Uma longa distância havia caminhado com o bondoso Demétrio; sem grande exaustão, pois era manso em seus passos e conversavam acerca da engenhoca que propôs a fazer. Lídia se interessava em coisas novas de que ninguém tinha lhe falado, aliás, quase tudo era novo para si. Nos campos verdes os trabalhadores fadigados tinham a despertado o desejo de ajudá-los com a obra, de acordo com Demétrio, sua invenção aceleraria
colaborando com os penosos trabalhadores que muito se esforçavam. Era fato, além de melhor rendimento no plantio, poupariam as mãos calejadas de maior sofrimento. Só deveria ter as peças fundamentais para o tal projeto e muito em breve estariam desfrutando dos ganhos vindouros, ele e todos os súditos da rainha.Mas havia perco a viagem, seu propósito. Ao invés de trazer consigo os utensílios, estava ali guiando uma dama para seu local precário. O que lhe motivou a fazer isso não sabia, talvez fosse mais uma vez sua bondade que lhe cegava do foco em questão.
Certamente seria uma boa troca, consideraria Lídia uma filha. E ela de nada sabia sobre sua vivência sofrida, seu filho mal via e muito se arrependia de ter o expulsado de casa.
Lídia viera pra acalentar sua dor.
- Aqui está! Sua nova casa te espera... – os olhinhos dela brilhavam contentes, isso o surpreendeu por se tratar de um local minúsculo da pobreza. – Cuide para que ninguém
lhe obrigue a trabalhar além de mim, muitos estão a procura de servos nessa região. Tudo isso porque a rainha tem perdido homens, maltratados pela dura servidão, que trocam sua saúde para um leito de morte. Se alguém perguntar quem é você, diga toda desajuizada que não o sabe. Eles não obrigariam um louco a trabalhar.- Mas Demétrio, não sou louca e nem quero ser! – a pobre moça não havia compreendido a gravidade do problema. Sorria inocente sem preocupação qualquer.
- Do lado de cá é bom que faça tudo segundo minhas palavras, jovenzinha. Para preservar sua vida, temos que ser cautelosos. Diga-me, quem você é? De onde veio?
- Já não sei! – demonstrou para o homem que havia entendido. Mas Demétrio se referia ao seu desejo de saber realmente sobre sua origem.
- Não, filha! Quero saber seu nome. – insistiu.
- Preciso esquecê-lo. Se tornou insignificante para todos. Demétrio dava gargalhadas. A moça bem sabia se portar como uma artista fingindo ser o que não era. Apesar de ser desconhecida, as origens de Lídia pareciam irrelevantes aos seus olhos, não necessitava saber tudo sobre a moça. Apenas era seu dever protegê-la contra a escravidão lá fora. Ela havia entendido bem, lá fora o perigo sempre fora constante.
O quarto que destinou a Lídia fora do seu filho perdido por aí. Ali acomodou a moça, era singelo e cheirava mofo.
Seus olhinhos cansados fez com que Demétrio preparasse seu leito antes de qualquer faxina. Ela logo apagou-se. O homem não sabia que era de sua rotina dormir além do normal. Norma ditada pela rainha, arraigada também em seus dias de liberdade.“Durma, querida! Durma mais ainda! Acostume-se com o sono da morte...”
De súbito acordou tendo taquicardia por ouvir a voz da rainha, fora tão real. Tinha medo.
- Demétrio, Demétrio... – implorava a atenção de seu único protetor.
- O que se passa? – ele vinha até ela supondo ter sido um pesadelo.
- A rainha quer me matar! – chorava como uma crescida criança descobrindo uma grande mentira que há muito haviam contado em sua infância. Para si, a rainha a superprotegia porque lhe amava. Mas aquela voz soou verdade e podia jurar ser bem mais que fruto de sua imaginação. Havia despertado sua memória, lembrava que sonolenta em seu quarto a rainha cantava algo parecido em seu ouvido. Sussurrava a última frase bem baixinho, quando quase inconsciente aninhava em seu colo.
- Acalme-se menina! Foi apenas um sonho ruim. Veja, fiz uma sopa para você. – suas habilidades de pai ainda eram frescas em sua memória. Beirava às oito da noite e sabia que a jovem devia ter fome.
Não culpou Demétrio pelo descrédito, mas queria falar de sua angústia por ainda ser vívada aquela voz em sua mente. Realmente sentia correr risco de morte.
- Coma tudo, e se ainda tiver fome, prepararei mais para você! – era bondoso seu olhar. Trouxe até ela a tigela de sopa e foi descansar em seu leito.
Lídia se sentia um passarinho. A rainha, às vezes, a ouvia falar, mas ali só tinha comida e uma gaiola. Sentiu saudade de seu lar.
E foi assim sua primeira noite em terra estranha: Choro e mais choro.
XXX
Passava perto de onde morava, queria voltar pra casa, mas ainda não era a hora. Seu pai desacreditaria de sua sorte, seu traje agora o assustaria.
Haviam duvidado de sua esperteza, mas desde então provava para todos ser possível desenhar o rumo da vida.“Não fomos destinados ao sofrimento.” Sua frase de efeito sustentava sua tese de que na pobreza não ficaria por muito tempo.
Seu pai não entendia sua cabeça desprogramada da vida comum de todos. Julgava ser ambição um pecado gravíssimo, até mesmo uma traição contra seu próprio povo.
Foram longas discussões, que para sua “cabeça virada”, eram sem sentido e burrice de gente conformada. Foi então que a impaciência de seu pai transbordou. Fora digno de expulsão de seu próprio lar. Como pôde ser capaz de tamanho reboliço? Demétrio antes pacífico, transformava num monstro para si. Não sabia se sobreviveria só com a roupa do corpo, mas agora era provada, a resposta fora positiva.
A linhagem real, há muito arruinada, seria ultrajada por uma nova classe de bem aventurados. Não era seu intuito roubar a paz da nobreza, mesmo que merecesse, mas distribuí-la a todos que desejassem.
E algo lhe fazia querer resgatar alguém ainda importante para si, seu pai. Mas sabia de sua resistência e teimosia em achar prestígio em meio ao sofrimento.
Acelerou seu cavalo decidido a vasculhar o vilarejo a procura de algo decisivo para si. Era prometido para quem achasse a princesa uma vida digna, tendo o favor vitalício da rainha.
Afoito estava. A qualquer momento encontraria seu bem mais precioso. Já era bom seu estado atual e ficaria ainda mais colorido seus dias, agora, em parceria com a realeza.
De casa em casa deu um jeito de expressar sua insatisfação pelo estado de seu povo e apresentar sua proposta de sacrificar seus dias em busca de igualdade para todos. Mas para isso precisaria da princesa – sua moeda de troca.
O vilarejo estaria ciente de haver uma revolução prestes a eclodir. E juntos
deveriam dar fim no sumiço de Lídia. Quem a encontrasse, deveria a trazer até si. Mas havia um problema. Ninguém nunca tinha visto a tal Lídia. Vivia presa no palácio e apenas por lá era conhecida sua face. Qualquer donzela poderia ludibriá-lo fingindo ser a princesa perdida. E certamente seria banido por tentar trapacear a astuta rainha. O que faria? Arriscaria ou recusaria acreditar até ter a certeza.
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A caixinha dos sonhos
RomanceE se você fosse treinado a não sonhar? Numa época distante, Lídia, uma menina prestes a desabrochar para viver a vida, decide pular para fora da caixa e se divertir com as aventuras do mundo real. Depois de muito tempo trancafiada pela madrasta, a g...