voltando ao lar;

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Às vezes, a memória pode ser capaz de muitas coisas. Ela tem o poder de guardar, manter. De acordo com o dicionário, memória, ela sendo um substantivo feminino, é a faculdade de conservar e lembrar estados de consciência passados e tudo quanto se ache associado aos mesmos. A memória é o que nos mantém vivos, lembrando de cada pequena coisa que nós fazemos ao longo do tempo.

Quando saí do Pink Motel na manhã seguinte, Betty estava varrendo algumas folhas no estacionamento. Me perguntei, acenando brevemente, o porquê de ela não contratar alguém para que o fizesse, e presumi que fosse por falta de dinheiro ou coisa do tipo. Fazendo uma nota mental, anotei: pagar aluguel do mês. Ainda estava frio demais para parecer outono, e ainda haviam folhas caindo pelos chãos da cidade por onde passei até chegar em casa; ou, pelo menos, onde eu costumava morar. Até os gêmeos, até Kelly e até eu mesmo acontecerem. Acontecermos.

Kelly abriu a porta depois de dois toques na campainha, com um dos gêmeos no colo e um copo de uísque na outra mão. Ela deu um sorriso forçado, segurando a maçaneta com a mesma mão que segurava o copo. No braço, o que eu achava ser o menino, a criança agitada brincava com seu cabelo loiro.

— Tyler.

— Oi. Mãe.

— Achei que estivesse na escola.

— Eu deveria, mas vim buscar umas coisas. Posso entrar?

Kelly relutou, por um instante. Mas, prendendo um suspiro pesado, afastou-se da porta e me deu as costas. Tomei a liberdade de entrar e fechar a porta, deixando que o interior aquecido me envolvesse como se fosse uma manta. Deixei o casaco no cabideiro.

— Tony está assistindo jogo, Naomi está com a babá e eu estarei na biblioteca, se precisar de mim.

Deu-me as costas de novo, me deixando sozinho. Ela tinha esse costume; me deixava falando sozinho, saía da mesa quando não havia nem terminado de comer, e, como sempre, me dava as costas quase toda vez. Me segurei para não revirar os olhos, apenas assentindo e caminhando até os fundos da casa. Naomi estava nos braços de uma garota também loira, mas com olhos azuis que mais pareciam pedras preciosas e dedos longos, com unhas pintadas em um verde quente.

Delicadamente, ela dava leite na mamadeira para a bebê, que estava quase adormecida em seus braços.

— Sra. Joseph, ela é realmente muito boazinha, e-

A garota parou de falar quando viu que Kelly havia se transformado em um menino magrelo e com roupas maiores que ele. No caso, eu. Dando um sorriso envergonhado, a loira se pronunciou de novo:

— Desculpe, pensei que fosse a Sra. Joseph.

— Ela não se importará se você chamar ela de Kelly ou Sra. Bradshaw.

— É muito fora de profissionalismo, acho que não tenho coragem.

Deixei a resposta pairando no ar, ajeitando a alça da bolsa em um dos ombros. Estava com sono e com fome, querendo apenas buscar as roupas e livros que faltavam para voltar ao Pink Motel e hibernar pelo resto do dia. Pegaria as matérias que perdi no dia seguinte, com algum colega de classe ou até mesmo na equipe de nerds que almoçavam na mesma mesa que eu.

— Sou Jenna. — ela disse, sorrindo. Um sorriso perolado capaz de capturar a atenção das pessoas.

— Sou Tyler. Tyler Joseph.

Não demos as mãos, e eu deixei bem claro que não atravessaria a cozinha apenas para fazer o aperto. Encostado no batente, estiquei-me apenas para pegar uma maçã da mesa. Dando as costas sem ao menos me despedir, subi as escadas. No final do corredor Kelly estava presa na biblioteca, ouvindo alguma música de jazz e provavelmente se empurrando mais do quê devia no uísque. Ainda eram nove horas da manhã.

Meu quarto ainda estava do mesmo jeito que deixei quando saí. A cama com os lençóis dobrados, a estante de livros intacta e algumas peças de roupas em cima da cadeira, ainda com o cheiro de amaciante. No quarto ao lado, na parede colada com minha cama, uma sensação nostálgica de quando os gêmeos gritavam altas horas da madrugada quando Kelly e Tony também estavam gritando.

— Tyler, não sabia que estava em casa.

Tony se encostou na porta, sorrindo. Kelly disse que ele estava assistindo algum jogo, e ele parecia alguém que acabara de acordar. De cara amassada, o homem abotoou o primeiro botão da camisa de mangas.

— Precisei vir buscar algumas coisas. Qual o placar do jogo?

— Lakers estão na frente. Quer comer alguma coisa? Você parece meio pálido.

— Eu adoraria ficar, mas preciso ir andando. Ainda posso entrar até as dez, mas preciso me apressar. — menti. Nem mesmo sabia se era possível entrar depois das nove.

— Por que precisou vir agora, em dia de escola?

— Esqueci algumas coisas pra um trabalho, prometo que vou só pegar e sair.

Ele assentiu com a cabeça, desencostando da porta e saindo do quarto. Voltei meus olhos para o quarto vazio, a cama convidativa, o armário bagunçado. Guardei algumas coisas na mochila e tranquei o cômodo antes de descer as escadas. Kelly provavelmente ainda estava na biblioteca, tomando uísque e agora sem o gêmeo nos braços.

Na cozinha, me servi um copo de água e coloquei a maçã que antes estava comigo na mesa, de novo, olhando o quintal pela janela. Jenna apareceu, agora sozinha, passando as mãos pelo vestido rodado. Ela, novamente, sorriu ao me ver.

— Pensei que já tivesse ido embora.

— Ainda não. — foi a minha vez de rir. — Você devia estar na escola, não?

— Minha turma foi pro Texas, em um passeio escolar. Eles vão passar dois dias lá, se não me engano.

— E por que não foi?

— Precisei ficar aqui pra cuidar da casa. Meus pais estão viajando a trabalho.

— Entendi.

A Flórida. Pelo menos Jenna não precisava mentir sobre seus pais ou sobre eles estarem viajando a trabalho. Não como eu, que fiz isso com Betty e com todos os caras que me pagavam alguma bebida depois do meu turno.

— Espero que você se divirta ficando sozinha em casa, Jenna. A melhor parte de tudo é que não vai ter ninguém enchendo sua paciência ou coisa do tipo. — batuquei meus dedos rapidamente no balcão e me desencostei. — Preciso ir.

— Tudo bem.

Antes de dar as costas, arrumei a bolsa no ombro e enfim saí da cozinha. Em um tom baixinho e envergonhado, ouvi a voz de Jenna novamente.

— Tyler?

Girei em cima de meus pés, olhando-a no outro lado da cozinha.

— Sim?

— O que acha de irmos almoçar qualquer dia desses?

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⏰ Última atualização: Nov 24, 2019 ⏰

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