ele parecia preocupado

- A caminho de casa, porquê?

- E onde é que foste?

- Apanhar ar, precisava de sair de casa.

- A tua mãe ligou aos teus amigos a perguntar se estavas com eles, o Andrew telefonou-me a perguntar onde estavas.

- Eu estou bem.

- Fiquei preocupado.

- Não fiques, está tudo bem.

- Adoro-te.

- Também te adoro. Mais logo falamos, ok?

- Sim.

  Desliguei o telemóvel e continuei a andar até chegar à porta de casa. Assim que a abri a minha mãe correu na minha direção.

- Onde é que andaste?

- Fui apanhar ar, não aguentava ficar mais tempo na cama sem fazer nada.

- Da próxima vez diz algo, ficámos com o coração nas mãos, telefonámos a todos os teus amigos e não estavas com nenhum deles.

- Não aconteceu nada, podem ficar descansados. - disse e fui para o meu quarto.

  Será que desejar a minha própria morte é errado? Quanto mais tempo é que vou ter de viver neste inferno? Está na hora de a minha vida mudar para melhor não concordam?

  Passei a manhã toda a ver filmes até a minha mãe me chamar para almoçar. O meu irmão não esteve presente para a refeição, tinha ido resolver uns assuntos da faculdade.

- Como é que tens estado filho?

- Bem, dentro do possível. Penso que podia estar bem pior.

- Que bom.

- E tu?

- Não sei, ainda parece tudo um pesadelo.

- É... Infelizmente não é, pelo menos não é um do qual possamos acordar.

- Nós precisamos de ser fortes e eventualmente vamos conseguir seguir em frente. - ela disse segurando a minha mão.

- Eu amo-te mãe. - disse com lágrimas a querer sair dos meus olhos.

- Eu também te amo filho, mais do que tudo. - respondeu e comecei a chorar.

  Eu não quero que ela sofra mais, como é que lhe vou dizer que sou gay, que nunca lhe vou trazer uma namorada a casa, que nunca lhe vou dar netos? Acredito que não haja uma maneira fácil de dizer, apenas queria ter coragem para o dizer sem pensar nas consequências.

- Eu não aguento mais.

- O que foi? - perguntou levantando-se e encostando a minha cabeça no seu peito.

- Eu não quero que tu me odeies.

- Filho, eu nunca te odiaria, eu amo-te tanto, eu só quero que estejas feliz. Podes confiar em mim, o que é que se passa?

- Mãe... Eu sou gay.

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